Arte

Rock e revolução: uma ensalada II
PERGUNTA
Nome:
Fabio
Enviada em:
01/01/1999
Local:
Brasil



Ola Sr. Orlando...

Agradeço a resposta, só não entendi o fato de ter pedido a resposta o quanto antes foi tido como um ato grosseiro...Como trabalho, e já faz tempo, em um ambiente coorporativo fica quase automático a inclusão desta frase ao final de e-mails...Mas em todo caso...

O sr. achou meu mail um tanto quanto confuso...Bem concordo pois o escrevi ainda meio que embasbacado com sua matéria, e fui menos subjetivo do que gostaria de ter sido... Portanto decidi dividir meu mail e 3 partes: Música, Influências e Conclusão.

Vamos a primeira parte:

Música:

Sr. Orlando, acredito que sua avaliação quanto ao estilo em questão não foi subjetiva, e foi apenas com o intuito de denegrir o Rock, assim até a mulher mais bonita do mundo fica horrorosa !!!
Mas como o assunto é música gostaria deixar claro alguns pontos, que ao meu ver, são importantes quando se discute música (de qualquer estilo!), o Sr. deve saber q. a música é dividida em 3 partes: Ritmo, Harmonia e Melodia, sendo normalmente a primeira feita por intrumentos percurssivos, ou de graves intensos (bateria e contrabaixo, trombone, Cello etc..), a segunda é a cama harmonica da melodia criando um ambiente que se possa desenvolver a melodia, que normalmente é executada por instrumentos solos (a voz por exemplo), muito bem, porque falei sobre isso?...

Ora, o Sr. perguntou o que eu quis dizer quando falei em condenação do ritmo ou das harmonias, no Rock encontramos todos o elementos acima descritos, e no seu arrazoado o Sr. consegue condenar os 3 !!! Quando o Sr. questiona a letra, acho compreensível e em alguns casos até justo, mas uma sucessão de acordes não dá pra ser julgada !!! Um Dó é um dó, um Sol é um Sol, Ré menor é ré menor, não existe diferenças, assim como o ritmo...Tecnicamente não temos diferença alguma...De um Ré menor com sétima maior tocado em um violão, de uma guitarra, de um cravo, de uma viola ou de um piano...Na guitarra coloca-se efeitos, para deixar a guitarra mais suja, ou mais limpa, com eco etc...Mas nada de satânico apenas maravilhas da tecnologia.

Quando o Sr. diz grunhidos, o Sr. se refere a harmonia ou a Melodia ?? Se é a melodia, meu caro Sr. Católico, dou n exemplos de cantores no Rock que são exemplo de técnica vocal, e são estudados em conservatórios mundo afora, o caso mais famoso é Freddy Mercury do Queen, dono de um agudo fantástico,uma extensão vocal elogiada por maestros e sopranos famosos vide que cantou com uma cantora de ópera...Será que é apenas grunhidos...?? Acho que não.
Portanto, no que concerne técnica, e notas, escalas, o Rock se utiliza dos mesmos conceitos musicais de qualquer estilo ocidental de música.

Influências:

O Sr. deve gostar de música erudita, certo ? O Sr. sabia que a música clássica influência diretamente o Rock em uma série de aspectos, aliás nos anos 80 e 90 foi uma das maiores influências.

Compositores como J.S.Bach (cristão e autor de Jesus Alegria dos Homens), Nicollo Paganini, W.A. Mozart, Sergei Rachimaninov, Dvorak, Mendell...Entre muitos outros são citados sempre não só como influências, mas também executados por vários músicos de rock, existem estilos de rock voltados apenas a este tipo de música, chamado de neoclassico.

Este tipo de rock, é quase na sua maioria instrumental, e os que possuem letra normalmente contam sagas, ou fatos históricos, nada de satanismos ou maldade deliberada.
Mas pergunto estes foram estudados pelo Sr. que ao publicar a matéria sobre o Rock apenas cita o lado negativo (aliás, era isto que o Sr. tentava demonstrar), sem sequer se preocupar em ouvir todas as variações de um mesmo tema?

O lado católico do Sr., não deixa que exista uma avaliação imparcial, por exemplo sabe quanto tempo alguns dos músicos que tocam Rock levam estudando teoria músical?. Não é só pegar a guitarra e tocar, existe todo um estudo, existem maestros, bacharéis em música no mundo do Rock, pessoas estudadas e não trogloditas satânicos, procure referências e vera que não falto com a verdade.

Eu como bom ser humano, aprecio música clássica, e o Sr. se expantaria com a grande quantidade de Roqueiros compartilham do mesmo gosto, sabe porque? Quando ouvimos um tema barroco, ou medieval em um Rock, tentamos saber de onde vieram, saber as influências deste músico, saber de qual "fonte" ele bebeu, e chegamos em 99% das vezes em Bach ou Mozart !! Incrível ! Mas aposto que o Sr. não sabia.

Sabia que Mozart deu contribuições maravilhosas para o Rock? Como por exemplo as escalas por ele utilizadas, seus temas agressivos e o peso de suas músicas são inegáveis fontes de inspiração a gerações de Roqueiros como Richie Blackmore, Malmsteem, Jeff Beck entre outros.

Conclusão:

Ora, o Rock é algo satânico, maldoso, por suas letras, sua harmonia por sua melodia, ou por todo conjunto ? Mas se apenas as letras de algumas bandas tem citações "do mal" porque se condenar todo um estilo, não seria muito mais óbvio irmos de encontro a raiz do problema?

Na sua matéria, o Sr. condena um estilo, e de uma maneira extremamente tendenciosa, pois o Sr. foi procurar argumentos para uma coisa que o Sr. acredita, e pelo que eu sei não e a maneira mais correta de se avaliar algo, temos que mostrar os 2 lados da moeda, e ser o mais sujetivo possível.

Eu gostaria de mostrar bandas que o Sr. juraria que possuem uma orquestra por trás ! E ficaria espantado com os temas.

O fato de ser luterano, não quer dizer que sou praticante, aliás eu nem confirmação (1º Comunhão) fiz, preferia fazer coisas de criança ao invés de ficar infurnado em uma sala escutando um pastor gordo falando em alemão um monte de coisas que não concordo. Ia para igreja apenas para ter aulas de música e estudar o Alemão, não pense que falo da igreja católica por ser um Protestante, falo apenas por não concordar com algumas coisas...Assim como minha parte italiana é formada por católicos ardorosos, e também não fiquei interessado, por nada que me falaram, prefiro ficar a parte nesta história.

Espero ter sido mais claro neste segundo mail, também achei bastante divertido comentar esta polêmica com o Sr. que tem uma posição bem rígida em relação a sua religião, e acho que temos sempre que defender o que acreditamos.

Até mais, e agradeço a atenção...E que o sr. me responda assim que vossa agenda permitir..(hehehehe)...brincadeira

Abraços Musicais
Fabio L. B.

RESPOSTA


Prezado Fábio,
Ave Maria cheia de graça.

Agradeço, antes de tudo, sua explicação sobre a exigência de resposta rápida. Por isso me apresso a atender a sua mensagem .

Permita-me dizer-lhe com todo respeito que você, na mensagem anterior, foi bem confuso -- fez uma salada -- não por ter sido "menos subjetivo do que gostaria de ter sido". E sim por ser bem pouco objetivo.
O que nos faz confusos é a subjetividade. Devemos examinar tudo objetivamente, e nunca subjetivamente. Portanto, seja objetivo.
Por isso, ao focalizar o Rock, procurei ser objetivo e nunca subjetivo.
Minha opinião pessoal sobre o Rock e sobre qualquer coisa, não tem nenhuma importância . Só tem importância o que as coisas são realmente, OBJETIVAMENTE.
Eu não quis "denegrir" o Rock. Isso é impossível fazer: não se pode denegrir o que é de si negro. Não se pode pintar um quadro negro de negro. Eu só disse claramente o que é o Rock objetivamente: um horror.

Você me diz:
"... uma sucessão de acordes não dá pra ser julgada !!! Um Dó é um dó, um Sol é um Sol, Ré menor é ré menor, não existe diferenças, assim como o ritmo...Tecnicamente não temos diferença alguma...De um Ré menor com sétima maior tocado em um violão, de uma guitarra, de um cravo, de uma viola ou de um piano...Na guitarra coloca-se efeitos, para deixar a guitarra mais suja, ou mais limpa, com eco etc...Mas nada de satânico apenas maravilhas da tecnologia."
Uma sucessão de acordes pode ser julgada, sim senhor!
Você afirma que todo tipo de música é feito com as mesmas notas musicais, e que , por essa razão, todas elas seriam boas, não se podendo condenar nenhuma.
Ora, meu caro Fábio, isso é um absurdo.
Toda casa é feita de tijolos, colocados uns sobre os outros. Segundo você, então, uma casa de favela e o palácio de Versailles teriam, ambos, beleza , por que feitos do mesmo material.
Todo rosto possui os mesmos elementos. Entretanto, eu sou feio, apesar de ter os mesmos elementos que o rosto do Apolo do Belvedere.
Toda comida é feita, no fundo, com os mesmos elementos. Mas, dependendo da ordem e da proporção dos elementos, uma é gororoba, e outra um quitute de alto valor culinário.
Na pintura se dá o mesmo. Todos os quadros são feitos das mesmas cores. Entretanto, alguns são medonhos e outros são belíssimos, conforme a ordem das cores e a proporção com que são usadas.
Meu caro Fábio, você continua fazendo saladas, embora hoje sua salada seja um pouco menos um pasticcio do que da outra vez, pois trata quase só de música. Mas trata ensaladamente, apesar da tentativa de pôr um pouco de ordem nela através de uma enumeração de suas partes.

O rock usa as mesmas notas usadas por Haendel, Bach e Vivaldi. Mas o que torna o rock satânico é a desordem com que as notas são empregadas, a sua desproporção e seus simbolos péssimos.
Repare que falei em proporção, ordem e símbolos. Falei em proporção, porque já os gregos haviam descoberto que a beleza material, ou "Musical ", provém da proporção. Falei de ordem, porque a beleza formal só pode provir da ordem da obra de arte, que permita reconher o que ela é, o que ela significa, por meio de nossa inteligência.
Noutras palvras, não basta a beleza material, fruto da proporção das cores, dos sons etc. É necessária uma ordem sapiencial, que nos permita conhecer o que a coisa, artisticamente representada, é.
A obra de arte, então, precisa ser verdadeira, inteligível. Essa é a razão pela qual a arte é própria do ser racional, meu caro. Animais não fazem, nem entendem obras de arte.
Toda obra de arte só o é, de fato, se for inteligível. Se transmistir uma idéia. Platão já dizia isso. Se você se der ao trabalho de ler, sem raiva e com atenção, o que escrevi no trabalho sobre o Rock, encontrará lá a explicação do que lhe digo agora.
Toda obra musical -- para ser obra de valor artístico -- tem que transmitir idéias. Por essa razão, dizia Beethoven que uma sinfonia dele tinha mais idéias e doutrinas do que um tratado de Metafísica.
Finalmente, a obra de arte deve ser simbólica, para fazer analogia entre este mundo em que vivemos e Deus. Porque Deus fez tudo com símbolos. Tudo fala dEle, através dos símbolos que são "o inteligível no sensível", conforme a esplêndida definição de um suspeito filosófo neo platônico, o Pseudo Dionísio.
Tudo fala de Deus, mas o Rock, só fala do diabo, do inferno, de drogas e vicios. Por isso ele é cacofônico.

Você me pergunta se, falando dos grunhidos do Rock, me referi à "melodia" do Rock.
Perdão por ter simplificado, por razões de tempo e espaço. Deveria ter falado ainda em uivos, relinchos, guinchos, e outros sons animalizantes.
Tanto o Rock tem pouco de inteligível, que seus amantes dizem que vão "curtir um SOM ", isto é, sentir uma simples vibração sonora. O que reduz a música a simples fenômeno material, físico, e não intelectual. Por isso falei em grunhidos, que são meras explosões de som animal.

Você argumenta com a técnica necessária para fazer um Rock, como se a técnica fosse um valor absoluto.
Também um assalto pode ser feito com uma técnica sofisticada. Mas continua sendo condenável. Jamais neguei que houvesse técnica em alguns rocks. Esses, que utilizam uma boa técnica, necessariamente são os piores, porque, sendo bem feitos tecnicamente, enganam mais.

Você me diz ainda que o Rock recebeu influências de "compositores como J.S.Bach (cristão e autor de Jesus Alegria dos Homens), Nicollo Paganini, W.A. Mozart, Sergei Rachimaninov, Dvorak, Mendell".
E daí?
Você pensa que eu, como professor de História, acho que as coisas nasceram todas neste século, sem ter antecedentes?
Que o Rock use algo de autores antigos, é a coisa mais necessária do mundo. Quem existe hoje, necessariamente teve avós, meu caro descobridor do óbvio. O problema não é o ter pais ou raízes.
Receber e aproveitar o que os vultos do passado descobriram ou fizeram é coisa a mais necessária que existe. O problema é como se usa o que os autores mais perfeitos descobriram.
E note que os compositores que você me cita, vêm de cambulhada - você não perde a mania de fazer tudo ensaladamente -- Bach, Paganini, Mozart, Rachmaninof, Dvorak, Mendelson. Tudo junto. Como se não houvesse distinções a fazer entre eles.
Você não faz distinções meu caro, e na sua salada musical cabem barrocos, rococós, românticos e modernos, misturadamente -- como passageiros do Metrô, em hora de rush -- comprovando que, de fato, você desconhece o que é uma escola de arte.
Escola de arte, caro Fábio, é uma filosofia posta em símbolos.
Não vou explicar-lhe isto, agora, porque ficaria longo demais. Pense um pouco nesse ponto, sozinho.
Mas, não venha com novas saladas. E o fato de você gostar, ao mesmo tempo, de Rock e de música clássica, só comprova sua essencial ensaladice.

Concluindo, você me pergunta se condeno tudo no Rock. Se eu condenasse apenas certas letras, você ainda aceitaria, porque reconhece que algumas são realmente satânicas.
Condeno tudo, sim senhor.
E sua distinção entre as letras más de canções rockeiras e sua melodia é contraditória e absurda, porque, normalmente, o que a letra diz é a explicitação do que está na música inteira.
Normalmente a letra de uma canção está para sua música, como a bula do remédio está para a composição química que nele se encontra.
Você condena a "bula", por retratar o que há no "remédio", e engole o "remédio".

Finalmente, você me fala de suas incoerências religiosas. Acabei ficando com a impressão de que, também no seu "lado" religioso (como você diz) há muita "salada", confusa e mal feita. Lamento.
Aliás, você me anunciou uma salada em três partes, e enumerou só a primeira. Esqueceu-se de enumerar as demais. Defeitos de ensaladeiro.
Também tenho que discordar que seus abraços sejam musicais. Seria melhor denominá-los de "destoantes", quando não de desafinados.
Retribuo-lhe, pois, em escala mais lógica, com abraços coerentes e sinceros.


In Corde Jesu semper,

Orlando Fedeli.