Polêmicas

Entrevista escandalosa do pseudo-monge Marcelo Barros
PERGUNTA
Nome:
Robson
Enviada em:
15/10/2003
Local:
Nazaré - BA,
Religião:
Católica
Idade:
18 anos
Escolaridade:
2.o grau concluído

MARCELO BARROS Monge beneditino

Por: Raquel Ribeiro Em: 05 / 11 / 2002

Doce que nem pimenta Carismático, mas também polêmico, o monge Marcelo Barros considera o diálogo entre as religiões a sua principal missão.

por Raquel Ribeiro

Prior do Mosteiro da Anunciação do Senhor (o prior é uma espécie de coordenador), em Goiás Velho (GO), o irmão beneditino Marcelo Barros tem pulso firme, e não teme assumir suas posições críticas. O mosteiro apóia dois acampamentos de trabalhadores rurais sem-terra. As portas do mosteiro estão sempre abertas e, nas missas de domingo, são os leigos que dão a comunhão aos monges. Nesta entrevista a cadernos do terceiro mundo, o monge fala sobre espiritualidade, tolerância e a postura muitas vezes conservadora da Igreja.

Crítico e polêmico ao tratar de certos dogmas e tabus da Igreja, o senhor não receia ser podado pela Igreja?

Marcelo Barros: Há uma liberdade interior, dada pelo espírito de Deus. Se eu renuncio a isso, renuncio a ser discípulo de Jesus. Aceito a limitação dada pelo amor. Como numa relação de casal, o amor faz crescer, mas ao mesmo tempo impõe limites: o limite do outro. Nesse sentido, sou um homem casado com a comunidade eclesial. Mas isso não significa passar a instituição na frente da vida. Não sou funcionário da religião. Aprendi com Dom Hélder Câmara a me libertar de qualquer tentação de carreirismo; o que levaria a me preocupar com a imagem que passo. O cuidado que tenho é com meus irmãos, amigos, com as pessoas que eu amo.

Como funciona a hierarquia num mosteiro?

MB Cada mosteiro beneditino é uma comunidade com certa autonomia. Existe uma confederação de mosteiros que é a Ordem Beneditina, e dentro dessa confederação, 23 congregações de beneditinos. Nós, aqui, somos da Congregação de Subiaco, nome de um Mosteiro no sul da Itália. A relação com os superiores beneditinos é boa. Eles nos aceitam e apóiam. Eu não sou obrigado a pedir permissão para fazer as coisas ou dizer algo. Em relação ao papa, o acolho como pastor e levo a sério sua palavra, como levo também a sério a palavra de outros bispos e pastores.

A Igreja permite o ecumenismo, mas é contra o sincretismo. Por quê?

MB A Igreja Católica busca a unidade, é a favor do ecumenismo entre as igrejas e do diálogo entre as religiões. Mas não concorda com a pessoa ser católica e, ao mesmo tempo, do candomblé. Ou em uma celebração, misturar mantra hindu, saudação a Alá e rito católico. Essa é a posição de quase todas as igrejas cristãs. As protestantes ainda são mais severas. Mesmo as que aceitam o diálogo morrem de medo das religiões afro por causa do perigo do sincretismo e da idolatria.

Qual sua posição?

MB Toda a história da Igreja é de sincretismo. Quando o cristianismo saiu da Galiléia e foi incorporado ao Império Romano, já tinha absorvido elementos de outras religiões. Na concepção de sacerdócio que entrou na Teologia Católica, vários elementos vieram do Império Romano. O culto de Maria, em sua origem, tem muito de sincretismo com as religiões celtas e eslavas. Por que com as religiões da Europa isso seria permitido e não com as religiões afro-brasileiras? Por que a comunidade de Deus tem de ser exclusiva ou excludente?

Como é a relação do Mosteiro de Goiás com a comunidade local?

MB A proposta fundamental do Mosteiro é de inserção na vida, nos trabalhos e na expressão da fé. A gente acompanha dois acampamentos de trabalhadores sem-terra (a 40 quilômetros da cidade) e possibilita que eles usem a casa quando precisam. A cada 15 dias, irmãos daqui vão para lá. No bairro, acompanhamos seis grupos bíblicos, como irmãos que apóiam. Quem coordena são pessoas do povo.

Como você, sendo monge, trabalhou 15 anos na Pastoral da Terra e até hoje o seu Mosteiro se envolve com lavradores sem-terra? Isso é tarefa de monge?

MB Na história da Igreja já houve monges que fizeram todo o tipo de coisas. No Brasil, em geral, os mosteiros não tinham ainda vivido uma inserção no meio dos pobres. De minha parte, sinto a vocação de dar testemunho do amor de Deus através da solidariedade aos mais pobres e do trabalho pela justiça. O mosteiro deve favorecer uma espiritualidade da paz, mas só pode fazer isso assumindo um compromisso profético de solidariedade e comunhão pelas pessoas que são vítimas das injustiças sociais.

Como se dá o tom ecumênico nas orações?

MB Cada dia oramos especialmente em comunhão com uma religião diferente. Oramos como cristãos, mas em comunhão com os outros. Na segunda é com as religiões orientais (budismo, bramanismo), a gente canta mantras, ouve textos sagrados, faz as orações que eles nos ensinam. Esses ensinamentos entram também na nossa vida, como na postura da não-violência. Na terça, a comunhão é com as religiões afro-brasileiras; na quarta, com grupos espiritualistas. Procuramos aprender o que Deus nos diz através das outras religiões. E temos por teologia que, na hora de celebrar, não existe discriminação entre padre e leigo: todos podem falar, propor cantos, tudo muito livremente.

Como é Deus para você?

MB Deus é Amor e antipoder. Quando eu quero descobrir como é Deus, eu olho para a pessoa humana de Jesus de Nazaré, o seu modo de viver e de ser, suas palavras e ações. Aí eu me reconcilio com Deus. Acho que, hoje, infelizmente, nem sempre as Igrejas e religiões estão falando bem de Deus... Ele não merece isso que, às vezes, se faz em seu nome.

Por que incomoda tanto as alas mais conservadoras da Igreja?

MB Teria de perguntar a eles... Mas tenho a impressão de que dois aspectos incomodam. O primeiro é por eu criticar o estilo de poder ainda hoje vigente nas Igrejas. Eu lembro a Igreja Católica que há 35, 40 anos (Concílio Vaticano II, em Medellim) ela assumiu o compromisso de se renovar, de ser uma igreja organizada em igrejas locais, autônomas, onde o papa não é um superbispo, um chefe supremo da Igreja, mas o bispo de Roma, guardião da unidade de todas as Igrejas em comunhão com a Sé Romana. O segundo é essa espiritualidade que vai além da identidade religiosa e se une a qualquer expressão de amor e de paz.

Outra coisa que critico é quando muitos da hierarquia eclesiástica põem a moral acima da vida e do direito das pessoas. Não quero ser um enfant terrible, mas, se me perguntam, respondo. Dizem que um bispo proibiu a Rede Vida, televisão católica, de me convidar para ser entrevistado num programa por eu ser contra a campanha contra o uso da camisinha. Não posso ser cúmplice de uma injustiça profunda, que atinge a pessoa no nível da consciência. Tocando na sua consciência, atinjo o que há de mais sagrado. Jesus não veio para condenar as pessoas, mas para dar alegria; não veio para angustiar, mas para libertar. Acho que o papa tem todo o direito de ter a moral que quiser ter, mas vamos discutir as opiniões. Não é justo dizer "quem não pensar como eu não é católico".

Quais os problemas que já teve devido a essa postura?

MB Quando passei em Roma, em 1998, dei uma declaração ao Adista, um jornal alternativo. Perguntaram-me o que eu acho do fato de o papa estar pedindo perdão pelos erros cometidos pela Igreja no passado. Respondi que estou de acordo, mas penso que, para enxugar uma sala molhada, é preciso primeiro fechar a torneira. Não adianta ele pedir perdão, se não mudar o modelo de Igreja, responsável por esses erros. Depois de alguns meses, um órgão da Cúria Romana queixou-se ao abade presidente da nossa congregação e pediu minha condenação.

A Igreja não está muito aberta aos novos tempos...

MB Acho que qualquer dia a hierarquia da Igreja vai descobrir a Revolução Francesa, a República e o papa vai deixar de ser rei. A Igreja sempre tem chegado muito atrasada.

Já no candomblé, o respeito à sexualidade é enorme.

MB O candomblé tem como elemento fundamental o axé, que é a energia vital. É a energia divina. Tudo que favorece essa energia de amor é acolhido. Na questão sexual, o interdito, o proibido, toca muito mais nos princípios rituais do que nos morais. A mulher menstruada deve evitar fazer sacrifícios isso é muito mais ritual do que moral. Ter um comportamento agressivo, tomar o marido da outra, pedofilia, estupro, tudo isso é condenado. Mas a relação sexual normal, sadia, faz parte do que chamam de "boa energia".

Sexo é o tabu para a Igreja católica...

MB Quando estudei a Bíblia, descobri que a visão da moral oficial da Igreja não é exatamente a mesma da Bíblia. No Antigo Testamento, ao menos por um tempo, aceita-se a poligamia. Depois, a comunidade vai, cada vez mais, descobrindo como palavra de Deus o direito de igualdade homem- mulher e a proposta de relação única e fiel. Mas sem condenações. Há um texto muito citado pela Igreja contra os homossexuais: o primeiro capítulo da Carta aos Romanos, onde Paulo fala de decadência do Império Romano. Uma decadência política, social, cultural e moral. Aí não se trata de homossexualismo como tal e sim de uma depravação geral. Logo, a questão é cultural. Não se pode fazer uma leitura fundamentalista dos textos.

Há perspectiva de mudança?

MB Há muita gente, mesmo dentro da hierarquia, que vê isso claro. Só não tem poder para mudar, nem coragem para lutar por isso. Tenho a impressão de que o quadro eclesiástico é tão rígido que não se falará disso até que um próximo papa aceite abrir o diálogo. Ordenar homens casados já melhoraria.

Esse atraso da Igreja não afugenta os fiéis?

MB A Igreja não deve se preocupar em ser de massa e arrebanhar mais gente. Minha preocupação é que as pessoas não se afastem porque eu falhei, porque o culto era vazio, distante da vida.

O que é preciso mudar em todas as religiões?

MB O patriarcalismo, com exceção das religiões afro, onde o sacerdócio é feminino na maioria dos casos. As religiões monoteístas têm a mesma formação patriarcal: o islamismo, o judaísmo... As tradições indígenas também são bem patriarcais. Religião é expressão de cultura. Ver igrejas protestantes, que ordenam mulheres, ajuda a gente, dá exemplo.

Qual sua formação espiritual?

MB Fui muito formado pela Bíblia me apaixonei principalmente pelos salmos e, quando jovem, pela Teologia da Libertação, que tem como fundamento da oração a luta pela justiça. Aceitei ser monge com essa condição. Se fosse para me isolar numa ilha, eu não o seria. Na década de 70, vivi o momento de secularização da Igreja (Deus está no mundo). Reagi contra ritos e cerimônias. Depois percebi que precisava integrar outros elementos, que funcionam como a chave para a espiritualidade ela não é a sala, mas abre a porta para entrar na sala. O encontro com as religiões afro foi muito importante: elas são cheias de cores, de símbolos. Eu reincorporei muitos desses elementos na minha espiritualidade pessoal. Coisas simples, como usar branco na sexta-feira, até a integração da contemplação da natureza no diálogo com Deus.

E como é o Marcelo autor?

MB Desde menino gosto de escrever. Na infância, meu pai, operário de fábrica, chegava cansado e, para ajudar minha mãe que tinha de passar roupa no ferro ou ainda lavar, cozinhar, etc., ele sentava-se na sala e ficava com os filhos somos dez. Cantava e contava histórias. Minha primeira experiência com o contar histórias foi do meu pai e fiquei marcado por isso. Para mim, contar história sempre foi um modo de expressar amor e carinho pelas pessoas.

Mais tarde, já adolescente, estudei em uma escola rural. Ali, para passar o tempo no final da semana, a gente fazia campeonatos de jogos. Criei um campeonato de contar história. Éramos uns oito adolescentes e subíamos nas árvores, enormes, cada um sentado num galho. Quem fumava ganhava cigarro e quem não fumava ganhava chocolate. O vencedor era aquele que contasse a história mais envolvente e que demorasse mais tempo a grande questão era matar o tempo! Algumas vezes ganhei.

Durante oito anos escrevi A secreta magia do caminho, meu primeiro romance. Enquanto isso, escrevia sobre teologia, fiz um livro sobre a Bíblia e a Terra, e outro sobre espiritualidade ecumênica. Tenho 24 livros publicados.

Seus livros são censurados pela Igreja?

MB Tenho liberdade. Mas tenho sido criticado. Uma livraria católica, que aceitou vender alguns exemplares de A secreta magia, nem chegou a colocá-los à venda depois que a madre leu certos trechos do romance. Ela depois devolveu o pacote dizendo que se tratava de "livros pornográficos".

Também já recebi cartas de religiosos chocados com o fato de um padre escrever sobre coisas mundanas. Como escrever as palavras de uma prostituta em um romance? Como descrever o mundo moral de um índio do século XVIII? Em A noite do Maracá, há um acidente de carro; eu nem dirijo, mas, para descrever a cena, consultei mecânicos, fui a postos de gasolina, conversei com motoristas. Você não precisa viver na pele o que acontece com seus personagens.

O que levou você a trocar o sonho de ser veterinário para ser monge?

MB Eu não queria ser veterinário de animal domesticado. Pretendia ser veterinário de animal selvagem. Fantasia de criança... No lugar do interior de Pernambuco onde estudei ginásio, havia um pequeno mosteiro de pessoas muito envolventes e eu me apaixonei pela vida em comunidade. Com 18 anos queria ter essa vida humanitária e humanizante. Descobri minha vocação de monge já dentro do mosteiro.

www.mur.com.br/entrevistas/
RESPOSTA
Muito prezado Robson, salve Maria!

Muito obrigado pelo documento que você me envia com a entrevista desse monge de candomblé que de católico não tem nada.

Você tem razão. Esse homem é um verdadeiro gnóstico por seu relativismo e indiferentismo religioso.

Por sua revolta contra o Papa e por sua negação da monarquia eclesial, ele é um herege protestante.

O que mais espanta é como se tolera que um herege desse porte -- e de nível bem baixo -- continue se apresentando como católico, e como monge.

Ele é um sinal claro da decadência da Fé e da disciplina na Igreja de nossos negros dias.

In Corde Jesu, semper,
Orlando Fedeli.