Igreja e Religião

O diálogo sobre Deus é impossível
GIANNI BAGET BOZZO


 

Bento XVI assinou uma carta a Marcello Pera, com um elogio pelo seu livro Porque devemos dizer-nos cristãos (Mondadori).


O diálogo desta vez funcionou, porque o senador laico se tornou cristão enquanto liberal e professa as raízes cristãs da liberdade moderna. Mas o Papa e o senador estão de acordo em dizer que o diálogo interreligioso não é possível. Paulo VI introduziu, com a Ecclesiam Suam, o termo «diálogo», que teve grande sucesso mas que gerou um equívoco: fazer pensar na compatibilidade do catolicismo com todas as culturas. O conceito de catolicismo como doutrina e como identidade cultural assim foi perdido. Tudo quanto tenha feito o Papa Bento, quando era ainda Cardeal, para reafirmar o «logos» cristão contra o «diálogo» tornado palavra dominante, aparece claro na Dominus Jesus 
de 2000, trincheira doutrinal  frente ao dilagare do diálogo por ocasião do ano jubilar.

Isso mostra que o Cardeal não partilhava do «espirito de Assis» no que se referia às relações inter religiosas.

O  espetáculo do primeiro congresso, quando os animistas sacrificaram um galo em uma igreja, não se repetiu mais.

Não espanta por  isso que o Papa declare, em sua intervenção sobre o livro di Pera, que «o diálogo interreligioso no sentido estrito da palavra não é possível». Por isso Bento XVI fez da palavra «logos» o fundamento da sua exposição doutrinal das relações entre fé e razão, entre Igreja e cultura. A plena valorização do termo «logos» é própria da Igreja católica e das ortodoxas. Não vale mais como espressão da harmonia entre graça e natureza nas comunidades nascdas da Reforma protestante, nas quais  fé e graça salvam a pessoa mas não aperfeiçoam a natureza humana. E sobre o «logos» é impossível discutir com as grandes religiões miticas: o induísmo, o budismo, o confucionismo, que voltou a ser forma cultural na China. A «fonte grega» que a Igreja incorporou é um termo que fundamenta o catolicismo mas não lhe simplifica as relações com as outras religiões. Certamente não as simplifica muito menos com o Islã, para o qual a natureza é um ato de pura vontade divina sem consistência própria e a razão não tem nenhuma autoridade se não no interior da exegese literal das fontes islâmicas. Onde não há «logos» muito menos pode haver diálogo.

A cultura protestante determinou largamente o catolicismo pós conciliar, a partir da leitura da Bíblia e da interpretação da modernidade, mas nenhum diálogo teve qualquer efeito nas relações institucionais e doutrinárias entre católicos e protestantes. Algo que podemos chamar de «diálogo» existe ainda, sobretudo nas relações entre católicos e Islam, e talvez tenha a utilidade di fazer aumentar o conhecimento do mundo nascido do Corão no interior da Igreja, para compreendê-lo melhor e entender o fascínio que el epode ter no Ocidente. Mas o diálogo com o mundo islâmico ocorre sobretudo para solicitar a compreensão muçulmana da liberdade religiosa e portanto favorecer a liberdade da condição cristã nos Países islâmicos. É, come diz o Papa na carta a Pera, uma intervenção sobre a cultura e não sobre a religião.

No
discurso de Ratisbona o Papa mostrou a diferença radical entre a concepção cristã do «Logos»,entendido como verdade de Deus no mundo e do mundo em Deus, e o Deus islâmico fundado sobre a vontade divina além da  natureza e além de toda a razão. O Deus do Corão é diferente do Deus da Bíblia e sobretudo do Deus de  Jesus Cristo. As  relações entre a Igreja e o Islã ocorrem sobretudo através dos Estados, que são uma herança do Ocidente no mundo islâmico e não têm autoridade religiosa. Nem mesmo o Estado  saudita, no qual o Rei é guardião dos lugares santos, de Mecca e de Medina, mas não é fonte de conhecimento religioso. 

O ecumenismo inter-cristão tornou-se diplomacia de boa vizinhança e substituiu eficazmente a mútua condenação, mas não é capaz de atingir nenhuma união entre Igrejas. O diálogo com as religiões tornou-se, pois, uma extensão da diplomacia católica para com os Estados e para com as instituições das grandes religiões. Mas não tem a base de «logos» e não é portanto verdadeiro diálogo. É uma relação inter-istitucional que tem um significado político e não doutrinário ou religioso. O seu fim é fazer crescer no mundo a liberdade e pois, de fato, é um espaço não religioso como aconteceu no Ocidente. Isso mostra, mais uma vez, a conexão entre catolicismo e liberdade moderna. Coisa que Bento XVI e Marcello Pera sutentam juntos.

Copyright La Stampa, 26 de Novembro de 2008
http://www.lastampa.it/_web/cmstp/tmplRubriche/editoriali/gEditoriali.asp?ID_blog=25&ID_articolo=5290


    Para citar este texto:
"O diálogo sobre Deus é impossível"
MONTFORT Associação Cultural
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Online, 28/03/2024 às 08:52:15h