Doutrina

Pena de morte, ecumenismo e julgamento
PERGUNTA
Nome:
Jairo
Enviada em:
15/10/1999
Religião:
Católica
Profissão:
engenheiro



Caros Irmãos,

Que a paz de Nosso Senhor Jesus Cristo esteja convosco!

Sou católico e apesar da fé inabalável, caio em tentação e peco, sempre, muito mais do que gostaria.
Procurando por textos em português de São Tomás de Aquino, cheguei ao vosso site por meio de um mecanismo de busca.

Lia feliz um artigo quando resolvi conhecer todo o site. Que decepção!!
Para ser breve: os senhores, católicos como eu, usam de uma citação de São Tomás de Aquino para defender a pena de morte!! Desde criança ouvi de meus pais: "Não é você quem dá, não é você quem tira". Se eu não dou a vida, posso eu tirá-la? NÃO MATAR.

Mas "aquele" a quem defendo, o fez e provocou o sofrimento a outros irmãos.
E se eu aplicar a pena capital, a quem me igualo?
Jesus disse a São Pedro: "... perdoarás SETENTA VEZES SETE..." (perdoem-me por qualquer erro de citação, pois não transcrevi as palavras).

Será que o ser humano, com a inteligência e a inspiração do Espírito Santo não seria capaz de "cortar" este membro sem cortar-lhe o dom da vida, CONCEDIDO POR DEUS?

Os senhores se colocam como defensores da ética cristã Católica, mas, interpretam a partir de vossos pontos de vista a Justiça Divina. Os senhores julgam.
Eu também já julguei. Por que digo isso?

Os senhores consideram os católicos privilegiados e condenam o Ecumenismo**.
Os senhores consideram (pelo menos, levam a crer nisso, dado como é exposta vossa opinião) que somos os únicos dignos do amor do Pai. Por que considerar-se como os fariseus e doutores da lei do tempo de Jesus?
(Reflitam sobre a parábola do mendigo e do fariseu no templo).
Quem somos nós para julgar que nossos irmãos, sejam eles de que religião sejam, são bons ou maus aos olhos de Deus?

Cabe a nós amar a todos e orar, interceder pela salvação de todos.
Todos nós, todos, somos imagem e semelhança Dele e, não por acaso rezamos ao
fim de cada mistério "Oh meu Jesus, perdoai-nos, livrai-nos do fogo do inferno, LEVAI AS ALMAS TODAS PARA O CÉU E SOCORREI PRINCIPALMENTE AQUELES QUE MAIS PRECISAREM DE SUA MISERICÓRDIA.".

Pedimos assim ao Pai perdão pelos pecados de nossos irmãos, por nossos irmãos ateus, hereges e agnósticos.
Deus nos permitiu esse poder de intercessão.

Me desculpem, mas meu JULGAMENTO pobre, incapaz e restrito sobre o que os senhores expõe em vosso site é de que vossas opiniões precisam de renovação, de mais amor ao próximo, de mais gratuidade, menos interpretação pessoal, mais inspiração do Espírito Santo.

Os senhores atacam. Por que?
O exemplo de São Francisco de Assis é tão inválido? Dobrou até mesmo o risco de excomunhão que teve, por ser tão radical em sua proposta de vida.

Agradeço desde já pela liberdade em me dirigir aos senhores e expressar minha opinião.
Peço que rezem e orem por nossos irmãos mais necessitados, material e espiritualmente.

Um abraço e que Deus os abençoe,

PS1: ** O Ecumenismo não se deve apenas com os protestantes, mas com outras Igrejas, como as Ortodoxas (fundadas por São Judas, São Bartolomeu, etc.), a Copta, a da Índia (fundada por São Tomé). Creio que os senhores são muito mais instruídos do que eu na história da Igreja.
PS2: Me desculpem também o fluxo desordenado de idéias.

Eng. Jairo S.

RESPOSTA


Prezado Sr. Jairo S.,
Salve Maria.

Agradecemos sua carta. Não é preciso desculpar-se por seu juízo desfavorável a nós.

Sua carta nos critica por defendermos a pena de morte e por criticarmos o ecumenismo. E, tratando desse último tema, o senhor defende a tese de que não se pode julgar os outros nunca, para não sermos julgados.

Quanto à pena de morte, o senhor se equivoca dizendo que a defendemos apenas por meio de uma citação de São Tomás de Aquino.

Como o senhor cita a Sagrada Escritura, vamos responder ao senhor dando apenas as citações da Bíblia favoráveis à pena de morte.

Em primeiro lugar, respondendo à sua citação das palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo a São Pedro, (dizendo que ele devia perdoar setenta vezes sete vezes aos seus ofensores), lembro que isso vale para as ofensas pessoais que nos são feitas. Devemos sempre perdoar os que nos ofenderam. Mas nós não temos o direito de perdoar as ofensas feitas aos outros. Se alguém ofender ao senhor, cabe ao senhor perdoá-lo, e não a outrem.

Ora o criminoso ofende não somente à sua vítima. Ele ofende e viola, também, o direito de Deus e da sociedade. E nós não temos direito de perdoar as ofensas feitas a Deus e à sociedade. Por isso, é que Deus aprova e recomenda a pena de morte.

Para comprovar isto, citaremos uma frase de Nosso Senhor Jesus Cristo no Apocalípse:

"Quem matar à espada, importa que seja morto à espada" (Apoc. XIII,10).

É o próprio Cristo quem nos ensina então que o assassino convicto deve ser punido com a morte.

E para São Pedro, Jesus disse:

"Pedro, mete a espada na bainha -- (repare que Jesus não manda São Pedro jogar fora a sua espada) -- porque quem com ferro fere, com o ferro deverá ser ferido" (Mt. XXVI, 52).

Portanto, Cristo deu expressamente a São Pedro o poder de condenar à morte.

E quando Jesus foi julgado por Pilatos, este lhe disse: "Não me respondes? Não sabes que tenho poder de te livrar ou de te condenar [à morte]? Respondeu Jesus; "tu não terias poder algum sobre mim, se não te fosse dado pelo alto" (Jo. XIX, 10-11).

Portanto, Cristo nos ensinou que a autoridade, cujo poder vem de Deus, tem poder de condenar à morte.

Poderia citar-lhe muitos outros textos da Bíblia , defendendo a pena de morte. Para encurtar esta carta dou-lhe apenas as referências: (Rom I,32; Atos, XXV,11; Rom. XIII, 4; Ex. XXVI, 12-17; Jer. XLVIII,10)

Espero que o senhor coloque seu julgamento a respeito da pena de morte abaixo do que diz Nosso Senhor.

Repare o senhor que já destacamos com negrito, por duas vezes, o fato de que o senhor -- que se recusa a julgar -- julgou:

1) julgou que a pena de morte é má e contrária a Deus;

2) julgou a nós, acusando-nos de orgulho, de agirmos como os fariseus, por julgar-nos a nós mesmos como católicos privilegiados, etc.

E não vê o senhor que, na mesma hora que nos condena por fazer julgamentos, o senhor nos julga?

Caro senhor S., o senhor caiu nessa contradição por não ter compreendido que é impossível ao homem não fazer julgamentos.

O que Deus nos proíbe é de julgar sem base, julgar apenas pelas aparências e não com a análise correta.

Cristo, de fato, nos disse: "Não julgueis, para que não sejais julgados" (VII, 1).

Mas Jesus disse também: "Não julgueis pelas aparências, mas julgai com reto juízo" (Jo. VII, 24). Portanto, Cristo diz que devemos julgar com retidão ou justiça.

Com efeito, senhor S., um homem que nada julgasse seria um homem sem juízo. E creio que seus pais, como os meus, sempre lhe disseram : "Tenha juízo, meu filho".

E o senhor nos pergunta: "Quem somos nós para julgar se nossos irmãos, sejam eles de que religiões sejam, são bons ou maus aos olhos de Deus"?

Se sua pergunta estivesse correta, Pio IX no Syllabus teria errado ao condenar a frase:

"Pelo menos devemos ter fundadas esperanças sobre a eterna salvação de todos aqueles não se acham de modo algum na verdadeira Igreja de Cristo" (Cfr. Denziger 1717 - Syllabus de Pio IX, erro 17).

Na medida em que uma pessoa está, de fato, numa religião errada, e na medida em que pratica os erros de uma religião falsa, ela não pode se salvar.

O IV Concílio de Latrão estabeleceu como dogma que "Fora da Igreja não há salvação" (Denziger, 430). E isso é dogma que devemos crer, sob pena de não sermos mais católicos. Para comprovar essa tese, haveria muitos outros textos a citar, mas por brevidade ficamos apenas nesse.

Quando o senhor cita a oração que Nossa Senhora de Fátima pediu que se acrescentasse no final de cada dezena do terço, o senhor comete um engano. A frase de Nossa Senhora foi:

"Ó meu bom Jesus, perdoai-nos, livrai-nos do fogo do inferno. Levai as almas todas para o céu, especialmente as que mais precisarem".

E não, como o senhor escreveu: "As almas que mais precisarem DE SUA MISERICÓRDIA".

Nossa Senhora não disse as palavras que coloquei em maiúsculas. Ela pede que desejemos que todas as almas sejam levadas ao céu, "especialmente as que mais precisarem". Só. Porque algumas almas têm mais necessidade de irem ao Céu do que outras. Por exemplo, é mais necessário que um Papa vá para o céu do que eu, porque a salvação de um Papa arrasta mais almas para o céu. É mais necessário que um Papa seja santo do que eu o seja, embora eu também deva sê-lo.

Quanto ao ecumenismo liberal, recomendamos que o senhor leia a encíclica Mortalium Animos de Pio XI, que o senhor pode encontrar em nosso site.

Por certo nossa rsposta deve deixar em seu ânimo ainda algumas dúvidas.

Escreva-nos de novo, para que o elucidemos e estejamos unidos na verdade e na caridade.

In Corde Jesu, semper,
Orlando Fedeli