História

Povos indígenas
PERGUNTA
Nome:
Carlos Afonso
Enviada em:
26/06/2022

 

Salve Maria!

 

Recentemente, estive estudando sobre a história do Brasil, especificamente do período colonial. Lendo a carta de Pero Vaz de Caminha ao Rei Dom Manoel, pude lembrar-me de coisas que minha antiga professora socialista dizia. 

Ela dizia que os povos indígenas que aqui habitavam viviam bem, com uma rotina simples e de poucas preocupações, até que os portugueses vieram e impuseram a cultura europeia sobre estes povos.

Ora, de fato, esta carta de Pero Vaz dá a entender de que a maneira que os indígenas viviam não era má. Pelo contrário, aparentava ser boa. No entanto, estes portugueses que escreveram a carta ficaram na Terra de Vera Cruz por poucos dias, recebendo tratamento especial dos amerindios.

Creio que seja inviável basear uma visão de como os indígenas viviam aqui no Brasil a partir de o que aparentava ser em uma carta. Por isto, fui a procura de fontes que descreviam a maneira de que os índios viviam antes de Cabral.

No entanto, tudo que eu achei na Internet foram fontes socialistas que afirmavam justamente o mesmo que minha professora dizia. 

Já estudei muito sobre outros povos indígenas da América, os astecas, maias e os incas. Tenho o conhecimento do seu modelo de vida, e de como ele era ruim. No entanto, pouco estudei sobre os povos que habitavam o Brasil. 

Existe alguma fonte confiável sobre a maneira que os amerindios brasileiros viviam antes de Cabral? Pensei em consultar o que os frades que catequização os indígenas escreviam, mas não tenho certeza se é isto que procuro. Gostaria de ter uma fonte que demonstre que nem tudo eram flores como os socialistas diziam antes do desembarque de Pedro Álvares Cabral na Terra de Vera Cruz.

RESPOSTA
 

Salve Maria Carlos,

 

Primeiramente, um dos problemas que há é a interpretação das notícias de Pero Vaz Caminha. De fato, a notícia que ele dá da terra é mais geográfica que histórica, fala das questões relacionadas à terra, "uma terra em que se plantando tudo dá", a maioria das coisas geográficas também são suposições, etc. Mas, quando ele fala do povo, especificamente uma das nações, há uma breve descrição dos nativos se interessando pela missa, que eu creio que seja a parte mais significativa do relato, e que teve muito interesse da parte dos primeiros missionários:

 

"E quando veio ao Evangelho, que nos erguemos todos em pé, com as mãos levantadas, eles se levantaram conosco e alçaram as mãos, ficando assim, até ser acabado; e então tornaram-se a assentar como nós. E quando levantaram a Deus, que nos pusemos de joelhos, eles se puseram assim todos, como nós estávamos com as mãos levantadas, e em tal maneira sossegados, que, certifico a Vossa Alteza, nos fez muita devoção. 

Estiveram assim conosco até acabada a comunhão, depois da qual comungaram esses religiosos e sacerdotes e o Capitão com alguns de nós outros. 

Alguns deles, por o sol ser grande, quando estávamos comungando, levantaram-se, e outros estiveram e ficaram. Um deles, homem de cinqüenta ou cinqüenta e cinco anos, continuou ali com aqueles que ficaram. Esse, estando nós assim, ajuntava estes, que ali ficaram, e ainda chamava outros. E andando assim entre eles falando, lhes acenou com o dedo para o altar e depois apontou o dedo para o Céu, como se lhes dissesse alguma coisa de bem; e nós assim o tomamos".

 

O que o Pero Vaz de Caminha procura fazer é tornar a terra interessante para o Rei D. Manuel, mas a "descrição" paradisíaca dele é mais relacionada à função que a carta teria, e note bem que não estou dizendo que "adornou demais", mas, em geral, e em muitos outros locais da América, era comum o povo ser hostil, o hostil e o gentio se confundiam muitas vezes nessas primeiras expedições.

 

Quanto aos relatos mais antigos da Colônia, a fonte mais confiável, que é um relato em primeira mão, é a obra do Sr. Gabriel Soares de Sousa: "Tratado descritivo do Brasil em 1587". É um sumário a respeito de várias práticas indígenas e faz um balanço geral tanto do que é positivo e era possível se aprender deles, quanto comenta aquilo que é monstruoso da incivilidade. Se quiser procurar uma edição física, a editora nacional lançou uma edição na prestigiosa coleção Brasiliana. Esse livro é o documento mais antigo a respeito dos portugueses na colonização. 

 

A respeito das relações entre os portugueses e indígenas, faz sentido ler as cartas jesuíticas, sobretudo as do Pe. Manuel da Nóbrega, que foi um interessado no bem estar indígena e também chega a comentar, por exemplo, que eles acreditavam que os fogos-fátuos dos pântanos eram demônios e etc. O que mostra, por um lado, o interesse na educação profunda tanto da alma quanto o cultivo do espírito deles. As edições que recomendo dessas obras, se o seu interesse for mais profundo, são as feitas pela editora Itatiaia, mas são um pouco caras em edição física. 

 

Há uma edição, chamada "Novas Cartas Jesuíticas", coordenada pelo maior historiador dos jesuítas no Brasil e em Portugal, Pe. Serafim Leite, da Companha Editora Nacional, que é mais barata e também fácil de encontrar pela internet. Nesses documentos, há também muitos relatos a respeito do tempo da colonização e da relação entre os silvícolas entre si. 

 

Para um relato mais geral, e também muito mais sanguinolento, eu recomendo ler o livro "A guerra antes da civilização: O mito do bom selvagem", da editora É Realizações, escrito por Lawrence H. Keeley, que é basicamente uma história militar das práticas guerreiras normais e corriqueiras dos selvagens de norte a sul do mundo. 

 

Um trechinho do livro: "Tratamento semelhante era infligido aos cativos de diversos grupos tupis na América do Sul; em algumas tribos, o prisioneiro torturado era despachado por crianças utilizando fle­chas ou machados, e as mãos dos garotos eram mergulhadas no sangue da vítima para simbolizar seu dever de se tornarem guer­reiros".

 

Espero ter ajudado,

 

Régis.