Filosofia

Referências para estudos de Filosofia
PERGUNTA
Nome:
André
Enviada em:
27/07/2004
Local:
Curitiba - PR,


Caríssimo Professor Orlando Fedeli
 
Salve Maria!
 
Escrevo antes de tudo para novamente expressar minha profunda admiração ao senhor, louvável por seu tão grande amor pela Verdade e zelo ardente pela salvação das almas. Que Deus incite também a mim esta chama cada dia mais ardente da Sua graça.
 
Tenho umas perguntinhas, o que de antemão deixo claro que podem ser respondidas de forma bem sintética, para não tomar-lhe muito o tempo.
Eu estava querendo comprar o livro "Os Grande teólogos do Século XX", de Battista Mondin, da Editora Vozes, conforme o link abaixo:
Gostaria que o senhor fizesse uma avaliação do autor e, se já tiver lido ou folhado o livro, também da obra. O senhor a recomendaria?
 
 
Mas não conheço ninguém melhor que o senhor para elucidar, de forma clara e objetiva, os erros contra a Fé e a Verdade (expressos principalmente no Magistério) que teólogo X, Y ou Z apresentam. Então minha pergunta é a seguinte: sei que se eu "re"-lesse o conteúdo de seu site, acharia a resposta à minha pergunta de forma espalhada, mas peço se o senhor não poderia fazer uma lista de uns 20 a 30 teólogos que são mundialmente bastante citados por aí (os mais expressivos do século XVIII até agora, do mundo e eventualmente algum do Brasil) e falar umas linhas de cada um deles e especialmente de seu principal erro (ou não) e em que "sistema" filosófico/teológico eles se enquadram? Tudo isto eu tenho em vista para que, ao deparar-me com escritos ou menções a teólogo tal ou tal (principalmente aqueles que têm fama de serem católicos mas renegam pontos da Fé Católica), eu tenha um padrão de discernimento e saiba onde estou "pisando".
 
Neste livro que eu cito, do Battista Mondin, ele analisa uns 10 teólogos protestantes e uns 10 "católicos", mas destes acho que quem se salva seria o Réginald Garrigou Lagrange e acho que uns poucos outros. Além das Encíclicas de São Pio X e outros papas, e São Tomás e antigos santos doutores já consagrados, que autores (teólogos) recentes o senhor recomendaria? Eu mencionei o Garrigou Lagrange, o qual já li alguns textos e é excelente; também li uma obra espiritual de Frederick William Faber, o qual gostei bastante, assim como li algo de John Henry Newman, que também é muito bom. Poderia indicar-me mais alguns bons autores católicos "recentes" e suas respectivas obras?
 
Muito obrigado e espero conhecê-lo pessoalmente em breve
 
Um grande abraço
 
 
André Queiroz
Curitiba - PR
RESPOSTA

Muito prezado André,
 salve Maria !
 
    Muito me alegrou seu desejo de trabalhar pela salvação das almas. Esse é o objetivo da Montfort.
 
    Não li o livro do Mondin, mas um aluno meu, que o leu, disse-me que o autor -- de má orientação -- fornece informações interessantes para se compreender os erros dos teólogos atuais.
    Como não estudei Teologia, não posso lhe dar as indicações de 30 teólogos maus e bons desde o século XVIII.
conheço os nomes de alguns que participaram das polêmicas contra os hereges desses útimos séculos.
    Em ordem cronológica retroativa, poderia citar-lhe como teólogos de boa orientação os seguintes: 
1  - Garrigou-Lagrange.
2  - Cardeal Billot, embora ele tivesse apoiado , infelizmente a Action Française.
3  - Padre Shwalm que atacou Blondel.
4  - Padre Lemius, que escreveu a Pascendi.
5  - Padre E. Barbier, inimigo ferrenho do Liberalismo.
6  - Padre Maignen, que combateu o Americanismo.
7  - Cardeal Pie (Século XIX).
 
    Um amigo meu que conhece bem teologia, e a quem consultei, me indicou os seguintes autores como podendo ser úteis no estudo da Teologia:
 
8  - Billart
9  - Franzelin
10 - Jugie
11 - Kleutgel
12 - Christian Pesch
13 - Van Noort
14 - Adolfo Thankerey
15 - Zubizarreta
16 - Padre Voste O.P.
17 - Monsenhor Hugon
18 - Zapellena
19 - Gonet
20 - Muncunill
21 - Lepcies
22 - Perrone
23 - Hervé
 
    Para atendê-lo melhor, pedi a meu aluno Felipe Coelho -- que conhece muito melhor que eu esse campo da teologia -- que comentasse alguns autores modernistas e neo modernistas, e ele pronta e gentilmente me mandou a seguinte missiva:
Prezado Prof. Orlando, salve Maria!
 O André Queiroz escrevera um e-mail em janeiro, pedindo indicações de filosofia, o qual infelizmente ainda não terminei 
de responder. Aproveito para adiantar o cerne da resposta agora, em razão da semelhança do assunto, antes de ajudar
 na resposta do e-mail mais recente:
 
Para o estudo da filosofia, citando apenas obras fáceis de achar e em português, o melhor ponto de partida é a célebre
 Introdução Geral à Filosofia, de Jacques Maritain, que ele escreveu na época em que, como Lamennais antes da queda, 
prometia ser um grande católico. Depois, tendo meditado bem essa introdução, pode-se passar ao Princípios da Filosofia,
 do Pe. Édouard Hugon, O.P., que Dom Odilão Moura traduziu para a EDIPUCRS. Trata-se de um bom comentário às 
24 Teses Tomistas, aprovadas pela Igreja, no qual se encontrará a bibliografia dos melhores tratados tomistas sobre cada 
ramo da filosofia, o que nos dispensa de indicar obras mais específicas. Já para a história da filosofia, uma boa introdução é 
o breve Noções de História da Filosofia, do Pe. Leonel Franca, S.J., exceto pela parte sobre filosofia contemporânea, que,
 conforme seu biógrafo Luiz d’Elboux, S.J., ele escreveu muitas décadas depois do restante do livro, quando se nota já algo
 da influência da grande derrocada da Companhia de Jesus de pouco antes do meio do século XX. Apesar de sua excessiva
 simpatia pelo tomismo belga, Leonel Franca é no entanto intransigente com os erros de Kant, ao contrário do também jesuíta 
Thonnard, cujo Compêndio de Filosofia, em dois volumes (este é mais difícil de achar, mesmo em sebos), apesar de em
 muitas partes excelente, peca em alguns trechos pela influência dos erros da Faculdade de Lovaina.
 Dito isso, passo às informações que o senhor pediu.
 O autor do livro Os Grandes Teólogos do Século Vinte, Battista Mondin, é diretor da faculdade de filosofia da Urbaniana, 
em Roma, e é conhecido como “teólogo de divulgação”, sendo bastante erudito, embora nem sempre muito profundo. 
Além disso, como se vê pelos hereges que ele chama de “teólogos” – aos quais ele faz, no máximo, alguns reparos tímidos –, 
Mondin é modernista, embora da linha “moderada”, o que, aliás, o faz mais perigoso ainda. Não é por acaso que este livro,
 originalmente lançado pela modernista Editora Paulinas, seja hoje reeditado por uma editora protestante, ao lado de obras 
de Bultmann, Pannenberg et caterva.
 
Para começar, Mondin é de um extremo relativismo teológico, o que, como ensina Pio XII na Humani Generis, outra coisa
 não é que uma forma mais sutil do velho relativismo dogmático dos modernistas condenados por São Pio X. Isso fica claro
 não só pela seleção “ecumênica” deste livro, como também pela doutrina de Mondin sobre o pluralismo teológico que a 
fundamenta, exposta no primeiro capítulo de outra de suas obras, Antropologia Teológica (São Paulo, Paulinas, 1986). 
Lá ele diz que “as teologias” (sic) “nascem, sim, da exigência de adequar a mensagem cristã à perspectiva própria de uma
 determinada geração ou de um ambiente cultural particular” (op. cit., p. 20). E, na página seguinte, ainda tem a audácia de
 citar favoravelmente o famoso “teólogo da morte de Deus” Robinson, bispo anglicano, para o qual “O que se exige hoje –
 parece-me – é uma revisão bem mais radical, que não vacile em enfrentar, renovando-se até as categorias fundamentais da
 nossa teologia, como os conceitos de Deus, de sobrenatural e mesmo de religião” (loc. cit.)! Totalmente modernista.
 
Enfim, esse livro, que deveria chamar-se mais propriamente Os Grandes Hereges do Século XX, vale pelas boas citações 
que dá dos neomodernistas, se bem que necessitem de algum conhecimento prévio das “filosofias” modernas que empregam,
 para serem entendidos com alguma clareza. Vale também por um ou outro reparo que faz aos erros e heresias destes, 
principalmente ao tratar dos hereges protestantes ou “ortodoxos”, como por exemplo a refutação da distinção gnóstica 
de Vladimir Losski, seguindo o pseudosanto Gregório Palamas, entre essência e “energias” em Deus.
 
É um livro, porém, que serve como mera introdução, e que não é isento de erros, dos quais citamos o seguinte, bastante
 grosseiro, por confundir duas obras capitais: na pág. 414 dessa última edição, Mondin diz que Bouillard é o autor do 
controverso livro Corpus Mysticum, que na verdade é de De Lubac, e depois dá uma citação de uma outra obra de 
Bouillard, a infame Convérsion et grâce chez Saint Thomas d’Aquin, citando-a como se fosse a Corpus Mysticum.
 Uma confusão, que – se não for do tradutor, como não parece ser – mostra menos conhecimento das fontes primárias, 
por parte do autor, do que seria de esperar.
 
Dos teólogos citados, de fato, só se salva o Pe. Garrigou mesmo, que Mondin inclui para “fazer média”, numa tentativa de
 conciliar ortodoxia e heresia, mostrando uma pretensa continuidade entre uma e outra, o que é típico do pós-concílio. Os 
demais são todos modernistas: Guardini é um existencialista cuja “dialética polar” remonta a Hegel ou, mais precisamente, 
Kierkegaard; Chenu foi posto no Index na década de 30 e era, para usar um oxímoro, um “tomista teilhardiano”; Rahner e
 Lonergan são – outro oxímoro – “tomistas transcendentais”, isto é, tentam conciliar Santo Tomás com Kant e Heidegger, na 
linha do modernista Maréchal, e não poupam falsificações inescrupulosas para tanto, isso para não falar de suas heresias em
 teologia; dos outros, Teilhard, De Lubac, Congar, Von Balthasar e Schillebeeckx, nem é preciso falar, pois ninguém ignora 
que esses “luminares” da nouvelle théologie foram todos censurados na época de Pio XII, e, depois, tornaram-se os 
principais artífices do Vaticano II, cujos frutos de “apostasia silenciosa” falam por si sós.
 
Um nome pouco citado nesta obra de Mondin, mas que se encontra por trás dos erros e heresias de todos esses, sendo 
também a ligação entre o modernismo clássico e o neomodernismo atual, é o do nunca assaz execrado filósofo leigo Maurice 
Blondel.
 
Para contrabalançar, alguns bons teólogos e filósofos católicos recentes, citando aleatoriamente: o Pe. Guido Mattiussi, S.J.,
 autor das 24 teses tomistas, muito detestado por Roncalli, o futuro João XXIII; o Pe. Joseph de Tonquédec, S.J., autor de 
um ótimo livro de teoria do conhecimento tomista, além de uma outra obra capital de refutação a Blondel; o Pe. Benoît 
Schwalm, O.P., o primeiro a denunciar Blondel e talvez seu melhor refutador; outros tomistas, como o Pe. Édouard Hugon, O.P., 
o Pe. Thomas Pègues, O.P., o Pe. Santiago Ramírez, S.J., entre outros; o exegeta antimodernista Pe. Ferdinand Pratt, S.J.; 
Mons. Pietro Parente, principalmente antes do Concílio; etc. Não cito entre eles os teólogos da Revue Thomiste, como os 
dominicanos Labourdette, Nicolas, Bruckberger, etc., porque, devido à nefasta influência de Maritain e Journet, todos eles
 capitularam diante da “nova teologia”, embora tenham algumas das melhores críticas contra esta, principalmente em sua
 polêmica do fim da década de 1940 contra De Lubac e seus discípulos.
 
Quanto ao Cardeal Newman, citado favoravelmente, deve-se tomar cuidado, pois ele abriu muitas portas aos hereges (sua
 obra Grammar of Assent antecipa o método da imanência modernista) e, já em sua época, ele sempre esteve entre os
 liberais: foi amigo dos “velhos católicos” como Döllinger, negadores da infalibilidade do Papa, e recusou-se a participar d
o Concílio Vaticano I, que aprovou esse dogma, embora tenha se submetido depois; também nunca abandonou sua amizade
 com os anglicanos, etc. Consta que o bom Pe. Faber, este sim morto em odor de santidade, nunca se deu muito bem com 
Newman, e vice-versa, o que já diz muito. Quando o arquimodernista excomungado Tyrrell alegou que Newman estava a 
seu lado e fora condenado junto com ele pela Pascendi, por mais exagero que houvesse nessa afirmação, possivelmente
 não era de todo infundada. Claro que Newman escreve muito bem e fala muitas coisas boas, tendo sido por isso elogiado
 e defendido por muitos grandes católicos antimodernistas, mas mesmo assim, como se vê, com ele todo cuidado é pouco.
 
No Brasil, três nomes de insignes antimodernistas vêm à mente: o do Pe. Leonel Franca, S.J., o do Pe. Penido, O.P. e o de
 Dom Odilão Moura, O.S.B, se bem que haja algumas restrições a fazer. Entre os leigos, pensamos em Alfredo Lage, um 
tomista antiliberal conhecido por seu corajoso ataque ao hegeliano, modernista e teórico da teologia da libertação Pe. Henrique
 de Lima Vaz, S.J., que lamentavelmente ainda tem muito prestígio no Brasil. Outro leigo famoso é Gustavo Corção, embora 
um tanto super-estimado em certos meios devido à fama que obteve como jornalista católico. Ele nunca foi um teólogo muito
 profundo, basta ver o quanto demorou para perceber os erros de Maritain e como seus conhecimentos sempre estiveram 
muito defasados em comparação com os de seu ex-colega, o péssimo progressista Alceu Amoroso Lima, com o qual demorou
 bastante para romper. Quia filii huius saeculi prudentiores filiis lucis in generatione sua sunt... Ademais, algumas 
especulações não muito felizes sobre a “nova Igreja pós-conciliar” (que Corção chama de “A Outra”...) levaram saudosistas
 de Corção como Dom Lourenço Fleichmann às portas do sedevacantismo.
 
Por fim, vale mencionar que surgiu recentemente um certo “tomismo pós-moderno”, que está se tornando bastante 
representativo principalmente nos Estados Unidos (parece ligado a uma ala mais conservadora do Opus Dei) e em cujas
 críticas à pós-modernidade há muito que se aproveite, mas que, como o próprio nome do movimento já diz, infelizmente
 ainda está viciado do pluralismo que fundamenta a mesma filosofia pós-moderna que critica, ao opor à sua “fragmentação”
 relativista uma quimérica convivência dos opostos, num suposto “diálogo sem relativismo”, graças ao uso de uma “dialética 
complementar e sem síntese”, que, a bem ver, peca também ela por um dualismo de fundo idealista e gnóstico, não obstante
 sua profissão de anti-idealismo e antignosticismo.
 
Assim, embora muitas vezes essa gente pareça correta em sua defesa da “identidade católica integral”, agem como se fosse
 legítimo para a Igreja aceitar o mundo de jure como uma grande universidade laica, da qual a Esposa de Cristo seria apenas
 uma das professoras! Aí está o fundo liberal desses antiliberais. Parece-nos, aliás, que essa dialética paradoxal está no cerne
 da própria nouvelle théologie que triunfou no Concílio, de modo que não espanta ver alguns desses tomistas pós-modernos,
 como o dominicano Aidan Nichols, buscarem sintetizar Santo Tomás... com Hans Urs von Balthasar!
 
Um dos principais expoentes desse movimento, Alasdair MacIntyre, cujo nome tornou-se célebre em alguns meios nos 
últimos tempos, embora mostre otimamente que há uma unidade subjacente a todo liberalismo, capitalismo laissez-faire, 
marxismo e utilitarismo pragmatista, os quais combate, tendo reunido também em torno de si bons críticos daquela visão 
típica da Gaudium et Spes, a qual criticam abertamente, entretanto ainda peca por não abandonar o fundamento do
 ecumenismo conciliar – e da sociedade pós-moderna como um todo, naquilo que esta teria de supostamente “positivo” –,
 isto é, seu esforço de integração da verdade e do erro, como se Igreja e maçonaria pudessem conviver de modo “quântico”, 
mais ou menos como o fazem, no caso da luz, partícula e onda, se é que procede a hipótese, de resto provisória, de Niels 
Bohr, não por coincidência um cabalista  judeu e, além disso, influenciado pela “dialética qualitativa” e paradoxal de seu 
compatriota dinamarquês, o neomaniqueu Kierkegaard.
 Por ora, é só, professor.  Abraço,
 Ad Calvarium per Rosarium,
 Felipe A. Coelho.