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Império Colonial Britânico. Parte 2 de Impérios Coloniais.
Marcelo Andrade
4.2.1- INTRODUÇÃO
4.2.2 - VIRGÍNIA E A SERVIDÃO BRANCA
4.2.3 - MARYLAND
4.2.4 - NOVA YORK E NOVA JERSEY
4.2.5 - NOVA INGLATERRA E OS PURITANOS
4.2.6 - PENNSYLVANIA E OS QUAKERS
4.2.7 - CAROLINA
4.2.8 - GEORGIA
4.2.9 - ÍNDIOS AMERICANOS E MASSACRES
4.2.10 - O VERDADEIRO THANKSGIVING DAY
4.2.11 - ESCRAVOS AFRICANOS E RACISMO
4.2.12 - ADMINISTRAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
4.2.13- NOTA SOBRE A INDEPENDÊNCIA DAS TREZE COLÔNIAS
4.9.1 - OS INDIANOS
4.9.2 - DESENVOLVIMENTO
4.9.3 - FOME
4.10.1 - AUSTRÁLIA (1788-1901)
4.10.2 - INTRODUÇÃO
4.10.3 - “CONVICT LABOUR”
4.10.4 - OS “BLACKBIRDS”
4.10.6 - ABORÍGENES E MASSACRES
4.10.7 - RACISMO NA IMIGRAÇÃO
4.10.8 - DESENVOLVIMENTO
4.10.9 - NOVA ZELÂNDIA (1831-1907)
4.11.1 - INÍCIO E O “CANADÁ FRANCÊS”
4.11.2 - “HUDSON BAY COMPANY” E “CANADÁ INGLÊS”
4.11. 3 - FUSÃO E NASCIMENTO DO CANADÁ
4.11. 4 - RACISMO E EUGENIA
↑4- O IMPÉRIO COLONIAL BRITÂNICO
As primeiras grandes navegações inglesas começaram na época de Henrique VII (1457-1509), quando a Inglaterra ainda era católica. O italiano Sebastião Caboto, a serviço da Inglaterra, comandou as principais expedições que tiveram como destino a América, no começo do séc. XVI. Porém, somente no reinado de Isabel I (1533-1603) iniciou-se para valer o Império Colonial Britânico. Analisaremos as colônias: “Treze Colônias”, algumas do Caribe, algumas da África, Índia, Austrália, Nova Zelândia e Canadá. O foco será as colônias enquanto colônias, e não sua história depois da independência da Inglaterra. Usaremos indistintamente os nomes Inglaterra e Império Britânico, por força do hábito.
Os ingleses, na maioria das vezes, exploraram suas conquistas por meio de companhias majestáticas e não diretamente. As “chartered companys” ou companhias de carta ou ainda companhias majestáticas eram empreendimentos possuidores de concessão de um governo que lhes conferia vantagens comerciais e monopólios em determinadas áreas ou colônias. Desta forma, certos governos não exerciam a soberania diretamente, mas por meio destas companhias. Tratava-se de uma colonização indireta na qual havia confusão entre o poder público e o privado. Atendiam aos interesses de investidores e visavam somente a lucros. As companhias majestáticas, ocupando a zona cinzenta entre o poder político e mercantil, combinando impiedosas táticas do despotismo com estrutura legal de busca por lucros, derrogaram o livre mercado (BOWN, 2009, p.4-5). O parlamento inglês era corrupto (ALLEN, 1968, p. 23) e isto favorecia a confusão entre o público e o privado, a pirataria, os monopólios e a corrupção nas companhias que eram dependentes politicamente do Parlamento. Jaime II, por exemplo, antes de ascender ao trono foi governador da “Hudson Bay Company” e encabeçou também a “Royal African Company”. O imperialismo distorcia as forças de mercado – usando de tudo, desde poderio militar até tarifas preferenciais para manipular os negócios a favor das metrópoles (FERGUSON, 2003, p. 15). Isto demole a ideia de que a Inglaterra tenha sido “liberal”. A Inglaterra nunca foi “liberal” em suas colônias, sempre abusou dos monopólios, das trapaças, da pirataria, das taxações abusivas, dos massacres dos povos autóctones, dos maus tratos contra os escravos etc. O Império Britânico começou como um redemoinho de violência e ladroagem marítimas (FERGUSON, 2003, p.26). O Império se utilizou de ladrões como o pirata Morgan para roubar os Impérios marítimos dos outros (FERGUSON, 2003, p.26). Como os ingleses não acharam metais preciosos (ouro e prata), só havia uma coisa a fazer: roubar os espanhóis (FERGUSON, 2003, p. 32). Ele não foi concebido por imperialistas conscientes, desejosos de estabelecer o domínio britânico sobre terras estrangeiras, ou colonos esperançosos por construir uma nova vida além-mar (FERGUSON, 2003, p. 26)
Na verdade, a Inglaterra não colonizou os Estados Unidos, ela colonizou apenas as “Treze Colônias” que foram o embrião do futuro país. A maior parte do território dos Estados Unidos atual pertenceu à França e à Espanha. Inicialmente, a Inglaterra criou duas companhias majestáticas: a “Virginia Company” e a “Plymouth Company” para explorar o litoral norte-americano.
As Treze Colônias começaram pelo atual estado da Virgínia. Realmente, esta colonização começou de modo missionário e avesso à exploração. Só que feito por espanhóis... Na baía de Chesapeake, os espanhóis fundaram uma missão jesuítica, conhecida como “Ajacán” (1570), tendo como objetivos a conversão dos índios e a construção de uma colônia. Infelizmente, o projeto não foi adiante porque a missão foi destruída pelos indígenas liderados por um índio convertido e traidor em 1571. Depois deste acontecimento, os espanhóis, por esta e outras razões, desinteressaram-se pela região, o que abriu espaço para os ingleses. A afamada rainha inglesa Isabel I, que praticava bruxaria e que mandou matar sua prima, Maria da Escócia, encarregou Walter Raleigh, homem ávido por poder e lucro, espião e pirata, de construir uma colônia em Chesapeake. Esta inicial tentativa inglesa também fracassou. A colonização começou, de fato, quando o rei Jaime I fundou a “Virginia Company”, voltada para a exploração da região com a finalidade de lucro e a busca de metais preciosos. A fundação da colônia da Virginia foi um empreendimento comercial empreendido por certos indivíduos privados com o objetivo de expandir o comércio da Inglaterra e trazer lucro tanto para ela quanto para os investidores (ANDREWS, 1961, p.3). A Companhia fundou uma cidade de nome Jamestown. Curiosamente esta cidade era tão comunista... que faria inveja em Stalin e Mao Tsé Tung. Por contrato, todos os bens produzidos pelos trabalhadores individualmente tinham de ser colocados à disposição para a comunidade gerir. Trabalha-se como podia e ganhava-se conforme a “necessidade”, que era definida pela comunidade. Obviamente, isto não deu certo porque o comunismo nunca funcionou em lugar nenhum. Houve fome e até canibalismo e a Companhia teve de abandonar este modelo. A primeira cidade americana começou, digamos, de forma maoista. Para o empreendimento colonial, a Companhia da Virgínia não trouxe escravos da África, pelo menos não em grande escala. Não foi necessário, pois a companhia podia contar com escravos brancos vindos da Inglaterra. Londres, no final do século XVI e começo do século XVII, era uma cidade famosa pela pobreza, crimes, incêndios e execuções (TAYLOR, 2001, p. 122). A taxa de mortalidade superava a de nascimento em 1650 (JAMES, 1994, p.10). A população não decrescia porque havia migração interna. A fome e a miséria em Londres eram tão grandes que as pessoas se “vendiam” para trabalhar na Virgínia, sob o contrato da “escravidão temporária”. E muitos futuros escravos eram sequestrados nas ruas inglesas e levados à força para a Virgínia (JAMES, 1994, p.37). A “Indentured Servant” era uma espécie de escravidão temporária, na qual trabalhava-se como escravo por quatro ou cinco anos e depois de findo o prazo, o escravo era liberto (TAYLOR, 2001, p. 142). Em decorrência disto, estabeleceu-se um comércio lucrativo com a intermediação de “corretores”. Esta servidão temporária era aplicada a crianças também. A Companhia da Virginia chegou a fazer um acordo com a cidade de Londres para obter cem crianças pobres e brancas para serem enviadas para a Virginia e lá serem vendidas como escravas para os donos de terra locais. Estas pobres crianças eram descritas como “pragas” ou “elementos desordeiros” (HOFFMAN,1993, p. 32). Uma lei foi aprovada em 1618 e previa a captura de crianças abandonadas em Londres, a partir dos oito anos de idade, que seriam levadas à Virginia para trabalhos forçados durante 16 anos para meninos e 14 anos para meninas (HOFFMAN, 1993, p. 32). Porém, como o trabalho era muito intenso e as punições eram brutais em caso de faltas, muitos morriam antes do prazo final do trabalho forçado. A Companhia da Virginia faliu em 1624. A Coroa inglesa assumiu a administração e instalou uma “plantation”[1] de tabaco. A mentalidade monopolista foi mantida, assim, por exemplo, todo o tabaco produzido tinha de vendido para a Inglaterra, por meio de barcos ingleses (TAYLOR, 2001, p.147). Com a decadência da “Indentured Servant”, estabeleceu-se a escravidão negra. A Religião Católica durante um bom tempo foi proibida.
Lord Baltimore conseguiu um “charter” (1634) do rei Carlos I e deu o nome do futuro estado em homenagem à esposa do rei, Maria. Foi uma região de tolerância religiosa, onde curiosamente a única proibição era de negar a Santíssima Trindade (ALLEN, 1968, p. 17). Foi o destino de muitos católicos e os jesuítas se instalaram por lá. Lá também houve com intensidade a “Indentured servants” e a plantação dominante foi o tabaco.
Nova York, fundada pela holandesa Companhia das Índias Ocidentais (WIC), com a finalidade de estabelecer um entreposto meramente comercial, foi batizada de “Nova Amsterdã” (1624). Como era a regra nas colônias holandesas, a intolerância religiosa era de rigor e o catolicismo era proibido. Porém, havia liberdade para os judeus que afluíram para lá em grande quantidade e a primeira sinagoga dos Estados Unidos é de lá[2]. Também era de regra o ódio contra os índios. William Kieft, diretor de Nova Amsterdã comandou o massacre de Pavonia contra os índios em 1643. Porém, como as colônias do Caribe davam mais lucros que Nova Amsterdã, na terceira guerra anglo-holandesa (1672-1674), na qual a Holanda saiu vitoriosa, a Companhia das Índias Ocidentais holandesa trocou Nova Amsterdã pelo Suriname e por uma ilha na Indonésia (BOWN, 2009, p. 100-101). Nova York, de um “negócio” holandês passou a ser um “negócio” inglês. Depois de vários “charters”, estabeleceu-se o “Montgomerie Charter” de 1730, meio pelo qual a cidade se tornou uma corporação, na qual interesses privados e públicos se confundiam (HARTOG, 1989, p. 14). A região católica em Nova York restou proibida até pouco mais da metade do século XVIII. (DUNCAN, 2005, p.19). New Jersey, por sua vez, antes de ser uma colônia independente, foi zona de influência da WIC, depois passou para o domínio inglês e chegou a ser controlada pelos Quakers durante um tempo.
A “Nova Inglaterra”, na origem, englobava a área dos futuros estados do Connnecticut, Maine, Massachusetts, New Hampshire, Rhode Island e Vermont, além de Plymouth, que foi integrado ao Massachusetts posteriormente. Inicialmente, a colonização ficou a cargo da “Plymouth Company”. No decorrer dos anos, a área foi se desdobrando em várias colônias e outras companhias surgiram. Mas, após um jogo de interesses que envolveu a “Dorchester Company” e a “New England Company” (ROSE-TROUP, 2009) acabou-se formando outra companhia de nome “Massachusetts Bay Company” que administrou a região e trouxe muito colonos. A “Saybrook Colony”, instalada no atual Connecticut, foi outra “Company” formada por investidores, um deles ligado à pirataria, Robert Rich. A maioria dos imigrantes que foram para a Nova Inglaterra eram dissidentes religiosos, que abandonaram a Inglaterra por causa de intolerância religiosa e fundaram, na América, uma colônia baseada na intolerância religiosa. Perseguia-se quem não aderisse à religião “oficial”, muitos foram acusados de bruxaria e executados. O mais famoso destes processos foi o das “Bruxas de Salem” em 1692 (TAYLOR, 2001, p. 184). Por razões religiosas, Roger Williams foi expulso da “Massachusetts Bay Company” e fundou o que seria o futuro estado de “Rhode Island”. Os primitivos puritanos, que viajaram no Mayflower desde a Inglaterra até Palymouth, pretenderam fundar em 1620, assim como Munzer, na Alemanha do século XVI, uma Nova Jerusalém (BUSTAMANTE, 2005, p. 48). Munzer era um dissidente do luteranismo que fundou uma comunidade completamente igualitária na Alemanha e cujos sectários eram chamados anabatistas. Ou seja, havia elementos milenaristas e igualitários entre os pioneiros americanos. Eles não eram apenas fundamentalistas; também eram comunistas, que pretendiam possuir sua propriedade e distribuir sua produção igualitariamente (FERGUSON, 2003, p. 84) De fato chegaram a instalar o comunismo, na Plymouth Colony em 1620. Nessa colônia, toda a produção deveria ser entregue para armazenamento comunitário, do qual cada indivíduo receberia uma fração igual, não importando com quanto contribuísse com a repartição dos bens produzidos. Porém, em 1623 houve uma grande fome e por causa disto tiveram de abolir o sistema comunitário. Outros que vieram junto com eles estavam apenas fugindo da depressão na indústria têxtil (FERGUSON, 2003, p. 84). Havia também os adeptos da tese de que “lucro e religião andam juntos” (TAYLOR, 2001, p. 166), visão tipicamente calvinista. Lá houve a “indentured servitude”, ainda que em menor grau que na Virginia. (TAYLOR, 2001, p. 169-179). Havia escravidão africana, muitos mercadores da região tinham laços com o tráfico de escravos, incluindo Peter Faneuil[3], de Boston. Nesta mesma cidade havia também escravos indígenas (GALLAY et al., 2009, p. 24). A região chegou a trazer escravos indígenas de outras regiões e até mesmo do Caribe. (GALLAY et. al., 2009, p. 33) A força de trabalho escrava teve uma vital contribuição para a economia do norte (POPE, 1998, p. 16).[4]
↑4.2.6 - PENNSYLVANIA E OS QUAKERS
O rei inglês Carlos II querendo quitar uma dívida que o reino tinha com o pai de William Penn, resolveu dar a este (que havia herdado o crédito do pai como herança) como pagamento daquele débito, algumas terras na América, que se converteriam na futura Pennsylvania, no ano de 1681. William Penn era muito rico e um “quaker” obstinado. O Quakerismo é uma seita protestante mística advinda do anabatismo que defendia o igualitarismo, ideologicamente mais próximo do marxismo que do liberalismo. Eram conhecidos como quakers porque quando o “Espírito Santo” supostamente “entrava” neles, eles “tremiam”.[5] Obcecados pela ideia de irmandade, intitulavam-se como “amigos de Deus”. Eram contra qualquer hierarquia na religião, não reconheciam distinção de classe social, usavam roupas simplórias (e escuras) e usavam linguagem familiar com todos: não se podia nem usar a palavra “mister”, por exemplo. Homens e mulheres eram tidos como iguais, ou seja, já havia naquelas terras um feminismo “avant la lettre”. Muitos quakers pregavam abertamente, quer na América do Norte quer na Europa continental, contra a propriedade privada defendendo que todos os bens deviam ser comuns (BERNSTEIN, 1980, p. 234). William Penn fundou a cidade de Filadélfia, a cidade do amor fraterno, de cunho bastante milenarista. Ardoroso defensor da igualdade, possuía escravos e montou também uma “companhia” para gerir as questões fundiárias. A cidade do “amor fraterno” se tornou um porto importante de importação de escravos e lá havia também a “indentured servants”.
A Carolina foi fundada por exploradores das Índias Ocidentais, conhecidos como “Lords Proprietors” compostos por oito políticos poderosos ligados ao rei Carlos II, daí o nome “Carolina” (TAYLOR, 2001, p. 223). Este “lords” não foram morar na América e administravam desde a Inglaterra. Nomearam para governar a região John Yemans, que havia matado um desafeto em Barbados e era conhecido como “pirata de terra firme”. Yemans trouxe os primeiros escravos africanos para o trabalho nas lavouras, onde o modelo econômico foi inspirado em Barbados, ou seja, nitidamente exploratório e escravista. A diferença era que a produção era de arroz e não de cana. Tal modelo gerou riqueza para muitos poucos proprietários, incluindo é claro os “lords”, sob uma massa de escravizados (TAYLOR, 2001, p. 243). O desprezo pelos índios era a regra e as guerras contra eles eram uma constante. Em caso de fuga de escravos, o governo prometia uma “paz com os índios” em troca de busca e entrega dos escravos fugitivos pelos índios. (TAYLOR, 2001, p. 223). Estabeleceu-se um tráfico no qual se exportava para as Antilhas, em especial para Barbados, índios cativos na Carolina e importava-se escravos africanos que lá viviam, na proporção de 2 índios por 1 africano. A desproporção se explica pela maior taxa de mortalidade dos índios (TAYLOR, 2001, p. 231).
Em 1720, Os “Georgia Trustees”, um conjunto de mercadores, ministros anglicanos e nobres da terra fundaram a colônia da Georgia (o nome foi uma homenagem ao rei Jorge II). Foram financiados pelo parlamento inglês com fundos obtidos pelos tributos pagos pelos ingleses. (TAYLOR, 2001, p. 241). Talvez tenha sido o único lugar onde a proibição da escravidão (1735) tenha sido feita antes de sua legalização (1751). Muitos colonos foram morar lá porque a colônia se tornou um “asilo de devedores” (FERGUSON, 2003, p. 132) que fugiam dos credores pois, estando na Georgia, eles não precisavam pagar mais suas dívidas. No mais, o que vale para a Carolina, vale para a Georgia, em termos de exploração econômica. (TAYLOR, 2001, p. 243).
↑4.2.9 - ÍNDIOS AMERICANOS E MASSACRES
Os índios americanos tinham hábitos brutais como infanticídio, canibalismo, crueldade exacerbada contra os inimigos etc. Entre os índios Natchez, havia um suicídio ritual parecido com o “sati” indiano e ligado ao culto do sol. Os Iroquois praticavam tortura cerimonial e canibalismo. (TAYLOR, 2001, p. 103) Em época de carestia, muitas tribos tinham hábito de se sangrarem para a terra. Os ingleses tinham um profundo desprezo pelos índios e não fizeram quase nada para elevá-los à civilização. Em um sermão de um clérigo em 1609, foi dito que aquelas terras (das Treze Colônias) tinham sido usurpadas pelas bestas selvagens e criaturas irracionais (os índios) e deveriam ser remidas pelos ingleses (JAMES, 1994, p. 12). Durante um século, foram feitos relatos extensivos das novas terras e neles, quase sem exceção, os índios eram representados como uma raça degenerada e inferior (JAMES, 1994, p. 13) O filósofo John Locke, secretário dos Lords Proprietors da Carolina, disse que se os índios resistissem à expropriação das terras, podiam e deviam ser destruídos como um leão ou um tigre, uma dessas feras selvagens, com as quais o homem não pode ter sociedade ou segurança (FERGUSON, 2003, p. 87). Pouco interesse havia em converter os índios por parte dos protestantes (GALLAY, ET AL, 2009, p.16) O primeiro governador da Virginia, Francis Wyatt declarou: “Nosso primeiro trabalho é a expulsão dos selvagens para ganhar ar livre do país e incrementar a pecuária e a suinocultura... para isso é melhor não haver nenhum pagão entre nós” (TAYLOR, 2001, p. 135) John Smith, que havia sido salvo da morte por uma índia[6], declarou após saber dos massacres contra os índios, que ficou feliz e disse que isto era bom para as plantações (TAYLOR, 2001, p. 135) Os colonos da Virginia desenvolveram uma estratégia que depois foi usada em outros massacres que consistia em esperar até imediatamente antes das colheitas de milho e atacar os nativos e destruir suas plantações, assim eles poderiam matar os índios de fome (TAYLOR, 2001, p. 135) Certa vez os colonos convidaram dezenas de índios para “negociações de paz” e serviram a eles bebidas envenenadas. Os índios que não morreram com isto foram mortos à espada (TAYLOR, 2001, p. 135) A legislação da Virginia permitia aos colonos matar qualquer índio que atravessasse suas plantações (TAYLOR, 2001, p. 136) É verdade que muitos índios morreram por causa da “praga branca”, que eram as doenças trazidas pelos brancos. Em especial, a catapora matou muitos índios. Estas “pragas brancas” eram comemoradas pelos colonos. Na prática, havia quatro possibilidades para os nativos: serem exterminados nas guerras, morrerem por causa de doenças trazidas pelos brancos, serem expulsos de suas terras e empurrados para o oeste ou serem vendidos como escravos para o Caribe. Muitas guerras ocorreram: Pequot War, Anglo Powhatan War, King´s Philip´s war etc. Como resultado desta política de apartação e extermínio houve pouca miscigenação. Os Estados Unidos independentes herdaram o ódio inglês contra os índios e fizeram dezenas de guerras de extermínio. Benjamin Franklin, um dos líderes da revolução americana, disse em sua autobiografia que: “um dos desígnios da Providência Divina era extirpar os selvagens (índios) a fim de abrir espaço aos cultivadores da terra” (MOOG, 2011, p. 108) George Washington, o primeiro presidente americano comparou os índios a lobos, merecedores do mesmo tratamento que esses. [7]
Todos os anos os americanos festejam o dia de “Thanksgiving Day”, na quarta quinta-feira de novembro. Segundo a tradição, a origem foi uma confraternização dos pioneiros com índios, feita no começo do séc. XVII. Está é a lenda... A verdadeira estória do primeiro “Thanksgiving Day”é: John Winthrop, governador de Massachussets proclamou uma "Ação de graças", em 1637, para celebrar o retorno seguro de um bando de caçadores fortemente armados, todos eles colonos voluntários. Eles tinham acabado de voltar de sua jornada para onde é agora Mystic, Connecticut, onde massacraram setecentos índios da tribo Pequot. Homens, mulheres e crianças - todos assassinados.[8] Todo ano, no mesmo dia (do Thanksgiving), índios vão ao local do massacre e celebram o “dia do pranto”.
↑4.2.11 - ESCRAVOS AFRICANOS E RACISMO
A brutalidade no tratamento contra os escravos era a regra. Um observador notou: “Os colonos não querem acreditar que os negros são criaturas humanas (TAYLOR, 2001, p. 155) Não havia o mínimo interesse em torná-los cristãos (TAYLOR, 2001, p. 214) O casamento inter-racial era proibido desde 1705, na Virginia (FERGUSON, 2003, p. 132) e em alguns casos havia penas pesadas quando ocorresse (TAYLOR, 2001, p. 156) Os negros não tinham direitos iguais aos brancos mesmo quando eram livres e emancipados. Negro e escravo eram palavras sinônimas (TAYLOR, 2001, p 156-157) Houve casos de negros livres que foram reescravizados e vendidos de novo. Mais uma vez os Estados Unidos independentes herdaram o racismo dos ingleses. Lincoln, por exemplo, era um típico racista: Eu não tenho intenção de introduzir uma política social de igualdade entre as raças brancas e negras. Há diferenças físicas entre os dois as quais, e em meu julgamento, provavelmente será sempre proibida sua convivência sobre a base de igualdade perfeita, e na medida em que se torna uma necessidade que deve haver uma diferença, eu, assim como o Juiz Douglas, sou em favor da raça a que pertenço ter a posição superior[9] Nos Estados Unidos, a igualdade de direitos entre bancos e negros só foi oficializada na década de 1960.
↑4.2.12 - ADMINISTRAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
Oficialmente, as relações da Inglaterra com as “Treze Colônias” eram distintas para cada uma delas. (ALLEN, 1968, p.22) E as colônias eram e se achavam bem diferentes. Segundo Benjamin Franklin: A desconfiança umas das outras [colônias] é tão grande que, por mais que uma união das colônias seja há muito tempo necessária, para sua defesa comum, e sua segurança contra seus inimigos, e por mais que cada colônia tenha sentido essa necessidade, ainda assim nunca foram capazes de efetivar uma tal união entre elas que tinham formas de governo diferentes, leis diferentes, interesses diferentes, e algumas delas confissões religiosas diferentes e costumes diferentes” (FERGUSON, 2003, p. 114). No final do século XVII havia três tipos de colônias: a companhia detentora de uma carta patente, a colônia particular e a colônia real. A Coroa tentou simplificar a relação submetendo todas ao Ministério do Comércio e das Plantações. (ALLEN, 1968, p. 22). O fato de as colônias estarem sob a tutela deste ministério revelava a intenção meramente comercial dos ingleses. O executivo era formado pelos governadores nomeados pela Coroa, e o legislativo era formado pelas assembleias locais eleitas pelos colonos (base de votos restrita) que podiam ser dissolvidas pelo governador (ALLEN, 1968, p. 23). Assim, cada colônia tinha seus próprios governadores e assembleias locais. A Inglaterra, como era a regra em todos os lugares, impunha o monopólio em suas colônias prejudicando o “livre comércio” e também havia taxação pesada de alguns produtos. Havia o monopólio dos barcos ingleses, no qual nenhum bem que saísse das Treze Colônias poderia usar bandeira de outro país, a imposição de que a importação de produtos das colônias seria feita apenas por comerciantes ingleses e a proibição das indústrias de lã e da laminação. (ALLEN, 1968, p. 24) Como resultado de tantas taxas, limitações e monopólios, o contrabando era a regra, muito comum via Holanda (KOOT, 2011). Por exemplo, cinco sextos das importações totais de melado produzido em Rhode Island eram contrabandeados (ALLEN, 1968, p. 25). Houve certa vez a famosa “festa do chá”, na qual centenas de caixas de chá foram lançadas ao mar em Boston, como forma de protesto contra a Inglaterra. O chá era monopólio da BEIC (Companhia das Índias Orientais Britânica). O curioso é que a taxação do produto havia caído e não subido. Os protestos foram feitos por contrabandistas que temiam a concorrência “oficial” possuidora de um produto barato e dentro da legalidade. (FERGUSON, 2003, p. 110). A Inglaterra também proibia a cunhagem de moedas, o que criou um grande problema para a nação recém-independente, depois de 1776. Os Estados Unidos tiveram de adotar um padrão e escolher uma moeda internacional para a circulação em seu território. Escolheram, então, adotar uma moeda confiável (que circulava até na China) de um local próspero, com arte desenvolvida e população miscigenada. Este local era a “Nova Espanha”, o atual México. Os pesos mexicanos circularam oficialmente nos Estados Unidos até 1857 (FERGUSON, 2013) Nas Treze Colônias, os primeiros hospitais surgiram em meados do séc. XVIII, mais de 100 anos depois da chegada dos primeiros colonos. Fato que mostra um certo desprezo pela caridade.[10] Por outro, as Treze Colônias tiveram muitos “colleges”, instituições aparentadas às universidades, mas com muito poucos alunos. Harvard, por exemplo, foi fundada por puritanos em 1636, época em que contava com nove aprendizes. O estilo arquitetônico predominante era o georgiano, que não possuía a beleza nem o esplendor do barroco colonial português e do espanhol. Não há nenhuma cidade histórica nas Treze Colônias com beleza digna de nota ou do nível de Ouro Preto ou Cusco. O desenvolvimento das colônias foi irregular, a Virgínia foi durante muito tempo a mais próspera. Depois, foi a Nova Inglaterra que possuía o melhor nível de vida, melhor que a Inglaterra, no século XVIII, o que não era difícil, pois Londres, por exemplo, como já foi dito, era uma cidade com nível péssimo de vida. Apenas 5% dos habitantes viviam em cidades, no século XVIII, nelas, a desigualdade de renda era enorme e a pobreza crescia (TAYLOR, 2001, p. 308), incluindo Boston, na Nova Inglaterra, o local mais rico. Segundo um observador novaiorquino, os homens enriqueciam a custa do empobrecimento dos vizinhos (TAYLOR, 2001, p. 308). As Treze Colônias perdiam em desenvolvimento para o Caribe. Ferguson (2003, p. 93-94): Em 1773, o valor das importações britânicas da Jamaica foi cinco vezes maior que todas as Treze Colônias. Nevis produziu três vezes mais importações britânicas que Nova York entre 1714 e 1773, Antígua, três vezes mais que a Nova Inglaterra. (...) Durante a maior parte do século XVIII, as colônias americanas foram pouco mais do que subsidiárias econômicas das ilhas do açúcar. Ferguson (2003, p. 94-95): William Pitt preferiu a opção caribenha, pois: “a situação do comércio existente nas conquistas da América do Norte é extremamente ruim; as especulações sobre o futuro delas são precárias, e a perspectiva, na melhor das hipóteses, muito remota” Em 1776, a população total das Treze Colônias era estimada em 2,5 milhões de habitantes.
↑4.2.13- NOTA SOBRE A INDEPENDÊNCIA DAS TREZE COLÔNIAS
Como foi que as colônias, que não eram tão ricas nem tão prósperas como reza a lenda, submetidas a uma cultura de monopólio e escravidão, conseguiram a independência (1776-1783) da Inglaterra, já uma potência militar mundial? Na verdade, a Guerra da Independência dos Estados Unidos foi uma grande vitória da França e da Espanha sobre a Inglaterra. Se não fosse a ajuda da França e da Espanha, inimigas da Inglaterra, a história teria sido outra. Na Guerra Anglo-americana de 1812-1815, por exemplo, travada na América do Norte, na qual os Estados Unidos não contaram com a ajuda externa, estes não conseguiram nada do que pretendiam e ainda viram a cidade de Washington ser incendiada pelos ingleses. Outra razão para terem conseguido a independência foi justamente o fato de que as Treze Colônias não eram ricas, assim não valia a pena para a Inglaterra lutar tanto por elas: era mais interessante proteger as ilhas do Caribe, a joia da Coroa (FERGUSON, 2003, p. 118). Outro dado econômico era que o comércio com a Índia também crescia em importância e a BEIC (Britsh East Indian Company) era a companhia mais rica do mundo e precisava ser resguardada.
↑4.3 – CARIBE (SÉC. XVII E XVIII)
A Inglaterra possuiu várias ilhas e partes da América Central. Poremos em relevo as duas mais importantes nos séculos XVII e XVIII. Durante muito tempo, o Caribe produziu mais riqueza para a Inglaterra que as Treze Colônias. A Jamaica, em 1713, era a colônia mais rica e importante do Império Britânico (TAYLOR, 2001, p. 220). Além da riqueza produzida pelo açúcar havia aquela obtida pelos bucaneiros, mediante pirataria e saques de cidades espanholas situadas à beira-mar no Caribe. Em certa época, Henry Morgan, pirata, foi governador da Ilha e comandava um comércio lucrativo de pirataria. Port Royal era a capital mundial da pirataria e terceira cidade mais populosa das colônias britânicas. Também tinha a fama de ser a “Sodoma das Índias Ocidentais”, tal a sua sujeira moral (TAYLOR, 2001, p.219). O tratamento dado aos escravos era cruel, houve rebeliões de escravos que foram reprimidas com violência. Barbados era provavelmente a pior colônia do mundo inteiro, nos séculos XVII e XVIII. Em razão de vitórias em batalhas na Irlanda, o regicida Oliver Cromwell, então “homem forte” da Inglaterra, enviou 50.000 prisioneiros de guerra irlandeses para trabalharem como escravos em Barbados, na década de 1650. Eles e seus descendentes ficaram conhecidos como “redlegs”. Para lá foram enviados também escravos africanos e até índios oriundos da América do Norte. O tratamento dado a eles também era brutal. A elite tinha tanto de medo de uma possível revolta que as casas eram fortificadas. (TAYLOR, 2001, p. 216). O desenvolvimento do açúcar só deu vantagem para uma minoria de colonos, que visavam apenas lucro e logo queriam voltar para a Inglaterra (TAYLOR, 2001, p. 216). Mas, muitos proprietários de terra morriam antes de conseguir riqueza, devido a muitas doenças. Era comum os habitantes se referirem a ilha como “Inferno”.
↑4.4 - AFRICA OCIDENTAL (SÉC. XVI E XVIII)
Em 1672 foi fundada a “Royal African Company” que visava o monopólio do tráfico de escravos. Era o único interesse que a Inglaterra tinha na África, na ocasião. Somente no século XIX a Inglaterra iria colonizar partes da África.
↑4.5 -INGLATERRA NO FINAL DO SÉCULO XVIII E COMEÇO DO SÉCULO XIX
Londres no final do século XVIII e começo do século XIX era uma cidade suja, cheia de pobres e ladrões. Dizia-se que era a mais malcheirosa do mundo. A Inglaterra estava em plena Revolução Industrial. Nessa época criminosa, na qual pelo menos 500.000 operários morreram devido às condições de trabalho, havia também a “child slavery” (a escravidão de crianças). As crianças eram levadas a trabalhar nas fábricas e minas inglesas a partir dos 4 anos de idade, com jornadas, às vezes, de 16 horas por dia, durante 6 dias por semana, às vezes, sete dias. Muitas crianças abandonadas eram simplesmente recolhidas nas ruas e enviadas forçadamente para trabalhar, outras eram vendidas para as fábricas. As crianças eram trancadas nas fábricas para jornadas de 16 horas por dia e eram mutilados por máquinas primitivas. Mãos e braços eram frequentemente rasgados pelas peças. Meninas pequenas muitas vezes tinham seus cabelos presos nas máquinas e eram escalpadas. Crianças que chegavam tarde ou dormiam em serviço eram espancadas com barras de ferro. Havia crianças com correntes nas pernas (HUMPHRIES, 2010) As minas eram especialmente cruéis, a taxa de mortalidade era altíssima. Interessante observar que na Roma Antiga, a “pena de morte” era igual à pena de trabalhar nas minas. A diferença entre Roma e Inglaterra era que, em Roma, os condenados é que iam para as minas e não crianças. Pouca diferença havia entre trabalhar na Inglaterra nestas minas e fábricas ou trabalhar nos campos de Mao Tsé Tung ou nas fazendas coletivizadas de Stalin. Os “capitalistas” da revolução industrial eram como os membros do politburo soviético.
A “Britsh East Indian Company” (BEIC) foi fundada em 1600. O objetivo era controlar o comércio com o oriente. A companhia estabeleceu feitorias em Surat (1612), Madras (1639) e Calcutá (1690) Com o tempo, passou a ter o monopólio deste comércio com o Oriente. Na Índia, a BEIC podia cobrar impostos (o diwani) sobre mais de 20 milhões de pessoas (FERGUSON, 2003, p. 61). Tornou-se uma poderosa companhia com direito de declarar guerra, administrar a Justiça e fazer diplomacia com governantes estrangeiros. (BOWN, 2009, p. 108). Possuía uma armada e exército de mercenários, chegando a contar com 100.000 soldados (FERGUSON, 2003, p.) Também praticava a pirataria, era corrupta, com relações estreitas com o governo inglês (HUGHES, 1986, p. 58). Estabeleceu um lucrativo comércio de ópio com a China. Clive, um dos presidentes da companhia tornou-se um usuário de ópio (BOWN, 2009 p. 124). Ele era uma pessoa dissoluta que saqueou as riquezas dos lugares por onde andou (FERGUSON, 2003, p. 61). No século XVIII era a companhia mais poderosa do mundo.
↑4.7 - CHINA E GUERRA DO ÓPIO
A BEIC fazia comércio com a China, comprava chá, cerâmica, seda e prata e revendia ópio. Tecnicamente isto era um “tráfico”, já que o ópio era proibido na China, ainda que tolerado. O ópio é uma droga: O uso do ópio mascado ou fumado, que se espalhou no Oriente, provoca euforia, seguida de um sonoonírico; o uso repetido conduz ao hábito, à dependência química, e a seguir a uma decadência física e intelectual, uma vez que é efetivamente um veneno estupefaciente.[12] Desde 1793, a BEIC detinha o monopólio do comércio do ópio com a China. Em 1839, o Imperador Chinês resolveu erradicar o comércio do ópio porque estava prejudicando o país, devido ao vício. Após alguns incidentes, a BEIC e a Inglaterra declaram guerra à China (Primeira Guerra do Ópio) e venceram. Como resultado, a Inglaterra ganhou a futura localidade de Hong-Kong, como território seu, e conseguiu acesso a mais alguns portos. E é claro, com a vitória, a BEIC podia continuar vendendo ópio para toda a China monopolisticamente.
↑4.8 - OS “COOLIES”
Os “coolies” eram trabalhadores oriundos da Ásia, mormente da China e da Índia. Após o fim da escravidão, muitos países ainda queriam “mão de obra barata” para trabalho nas plantações, minas e ferrovias e os “coolies” eram esta mão de obra. Os “coolies” eram recrutados por meio de negociações voluntárias, porém, havia muita trapaça e houve casos de sequestro. O transporte era feito em navios superlotados. Em muitos locais de destino, sua condição de trabalho era similar a dos escravos. Os destinos eram bem variados: América, África do Sul, partes da Ásia e Oceania. Os ingleses dominaram amplamente este comércio. Ferguson (2003, p. 232): Entre 1820 e 1920, perto de 1,6 milhões de indianos abandonaram a Índia para trabalhar em várias colônias no Caribe, na África e nos oceanos Índico e Pacífico, desde as plantations de borracha malaias até as usinas de açúcar de Fiji. As condições que eles viajavam e trabalhavam eram frequentemente pouco melhores que daquelas que haviam sido impostas aos escravos africanos no século anterior.
↑4.9 - INDIA – RAJ BRITÂNICO
A colonização britânica na Índia começou no século XVII, mas somente no século seguinte a sua importância cresceu. Tudo no começo era feito pela BEIC. A Companhia superou a concorrência holandesa e a francesa pela força e se impôs.
↑4.9.1 OS INDIANOS
Os indianos tinham hábitos bastantes selvagens, além do “sati”, como já foi dito, havia, também, os sacerdotes assassinos que matavam viajantes e os ofereciam aos “deuses” e o infanticídio era muito comum contra meninas. O regime de castas era absurdo. Os “dalits” (párias), por exemplo, formavam a casta mais “inferior” e faziam trabalhos “impuros” ou “abjetos” como lidar com animais mortos, recolher lixo etc. Viviam segregados e não podiam entrar nos templos nem podiam tocar os “puros”, membros de castas mais “elevadas”.
↑4.9.2 – DESENVOLVIMENTO
Os ingleses construíram ferrovias, portos, edificaram cidades, melhoraram a saúde do povo, etc. Porém, boa parte destas melhorias foi feita menos em prol de civilizar os indianos e mais em prol dos lucros. Uma parte substancial dos lucros acumulados, conforme a economia indiana foi se industrializando, ia para agências administrativas, os bancos e os acionistas britânicos (FERGUSON, 2003, p. 231). O direito era diferente para britânicos e indianos. Havia até divisão espacial nas cidades, ou seja, houve uma versão local do “apartheid”.(FERGUSON, 2003, p. 214). A Inglaterra também reorientou as estruturas tradicionais de poder, que antes eram formadas pelos nababos e marajás, o que trouxe muitos problemas. Em muitos casos, os líderes tradicionais locais foram trocados por funcionários da BEIC. A Inglaterra gosta muito das tradições, mas apenas na Metrópole.
↑4.9.3 – FOME
Durante a colonização britânica, a Índia enfrentou vários períodos de grandes fomes. Dezenas de milhões de indianos pereceram. Segundo Davis (2001, p.8), entre 12,2 a 29,3 milhões. Um dos motivos foi a reorientação da agricultura na Índia: em vez de culturas variadas, muitas delas de subsistência, foi imposto um modelo voltado para exportação com predomínio do algodão, tributado com altas taxas. O tradicional sistema de famílias e de reservas de grãos nas cidades foi suplantado pelas necessidades dos mercadores e pelo dinheiro (DAVIS, 2001, p.20). Mesmo com a fome houve exportação de comida (DAVIS, 2001, p. 20). Houve centenas de suicídios e muito canibalismo. Durante a administração da Companhia das Índias Orientais, houve a fome de Bengala (1769-1773). A Companhia havia instituído o monopólio na área, substituído plantações tradicionais pela plantação de ópio e cobrava elevadas taxas. Segundo Adam Smith, que comentou sobre o caso, a fome ocorreu ou foi feita mais grave, em grande parte devido às políticas da “British East India Company “ (BEIC). O governador Lytton não agiu para minimizar a fome, devido a uma mentalidade combinada de “livre mercado”, malthusianismo e darwinismo social.[13] Outra razão foram os problemas climáticos e última grande fome aconteceu em Bengala, em 1943. Os ingleses não pareciam estar muito preocupados com estas fomes devastadoras, afinal, muitos na Inglaterra pensavam como Winston Churchill: “Eu odeio os indianos, eles são um povo bestial com uma religião bestial”. Ou ainda: “Eu sou pró-muçulmano – a única qualidade dos hindus é que há muitos deles e isto é um vício” (HAVARDI, 2009).
↑4.10 – AUSTRÁLIA E NOVA ZELÂNDIA
4.10.1 – AUSTRÁLIA (1788-1901)
4.10.2 - INTRODUÇÃO
Os primeiros europeus a explorarem a Austrália foram, provavelmente, os portugueses, no começo do século XVI (HUGUES, 1986, p.46). Depois vieram os holandeses que, em 1606, desembarcaram na península do Cabo York. Fizeram várias viagens ao longo de anos e exploraram muitas partes litorâneas. Durante muito tempo, a Tasmânia (nome dado em homenagem a Abel Tasman, holandês) era conhecida como “Van Diemen's Land”. Fizeram mapas da região nos quais constava o nome “Austrália” ou “Nova Holanda” (HUGHES, 1986, p.46-48). Mas, foram os ingleses que colonizaram a região. Em 1770, mais de 160 anos após as primeiras expedições holandesas, James Cook reclamou aquelas terras do sul (Austrália) para a Inglaterra. A colonização começou de fato em 1788 no atual estado de “Nova Gales do Sul”, próximo da cidade de Sidney, com o envio de condenados enviados pela Inglaterra.
↑4.10.3- “CONVICT LABOUR”
Podemos dizer que, realmente, a Austrália foi colônia de povoamento, só que forçado. O futuro país nasceu como um assentamento penal. Criou-se o “Convict Labour” (trabalho de condenados) o que para alguns autores seria, de fato, a “Convict Slavery” (escravidão dos condenados). Por este sistema, os prisioneiros do Império Britânico eram enviados para trabalhos forçados na Austrália. Desta forma, a Inglaterra se livrava dos criminosos e garantia mão de obra barata para sua nova colônia. Mais de 160.000 foram enviados em aproximadamente 80 anos, de 1788 a 1868 (HUGHES, 1986, p. 145) Muitos destes condenados foram punidos por crimes leves, encontravam-se entre eles jovens de 12 a 18 anos e até mesmo algumas crianças de oito anos. (SHAW, 1958, p.26). Mesmo mulheres grávidas foram enviadas. Alguns foram enviados porque roubaram ovelhas, outros porque furtaram comida (FERGUSON, 2003, p. 123) Havia também muitos presos políticos (FERGUSON, 2003, p.123). Os barcos que levavam os condenados se chamavam “navios do inferno” (FERGUSON, 2003, p. 123) O tratamento dispensado a eles era brutal. As chicotadas eram a regra como medida punitiva. Muitos fugiam e encontravam a morte no deserto australiano. A Ilha de Norfolk na costa australiana foi o pior local. John Giles Price foi o mais cruel administrador, que chegava a fazer experiências sádicas com os condenados. Pelas regras na ilha, um preso podia receber 100 chicotadas se cantasse uma música, ou se risse enquanto estivesse acorrentado (HUGHES, 1986, p. 480). Entre 1820 e 1831, os “convicts” perfaziam 40% da população total da Austrália. (HUGHES, 1986, p. 425). O sistema acabou totalmente em 1868.
↑4.10.4 - OS “BLACKBIRDS”
Com a decadência do sistema da “escravidão dos condenados” e a necessidade de mão de obra para as plantações no nordeste da Austrália (Queenland), criou-se uma escravidão obtida com pessoas vindas de ilhas do Pacífico. Entre 1842 e 1904, mais de 60.000 homens e meninos do Pacífico Sul e um número indeterminado de mulheres e meninas foram sequestrados e levados para trabalho escravo nas plantações de açúcar. (HOLTHOUSE, 1969) O tratamento dispensado a eles era brutal e a mortandade era elevada. Eram conhecidos como “blackbirds”. A escravidão, nesta época, era proibida, porém, mediante subornos e conivências com o governo local, de “escravos”, os “blackbirds”, passaram a ser oficialmente tidos como “contratados”. 4.10.5 - IRLANDESES NA AUSTRÁLIA Para muitos irlandeses a Austrália foi a sua Sibéria (HUGHES, 1986, p. 181) Assim como os soviéticos enviavam os prisioneiros políticos para os “gulags”, os ingleses enviaram os seus perseguidos políticos irlandeses para sua versão de “gulag”, as prisões australianas. O ódio inglês contra os irlandeses começava já no transporte (HUGHUES, 1986, p. 148). O “expresso siberiano” para os irlandeses eram os navios. Estes eram irlandeses presos em razão de revoltas na Irlanda contra o jugo inglês: os que não eram mortos eram enviados para a Austrália como escravos. É verdade que há uma desproporção numérica entre o gulag siberiano e o australiano, já que o primeiro se conta por milhões de condenados e o segundo, de acordo com Hugues (1986), não passava de 2.000. Mas, o princípio é o mesmo. Assim, como os presos comuns, trabalhavam em obras públicas e em fazendas sob a tutela de particulares. Depois, também houve também muita imigração voluntária dos irlandeses e assim como na Inglaterra sofreram preconceito. Os protestantes sempre quiseram submeter os irlandeses católicos pela força (CLARK, 1997, p. 34) Órfãs irlandesas também emigraram e encontraram forte discriminação e muitas morriam miseráveis nas ruas australianas. Interessante observar que os primeiros “missionários” na Austrália foram “padres condenados”. Um deles, James Dixon, irlandês, teve permissão para rezar missa e atender os católicos. A primeira missa aconteceu em 1803. A Austrália talvez tenha sido o único lugar onde os missionários católicos foram enviados forçadamente como “prisioneiros políticos”. Apesar das perseguições, primeira escola primária em Sidney foi fundada por um clérigo irlandês (HUGHES, 1986, p. 349)
↑4.10.6- ABORÍGENES E MASSACRES
Como regra mundial, os aborígenes tinham hábitos brutais. Em um desses grupos, se uma mãe morresse logo após o parto ou durante a amamentação, o filho era assassinado pelo próprio pai por meio do esmagamento da cabeça da criança com uma pedra (HUGHES, 1986, p. 17). Como de hábito, os ingleses mostravam desprezo pelos aborígenes, havendo pouco ou nenhum interesse em trazê-los à civilização. Queriam apenas suas terras. Não havia uma política para lidar com eles, nem punição para quem matasse os nativos (ARMITAGE, 1995, p. 140). Como resultado desta mentalidade, houve vários massacres e pequenas guerras contra os aborígenes. Na Austrália, entre 1800 até 1920, já se perdeu a conta de quantos massacres houve, desde “Risdon Cove” até o “massacre de Coniston”. Na Tasmânia, em especial, os aborígenes sofreram mais, foram caçados, confinados e exterminados (FERGUSON, 2003, p. 128)[14] Os poucos que restaram foram fixados em uma ilha apartada da Tasmânia. (ARMITAGE, 1995, p.17) Este episódio ficou conhecido como “black war”. Os aborígenes que sobreviviam às lutas, na Austrália, eram forçados a viver em áreas delimitadas com restrição de ir e vir. Obviamente, a lei para os brancos era diferente da lei para os aborígenes. Cuidou-se de uma versão local do “apartheid”. No começo do século XX, com a Austrália já independente da Inglaterra, crianças aborígenes eram tiradas à força de seus pais e levadas para “campos de concentração” para serem “civilizadas”. Foi o que se chamou de “geração roubada”.
↑4.10.7- RACISMO NA IMIGRAÇÃO
A Austrália independente herdou o racismo inglês. Em 1897, pouco antes da independência, foi aprovada uma lei, que na prática impedia a imigração de “não brancos”. Comentava-se na ocasião sobre o “problema dos negros” nos Estados Unidos que deveria ser evitado na Austrália. Em 1901, outra lei no mesmo sentido foi aprovada. O primeiro ministro australiano, nesta data, declarou que “a igualdade entre os homens não implicava igualdade entre ingleses e chineses”. A lei de discriminação só abolida em 1975. A Austrália, a exemplo dos Estados Unidos, tem uma população pouco mestiça.
↑4.10.8 DESENVOLVIMENTO
O desenvolvimento da Austrália, hodiernamente, contrasta com o início de sua colonização. No começo, a vida na Austrália não era fácil e a mobilidade social era difícil (HUGHES, 1986, p. 324). Havia muita miséria. Em 1851, porém, descobriu-se ouro na Austrália. A descoberta do ouro trouxe muitos imigrantes e provocou a instalação de uma infraestrutura como estradas, ferrovias etc. Veio muito capital da Inglaterra e mudou a face da Austrália. Em 1854, houve a “Eureka War”, uma pequena guerra dos locais contra o governo inglês, que aumentara a taxa de licença para a exploração aurífera. E houve protestos racistas contra os chineses que haviam imigrado por causa do ouro. Durante o século XIX, a Austrália era um local com alta criminalidade (HUGHES, 1986, p. 494). A Tasmânia era o pior lugar e a imoralidade era tão grande que se dizia que era pior que Capri sob Tibério (HUGHES, 1986, p. 529). Os irlandeses, sempre perseguidos, eram os primeiros a serem “investigados” quando acontecia algum crime. É claro que, na Austrália, não ia faltar o monopólio de alguma “companhia majestática”. A Austrália do Sul, um dos atuais estados australianos, foi explorada, como monopólio pela “South Australian Company”. A companhia podia vender as terras que queria pelo preço mais alto (“leilão”). Houve algo similar na Tasmânia com a “Van Diemens Land Company”. A Austrália conseguiu a independência em 1901, época que contava com aproximadamente 3,8 milhões de habitantes. Foi uma transição pacífica pois a Inglaterra negociou sua influência política e econômica.
↑4.10.9- NOVA ZELÂNDIA (1831-1907)
A primeira expedição europeia conhecida a explorar a Nova Zelândia foi a do holandês Abel Tasman em 1642, daí a designação, pois Zelândia é o nome de uma província dos Países Baixos. Em 1769 houve outra exploração com o inglês James Cook, na qual a Inglaterra reclamou as terras. Mas, somente no começo do século XIX houve envio de colonos. A colonização da Nova Zelândia passa pela estranha figura de Edward Gibbon Wakefield. Ele foi condenado no caso “Shrigley abduction” por ter sequestrado, para fins de casamento, Ellen Turner, uma rica herdeira. Edward foi um dos mentores da “New Zealand Company”, uma companhia monopolista fundada em 1837. O objetivo desta companhia era colonizar sistematicamente a Nova Zelândia. Seu lucro advinha das relações fundiárias, pois comprava dos maoris as terras e as revendia para os colonos europeus. Devido a uma intensa especulação, a companhia faliu e foi dissolvida em 1858. Depois, de um tempo, os colonos passaram a ter o direito de negociar as terras diretamente com os índios. Valia qualquer trapaça para negociar terras com os maoris. Criavam-se, por exemplo, débitos artificiais para os maoris pagarem, aí então, os colonos entravam na justiça reclamando os débitos e ganhavam a terra como pagamento. (HAWKE, 1985, p. 23). Com o “New Zealand Settlement Acts” de 1863, o governo podia simplesmente expropriar as terras dos Maoris (WINEGARD, 2011, p. 28). Os maoris eram o povo autóctone. Formavam várias tribos, eram belicosos e praticavam canibalismo contra os vencidos nas guerras locais e também contra europeus. Outros hábitos selvagens foram relatados, como o infanticídio generalizado. Os maoris, quando tiveram contato com armas de fogo comercializadas com os primeiros europeus que chegaram à Nova Zelândia, travaram uma guerra sangrenta uns contra os outros, a “musket war”. Guerra esta que não deixou de ser interessante para os ingleses, pois assim podiam conquistar o local mais facilmente. Os ingleses, também, travaram várias guerras contra os maoris, houve vários massacres. A população autóctone decresceu sensivelmente, para menos da metade do que havia antes da colonização. A Nova Zelândia era, em meados, do século XIX, uma colônia longínqua e pobre. Em 1845, segundo o “Dublin University Magazine”, a Nova Zelândia era “a mais recente, a mais remota e a menos civilizada das colônias inglesas”.(PHILLIPS, 2008). A organização social era muito deficiente (McCARTHY, 2005, p. 168) Muitos irlandeses emigraram para a Nova Zelândia, e como era regra, enfrentaram preconceito, já desde a partida, pois a “New Zealand Company” não considerava os iletrados como imigrantes desejados.[15] Na Nova Zelândia, as rixas entre os irlandeses e os outros colonos eram comuns. A Nova Zelândia tinha uma economia eminentemente agrária. Alcançou riqueza econômica em meados do século XX, em boa parte devido ao “boom econômico da lã”. Conseguiu a independência pacificamente da Inglaterra em 1907, época na qual contava com aproximadamente um milhão de habitantes. Como na Austrália, a transição foi pacífica e a Inglaterra manteve sua influência.
↑4.11 – CANADÁ (1670-1870)
4.11.1 – INÍCIO E O “CANADÁ FRANCÊS”
Os primeiros europeus a colonizarem o atual Canadá foram os franceses, processo iniciado no final do séc. XVI e começo do séc. XVII. A colônia era conhecida como Nova França (abordaremos sua história no tópico da Colonização francesa). Chegaram a incluir os atuais Quebec e Ontario. A Nova França passou ao domínio britânico em 1763, em decorrência do desfecho da Guerra dos Sete Anos. No tratado de Paris acordou-se a cessão dos territórios e a obrigação por parte dos ingleses de respeitarem o direito e língua franceses, o que foi respeitado.
↑4.11.2 – “HUDSON BAY COMPANY” E “CANADÁ INGLÊS”
A “Hudson Bay Company” foi fundada em 1670. O objetivo da companhia era o comércio de peles, até então dominado pelos franceses. Com o passar dos tempos tiveram a supremacia do comércio e quase monopólio. Durante séculos boa parte do Canadá só teve um produto de destaque, as peles. A Companhia exercia de fato o governo de quase 40% do futuro país, até o século XIX. O primeiro governador instituído pela companhia foi Ruperto do Reno, nobre e bucaneiro no Caribe. A economia era escravocrata e havia tráfico de escravos indígenas. Houve vários abusos contra os índios e pequenos massacres, mas nada comparado ao que aconteceu nas “Treze Colônias” ou na Austrália. A razão era porque os índios eram úteis para o comércio de peles (FERGUSON, 2003) por isso não foram eliminados. O apogeu da companhia foi com George Simpson, traficante de escravos e racista que acreditava na supremacia da raça branca (BOWN, 2009, p. 208). Designava os nativos como raça de selvagens e os embebedava para obter favores (BOWN, 2009, p. 215). Governou como um tirano e desde que os lucros fruíssem ele tinha plena liberdade para fazer o que quisesse (BOWN, 2009, p. 220). Simpson colocou no comando do leste do Canadá, McLoughlin. Os dois governaram com mão de ferro impondo um rígido código contra os índios. A Justiça era aplicada não de acordo com as leis britânicas, mas de acordo com interesses comerciais (BOWN, 2009, p. 226) Houve também a North West Company que também atuou no comércio de peles. Esta companhia passou a concorrer com a Hudson Company e houve até escaramuças entre elas. O confronto mais sangrento foi a “Batalha dos Sete Carvalhos” que deixou dezenas de mortos. William McGillivray, diretor, e outros acionistas da North West foram presos. Devido à violência, o governo, com sede em Montreal, forçou as companhias a se fundirem.
↑4.11. 3 - FUSÃO E NASCIMENTO DO CANADÁ
Em 1867 foi formada a Confederação do Canadá, com quatro províncias: Ontario, Quebec, Nova Scotia e New Brunswick, a maioria deste território inicial havia sido colonizado pela França. Em 1870 o território da Hudson Bay Company tornou-se parte do Canadá numa transação com a Inglaterra. Bown (2009, p. 236): “O Canadá nasce desta monumental transação comercial entre a companhia e o governo colonial”. O processo terminou com união da Columbia Britânica em 1871.
↑ 4.11. 4 - RACISMO E EUGENIA
A partir de 1857, começaram a surgir uma série de leis, que na prática transformavam os índios em cidadãos de segunda classe. Em 1876 foi o começo de uma série de “Indian acts” que discriminatórios contra os indígenas. Estas leis, por exemplo, proibiam os índios de beberem bebidas alcoólicas, de jogar, disciplinavam como seriam as vendas das colheitas e até mesmo limitavam o direito de ir e vir. Houve, como na África do Sul, a “lei do passe”[16] Muitos indígenas foram na prática aprisionados em reservas e as crianças eram educadas em escolas residências. Em 1928 surgiram leis eugênicas de esterilização forçada contra eles. Na imigração também havia muito racismo. Chineses, por exemplo, tinham de pagar uma taxa especial para poderem imigrar. Em 1942, canadenses oriundos do Japão foram enviados para campos internos e tiveram suas propriedades confiscadas. Apenas na década de 1960, as últimas leis racistas foram abolidas.
↑4.12- ÁFRICA AUSTRAL (SÉC. XIX)
A exploração da África Austral foi feita por duas companhias, a Britsh South Africa Company (BSAC) fundada em 1889 e a The Beers fundada em 1880. Estas duas companhias passam pela figura de Cecil Rhodes. Rhodes era um megalomaníaco racista. Foi primeiro-ministro da Colônia do Cabo e homem forte da Rodésia (BOWN, 2009, p. 271) e, ao mesmo tempo, era diretor das companhias, misturando poder público e privado. Vivia pelo amor ao poder e não por princípios, foi influenciado pelo darwinismo social, no qual uma raça (a dele, óbvio) deveria dominar as outras. A BSAC explorou e fundou o que seria Rodésia (o nome era homenagem a Rhodes), atuais Zimbábue e Zâmbia. Era uma companhia fraudulenta. Interessado nas terras e em umas possíveis minas de ouro, Rhodes enganou o rei da região da Rodésia, Lobengula, e o fez assinar um contrato de concessão que implicava em muito mais coisas que Rhodes havia dito (FERGUSON, 2003, p. 241). Houve um conflito entre Lubengula e Rhodes. Os mercenários de Rhodes usaram as metralhadores “maxim” e exterminaram rapidamente 1.500 guerreiros africanos (FERGUSON, 2003, p. 242)[17] A The Beers foi destinada a explorar diamantes. Os diamantes foram descobertos em Kimberley, onde havia mais de cem empresas dedicadas à extração. Lord Rothschild financiou fusões e aquisições até que a The Beers conquistasse o monopólio, com Rhodes como diretor (FERGUSON, 2003, p. 240) Nestas minas da The Beers, os trabalhadores eram negros submetidos a condições similares a de escravos, virtualmente prisioneiros da companhia (BOWN, 2009, p. 260) Rhodes foi acusado no parlamento inglês de ser um “pedreiro de impérios que sempre foi um mero empresário posando de patriota, e o chefe de uma quadrilha de astutos financistas hebreus com quem ele dividia os lucros” (FERGUSON, 2003, p. 297) Não era somente contra os africanos que a Inglaterra cometeu abusos. Na guerra contra os boers (brancos descendentes dos colonos holandeses), os ingleses fizeram uma campanha de terra arrasada e criaram um campo de concentração, no qual quase 30.000 boeres morreram, a maioria crianças por desnutrição e más condições sanitárias (FERGUSON, 2003, p. 293) O caso foi tão abjeto que gerou protestos dentro e fora da Inglaterra. A Inglaterra estabeleceu na África do Sul, dando continuidade à segregação racial feita pelos holandeses, a lei do passe para os africanos, que obrigava os negros a ficaram apartados dos brancos, só podendo ir aos locais dos brancos mediante permissão. Isto também foi feito no Kenya, Rodésia e Niassalândia (JAMES, 1994, p. 295).
O Egito foi controlado pelos Otomanos. O vice-rei que mandava tinha o título de quedive. A Inglaterra, devido á localização estratégica do Egito, acabou mandando no queduvato. A França também exerceu alguma influência e construiu o canal de Suez. No Sudão, a Inglaterra impôs seu jugo com força. Em uma batalha em Ondurmã, por exemplo, pelo menos 10 mil africanos morreram rapidamente. Um dos objetivos do megalomaníaco Rhodes era fazer uma ferrovia ligando o Cairo ao Cabo, coisa que nunca foi feita. Na Nigéria, George Goldie, filho de contrabandistas da ilha de Man, foi mercenário na África e inspirado em Rhodes assumiu a “Niger company”, criada para o monopólio do comércio e conquistas de terras. O que ele não conseguia pela via pacífica, com contratos que enganavam os chefes de tribos locais, conseguia pela força, no caso, com a metralhadora “maxim”. (FERGUSON, 2003, p. 245). Fez guerra contra os Bida, Fulani, Ilorin, bombardeou vilas etc.
↑4.14 O APOGEU E O FIM DO IMPÉRIO BRITÂNICO
No começo do século XX, o Império Britânico conheceu seu apogeu, pelo menos formalmente. Dominava, na época, 25% das terras do globo e tinha 440 milhões de habitantes (25% da população da Terra) (FERGUSON, 2003, p. 256). Porém, nas vésperas da Primeira Guerra Mundial, a Alemanha já era mais rica (FERGUSON, 2003, p. 3001). A Inglaterra saiu vencedora da Primeira Guerra Mundial e obteve da Alemanha quase todas as colônias desta. Mas igualmente, embora ainda fosse o “maior império”, no período entre guerras, os Estados Unidos e a Alemanha tinham uma produção industrial maior que a inglesa (JAMES, 1994, p. 457). Era um Império mais de fachada do que real e se distanciava cada vez mais da força que teve no século XIX. Na Segunda Guerra Mundial, a Inglaterra lutou vigorosamente contra o nazismo e várias colônias participaram dos esforços de guerra. Os japoneses, na Segunda Guerra Mundial, conquistaram vários territórios no Oriente, nas vésperas e no decorrer da guerra. Alguns dos domínios britânicos caíram na mão dos japoneses. O Império do Sol nascente era muito cruel contra os vencidos (FERGUSON, 2003, p.350) O tratamento dado pelos japoneses aos britânicos foi brutal (FERGUSON, 2003, p. 354). E os ingleses puderam sofrer na pele, sob o jugo nipônico, o que fizeram contra os índios, irlandeses, negros etc. No final da Segunda Guerra, a Inglaterra estava endividada e crescia cada vez mais o movimento separatista em quase todas as suas colônias. Aos poucos, foi dada a elas a independência e na década de 1970, só restavam algumas ilhas e alguns portos. O Império Britânico acabara. O fim dele não foi tão traumático como em Portugal, talvez porque tenha sido apenas um “grande negócio comercial”.
Apesar de todos os abusos que a Inglaterra cometeu em seus territórios houve pontos positivos: 1) Liberdade para a Igreja Católica. Salvo algumas exceções, entre elas, algumas colônias americanas, a Inglaterra não perseguia os missionários católicos, assim houve missões na Índia, no Sri Lanka, na África etc. 2) Para os autóctones que não foram exterminados e apartados do convívio completo com os europeus, houve um importante acréscimo de civilidade. Afinal muitos povos que tiveram contato com a Inglaterra eram tão selvagens que qualquer traço de civilização já ajudava. 3) A Inglaterra procurou estabelecer nos locais um mínimo de instituições administrativas e poder de polícia, que faziam com que os locais pudessem formar uma sociedade minimamente organizada.
A história real do Império Britânico está muito distante do mito liberal e das visões românticas sobre ele. Nas colônias, o monopólio era a regra, principalmente feito por meio das famigeradas companhias majestáticas. As colônias inglesas eram de “povoamento” apenas na imaginação dos ingênuos. A Revolução Industrial foi horrorosa e distante de qualquer princípio civilizado. O racismo inglês era de rigor, feito contra os irlandeses e contra todos os povos não brancos. Por onde andou a Inglaterra ela instalou as versões locais do “apartheid”. Praticou o extermínio. A Inglaterra foi “recordista” em tipos de escravidão: a negra, a indígena, a branca (principalmente com os irlandeses) a dos condenados, a temporária, a das crianças (tanto na Revolução Industrial quanto na Virginia), e a “disfarçada” com os “coolies” e “blackbirds”. A Inglaterra recusou combater a fome na Irlanda (séc. XIX), local que era unido à Inglaterra, como a Escócia do século XIX, e por meio da Companhia das Índias Ocidentais provocou indiretamente a fome na Índia, uma das maiores dos últimos séculos. A Inglaterra foi a “rainha da pirataria” com os infames corsários. Disseminou a eugenia, o malthusianismo e o darwinismo (anexo). No século XX, é bem verdade que a Inglaterra lutou valorosamente contra os nazistas. Porém, no pós-guerra, junto com os Estados Unidos, cedeu a Europa Oriental para a União Soviética e traiu a resistência polonesa. Outro fato esquecido é que os aliados, a Inglaterra incluída, enviaram, às vezes, pela força, os exilados soviéticos e europeus orientais, que estavam na Europa Ocidental acampados ou refugiados, para a área de influência soviética. (JUDT, 2006, p. 30-31) Como resultado, um em cada cinco repatriado foi morto ou enviado para os “gulags”. (JUDT, 2006, p. 30-31) No decreto britânico de crimes de guerra excluía os que não fossem da Alemanha nazista. Ou seja, para a Inglaterra não existiram crimes de guerra perpetrados pela União Soviética stalinista.
↑NOTAS
[1] “Plantation” é um tipo de sistema agrícola (uma plantação) baseado em uma monocultura de exportação mediante a utilização de latifúndios e mão de obra escrava, Wikipedia, verbete plantation.
[3] Ele doou para a cidade de Boston o prédio que leva seu nome: Faneuil Hall. Esta edificação foi palco de eventos importantes para os Estados Unidos e é conhecido também como “berço da liberdade”.
[4] Existe uma “lenda” que na Nova Inglaterra não houve escravidão importante, o que é desmentido pelos fatos.
[10] No Brasil, por exemplo, as Santas Casas surgiram logo depois do início da colonização. A de Olinda data de 1539, quatro anos depois de sua fundação.
[11] Uma curiosidade: a bandeira dos Estados Unidos foi inspirada na bandeira da BEIC. A versão “grand union flag”, de 1776, é praticamente idêntica a da BEIC.
[13]http://www.preservearticles.com/2011090412852/essay-on-poverty-and-famines-in-india-under-the-british-rule.html
[17] Os mercenários de Rhodes compuseram até um “hino oficial”, numa das estrofes: “Quando os dez mandamentos eles entenderem bem/vocês devem sumir com o chefe deles e anexar a terra/se eles equivocados exigirem satisfação/dê-lhes um outro sermão com uma maxim (metralhadora). (FERGUSON, 2003, p. 243).
Para citar este texto:
"Império Colonial Britânico. Parte 2 de Impérios Coloniais."
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/bra/veritas/historia/imperio-colonial-britanico-imperios-coloniais-de-marcelo-andrade-parte-2/
Online, 05/12/2024 às 23:36:01h