O Papa

Errar com o Papa?
PERGUNTA
Nome:
Jamil
Enviada em:
14/09/2001



Caro prof. Orlando, Salve Maria! Peço ao sr. que, por gentileza, ajude-me a esclarecer esta dúvida: Recentemente soube de um clérigo que teria afirmado categoricamente preferir "errar com o Papa [sic] do que acertar sozinho". Ora, seria possível que o Santo Padre errasse considerando-se que ele é o vigário de Cristo na terra e que, enquanto tal, recebe continuamente a assistência do Espírito Santo? Em outras palavras, pode o Papa, ao exercer o seu munus próprio que é o de proteger e guiar os fiéis católicos, assim como um pastor faz com o seu rebanho, cometer erros?

In Iesu et Maria,
Jamil

RESPOSTA
 

Muito prezado Jamil,
salve Maria.

A frase "Prefiro errar com o Papa, do que acertar sozinho" é muito citada. Especialmente por aqueles que, não tendo mais argumentos, se refugiam no argumento de autoridade. O tema é delicado, e,para evitar falsas interpretações, serei até repetitivo

A frase acima citada pretende demonstrar uma grande devoção ao Papa, e, ao mesmo tempo, insinua que o oponente está contra o Papa.

Na verdade, ela é falsa e demonstra que quem a usa, de fato, não tem devoção ao Papa, e não tem também boa doutrina.

Senão, vejamos.

A pessoa diz: "Prefiro errar com o Papa...", fingindo devotamento ao Papa e à doutrina de Pedro.

Mas o que, de fato, ela está dizendo é que o Papa pode errar.

Ora, o Papa não pode errar. O Papa é infalível, quando fala ex cathedra, ou quando, em seu Magistério Ordinário, ensina o que sempre os Papas ensinaram num problema universal, dando sempre a mesma solução, sempre ensinada pelos seus antecessores. Mas, quando um Papa dá uma sua simples opinião pessoal, ele pode errar.

Dizendo que prefere errar com o Papa, no fundo, essa pessoa -- você me diz que é um padre -- está negando a infalibilidade papal. O que é heresia.

Depois a pessoa diz, provando sua "modéstia" e acusando insidiosamente o oponente de orgulhoso e de pouca fidelidade ao papado: "do que acertar sozinho"... insinuando que ele pretende "acertar sozinho". Acusando o opositor de singularidade e soberba.

Na realidade, quem usa desse sofisma e dessas insinuações revela um parco conhecimento da doutrina da infalibilidade.

Como lhe disse, o Papa é infalível quando fala ex cathedra, isto é, quando ensina matéria de Fé ou de moral, a toda a Igreja, com o poder dado por Cristo a Pedro, e com intenção de definir, ensinando o que é certo, e condenando o que é errado. Estas são as condições da infalibilidade papal, segundo o Concílio Vaticano I, que proclamou o dogma da infalibilidade pontifícia.

Disse-lhe que os ensinamentos dos Papas, ainda que pronunciados não de modo ex cathedra, isto é, em seu Magistério Ordinário -- por exemplo nas encíclicas -- podem ser infalíveis quando os Papas, continuamente, tratando de uma questão de importância universal, ensinam continuamente a mesma coisa. Por isso, a doutrina do Magistério Ordinário também deve ser acatada como infalível, desde que ensinada desse modo. É o que faz com que os ensinamentos permanentes e constantes das encíclicas devam ser aceitos como infalíveis.

O Concílio Vaticano I não declarou que tudo o que a pessoa que exerce o papado diz é infalível. Noutras palavras, a infalibilidade está ligada à condição de Papa, e não é uma qualidade pessoal de quem está exercendo o papado.

Há pois que distinguir entre o Papa -- infalível nas condições citadas -- e a pessoa que é Papa, e que pode pessoalmente cair em erro, quando fala como simples pessoa particular, dando uma opinião puramente pessoal sobre algo.

Dizer, então: "Prefiro errar com o Papa..." é confundr o que a pessoa que está no Sumo Pontificado diz como pessoa particular -- quando pode pessoalmente errar -- com o que diz o Papa, enquanto Papa, que é sempre infalível quando fala ex cathedra, ou no Magistério Ordinário, na forma como foi dita.

Essa distinção pode ser encontrada no próprio Evangelho. Logo depois de dar a Pedro o poder das chaves, esse mesmo Apóstolo, falando como Simão, filho de Jonas - e não como Pedro -,cometeu um erro dizendo a Jesus que devia afastar-se de Jerusalém. Cristo lhe respondeu chamando-o de satanás.

Deve-se seguir sempre a Pedro como Vigário de Cristo, o que não implica segui-lo quando Simão trai a Cristo três vezes. O Padre de que você fala preferiria errar com Simão, no pátio da casa de Caifás, do que ficar fiel, sozinho, junto à Cruz no Calvário ?

"Ubi Petrus, ibi Ecclaesia". Essa é uma verdade na qual todo católico deve firmemente crer. Mas ela não pode ser substituída por outra, que diga erroneamente: "Ubi Simon, ibi Ecclesia". Não é a pessoa que tem o cargo que deve ser seguida, e sim o PAPA como vigário de Cristo.

Deve-se sempre, absolutamente, acatar todo ensinamento ex cathedra, sob pena de deixar de ser católico, como se deve também respeitar o Magistério Ordinário. Não é lícito crer que se pode, à vontade, discordar do Papa naquilo que ele ordinariamente afirma, acreditando ser obrigatório acreditar, apenas, naquilo que ele afirma em caráter extraordinário.

Como princípio, não se pode discordar do Papa, mesmo quando se pronuncia de modo falível, como se discorda de um jornalista, por exemplo. É preciso haver fortíssimas razões para isso. E essas fortíssimas razões são os ensinamentos de outros Papas, e não nossa opinião.

Mesmo quando o Papa ensina ordinariamente, isso não significa que é apenas Simão quem fala, e não Pedro. Pedro - e não apenas Simão - também fala falivelmente. Ele não é Pedro apenas quando fala ex cathedra...

Mas, não se deve querer errar com ninguém, nem mesmo com o Papa, que pode errar quando dá uma simples opinião pessoal. A autoridade do Papa não foi instituída por Cristo para que errássemos com ele, mas para acertarmos com ele!

Quando o tal padre que você citou usou essa frase que acabo de analisar, ele só quis fugir da discussão, porque já não tinha resposta. Fugiu, dizendo um chavão, e um chavão falso e malicioso, e muito provavelmente sem se dar conta da malícia oculta na frase, que ele repetia simplesmente por tê-la ouvido, e nada mais.

Reze por ele, a fim de que Nosso Senhor lhe abra os olhos e lhe dê a coragem de olhar a verdade de frente, sem fugir apelando a slogans sofísticos. Esperando tê-lo atendido me subscrevo atenciosamente,

in Corde Jesu, semper,
Orlando Fedeli