Igreja

O problemático Diário da Irmã Maria Faustina Kowalska e suas devoções
Liniker Antonovas
Santa Faustina Kowalska é uma freira da Congregação das Irmãs de Nossa Senhora da Misericórdia, que viveu de 1905 a 1938, e ficou conhecida por sua devoção à Divina Misericórdia. No livro intitulado Diário de Santa Faustina, ela conta suas experiências místicas e as mensagens recebidas de Jesus. O Diário, escrito nos últimos 4 anos de vida da Irmã, isto é, de 1934 a 1938, é um dos escritos mais amplamente propagados no meio carismático, de onde o interesse em conhecê-lo melhor.

Para quem lê as inúmeras páginas do Diário, saltam aos olhos afirmações um tanto quanto controversas em relação à Santa Doutrina Católica. Porém, a canonização de Irmã Faustina, a consideração que lhe votava São João Paulo II e a instituição do Domingo da Misericórdia, conforme pedido dela, parecem proibir qualquer dúvida em relação a seus escritos!
 
Portanto, antes de entrar no estudo do texto do Diário, vamos examinar algumas das objeções à mera possibilidade de se fazer uma crítica.
 
Objeções à possibilidade de uma crítica ao Diário:
1)    A canonização de Santa Faustina impede a discussão de seus escritos?
 
Torna-se oportuno para nossa análise, mostrar a você caro leitor, que embora seja considerada sentença comum entre os teólogos, a canonização nunca foi declarada um dogma de fé.
 
Sentenças comuns são teses que gozam de grande probabilidade, todavia, não se tratando de matéria definida pela Igreja, os católicos não estão obrigados a aceitar essas teses com fé divina. Sua rejeição não faz incidir em anátema; diferentemente daquele que rejeita o dogma “Extra Ecclesiam nulla salus”, isto é, “fora da Igreja não há salvação”, este sim, se negado, digno de anátema.
 
Além de não ser um dogma de Fé, não há como não negar que as recentes modificações realizadas para a simplificação do processo de canonização, causaram perplexidade e diminuíram a segurança que se espera em uma declaração supostamente infalível.
 
Ademais, nosso estudo não visa dar o atestado positivo ou negativo de santidade para a Irmã Faustina, e sim constatar a problemática que está unida a seus escritos e revelações privadas, que outrora já fizera grande barulho na Igreja.
 
2)    Que papel têm as revelações privadas diante da doutrina da Igreja?
É importante considerar que quando a Igreja aprova uma revelação privada, esta aprovação é simplesmente uma declaração de que ela não encontrou nada nessas revelações que fosse contrário à fé e aos bons costumes, e que os fiéis podem lê-las sem nenhum perigo para a alma. Ouçamos o que diz o Papa Bento XIV, grande canonista da Igreja:
“O que se deve pensar das revelações privadas aprovadas pela Santa Sé, as de Santa Hildegarda, Santa Brígida, Santa Catarina de Siena? Dissemos que não é nem obrigatório nem possível dar-lhes um assentimento de fé católica, mas somente de fé humana, conforme as regras da prudência, que nos apresenta como prováveis e piedosamente críveis.” (De canon.,1 III,c. Li n° 15).
 
Repetimos a afirmação básica: não é obrigatório nem possível dar às revelações privadas um assentimento de fé católica, mesmo que tais revelações tenham sido aprovadas pela Igreja.
 
3)    As condenações à Irmã Faustina foram retiradas pela Igreja.
 
Iniciamos este ponto com a retirada da condenação à Irmã Faustina feita pelo Cardeal Šeper em 15 de Abril de 1978:
“Esta S. Congregação, tendo em vista os muitos documentos originais, desconhecidos em 1959; considerando que as circunstâncias variaram profundamente e contando com o parecer de muitos Ordinários poloneses, declara que as proibições contidas na citada “Notificação” não obrigam doravante.”
 
A grande luta dos ordinários poloneses foi liderada pelo cardeal Karol Wojtyla, mesmo cardeal que quando Papa, canonizou sua conterrânea em 30 de Abril do ano 2000, o II Domingo da Páscoa. Esse Domingo, que tradicionalmente era conhecido como Domingo “In Albis”, na pós canonização foi abolido para dar espaço ao Domingo da Divina Misericórdia, conforme pedido da própria Santa Faustina, que outrora havia sido negado pelo Santo Ofício através do Papa João XXIII, em nota que analisaremos mais abaixo:
“Nenhuma festa da Divina Misericórdia deve ser instituída.”
 
Para se ter a retirada, houve uma condenação para tal, mas neste caso da irmã Faustina, não houve apenas uma condenação, e sim três, como veremos. 
 
4)    Quais tinham sido essas condenações?
 
a.    A primeira condenação vem através do Papa Pio XII, que introduz em 1950 os escritos da Irmã Faustina no Index Librorum Prohibitorum (Índice dos livros proibidos).
 
Pio XII considerava a obra da Irmã Faustina como contrária à fé católica. O Santo Padre se preocupa não com as orações da devoção, e, sim com as circunstâncias das chamadas aparições à Irmã Faustina e seu conteúdo doutrinário.
 
b.    A segunda condenação às revelações da Irmã Faustina foi aplicada pelo Papa João XXIII na reunião plenária realizada em 19 de novembro de 1958, sendo emitidas então três declarações pelo Santo Ofício:
            “1. Não há evidência da origem sobrenatural dessas revelações.  Isso significa que os membros do Santo Ofício examinaram o conteúdo e decidiram que não havia nada ali que indicasse que as aparições eram sobrenaturais.  Numa aparição autêntica pode-se olhar para o conteúdo e afirmar que não se pode dizer definitivamente que são de origem divina, mas existem evidências suficientes para afirmar que é possível.
 
            2. Nenhuma festa da Divina Misericórdia deve ser instituída. Porque se for baseado em aparições que não vêm claramente de Deus, então seria precipitado e temerário instituir uma festa na Igreja baseada em algo que é uma falsa aparição.
 
            3. É proibida a divulgação de escritos que propaguem esta devoção sob a forma recebida por Ir. Faustina, bem como a imagem típica dela.” (grifo nosso).
 
c.     Já em 6 de março de 1959, o Santo Ofício reforça a condenação em carta assinada pelo Cardeal Alfredo Ottaviani:
“A Suprema Sagrada Congregação do Santo Ofício examinou as supostas visões e revelações da Irmã Faustina Kowalska, do Instituto de Nossa Senhora da Misericórdia, que morreu em Cracóvia em 1938 e determinou o seguinte:
A divulgação de imagens e escritos que apresentem a devoção da Divina Misericórdia na forma proposta pela própria Irmã Faustina deve ser proibida.
 
Apelamos à prudência dos bispos no dever de remover as imagens acima mencionadas, caso elas sejam expostas ao culto.” (grifo nosso)
 
[O apelo do Santo Ofício para a remoção das imagens propostas pela Irmã Faustina foi tão obedecido nas igrejas da congregação da irmã, quanto foi obedecido pelos modernistas a preservação do uso da língua latina na Santa Missa: “Deve conservar-se o uso do latim nos ritos latinos.” (Sacrosanctum Concilium. Artigo 36 § 1)!]
 
5)    Em que consistia a devoção da Divina Misericórdia na forma proposta pela Irmã Faustina, que que tinha sido objeto de tal proibição?
 
Essa devoção consistia principalmente na imagem de Jesus Misericordioso e no terço da Divina Misericórdia.
 
a.    A imagem de Jesus Misericordioso:
Em um excelente sermão feito pelo professor de Teologia e Liturgia, Monsenhor Patrick Perez, o Jesus Misericordioso proposto pela Irmã Faustina é confrontado com a imagem do Sagrado Coração de Jesus.
 
O Monsenhor mostra que o Jesus Misericordioso transmite uma misericórdia incondicional, a qual nos leva ao mesmo pensamento infame de Lutero que dizia “Sê pecador e peque fortemente, mas tenha mais fortemente a fé e alegrai-vos em Cristo.”
 
Jesus Misericordioso exprime – como está no próprio Diário da Irmã - “a doçura! Confia, confia alma, embora estejas manchada pelo pecado.” (n. 1748)
 
Eis a raiz da devoção a Divina Misericórdia proposta nos escritos da irmã Faustina: conduzir o fiel à meditação  da Divina Misericórdia, sem o pensamento nos Novíssimos, sem a recordação do Juízo Final, pois, crendo, estaremos salvos independente dos pecados. Por isto mesmo que a irmã descreve:
 
“No momento em que ajoelhei-me para riscar minha vontade própria, como o Senhor me mandou, ouvi: A partir de hoje não tenhas medo dos juízos de Deus, porque tu não serás julgada.” (n. 374) (Grifo nosso).
 
O Catecismo nos ensina que é um pecado contra o Espírito Santo ter a presunção de salvação, no Eclesiastes se lê: “O homem não sabe se é digno de amor, se de ódio.” (Ecle. IX, 1). Portanto, nenhum homem sabe se está ou não na graça de Deus, a devoção mencionada nos convence do contrário: devemos estar convictos de nossa salvação.
 
Em um paralelo chocante, temos a imagem do Sagrado Coração de Jesus que é propriamente a devoção ao amor e misericórdia de Deus. O Sagrado Coração de Jesus nos mostra, através do seu coração ferido, a nossa tamanha ingratidão com Deus; através das chagas, mostra-nos o quanto sofreu para nos salvar, tudo o que fez para a nossa redenção. Por isso o Sagrado Coração de Jesus nos impele à prática de atos expiatórios pelos pecados cometidos, estimula-nos à mortificação, para de fato, alcançar a Divina Misericórdia. É no Sagrado Coração de Jesus que encontramos todo o mistério da redenção, é neste Coração que podemos ver verdadeiramente o amor e Misericórdia de Deus para conosco.
 
b.    O Terço da Misericórdia:
Esse Terço consiste na recitação de um conjunto de jaculatórias que teriam sido ditadas por Cristo, através do uso de um terço comum do Santo Rosário.
 
No Diário da Irmã Faustina, consta uma revelação de Deus que “Os sacerdotes o recomendarão (Terço da Misericórdia) aos pecadores como a última tábua de salvação.” (n. 687)
 
“Estou dando à humanidade a última tábua da salvação, o refúgio na Minha misericórdia.” (n. 998).
Ora, Nossa Senhora pediu em Fátima a oração do Rosário. Em uma entrevista de 26 de dezembro de 1957, Lúcia afirma que a Santíssima Virgem disse:
“os dois últimos remédios que Deus dava ao mundo: o Santo Rosário e o Imaculado Coração de Maria.” (grifo nosso).  Irmã Lúcia também assegurou: “o Rosário é a arma de combate das batalhas espirituais dos últimos tempos”.
 
Vemos aqui um claro confronto entre as palavras da Santíssima Virgem em Fátima com parte do conteúdo exposto por Santa Faustina, que recebe a promessa de que “conseguirás tudo.” (n. 1731) através da oração do Terço da Misericórdia, inclusive parar o anjo executor da irá de Deus que fica “impossibilitado de executar o justo castigo.” (n. 474-475).
 
Este relato faz com que em diversos lugares, grupos de pessoas substituam a tradicional oração do Terço Mariano pela oração de cinco minutos do Terço da Misericórdia, muito propício para o meio carismático que pode aplicar mais tempo à “dancinhas” e os “ariblablás” das orações em línguas que ninguém entende.
 
Acreditamos ainda assim que seja possível se lucrarem graças com esta oração do Terço da Misericórdia. Um fiel, por exemplo, que tem como propósito fazer uma peregrinação ao túmulo de Santa Jacinta - que se encontra na Basílica de Nossa Senhora do Rosário, em Fátima, Portugal - por um engano, se dirige ao Cemitério de Vila Nova de Ourém - onde antes se encontrava o corpo da Santa: esse fiel certamente receberá os benefícios e as graças da penitência feita pois Deus não iria invalidar e negar essas graças em virtude da confusão não intencional feita pelo penitente. Assim, Nosso Senhor recompensará a intenção do peregrino.
 
Da mesma forma é plausível também que se recebam graças através do Terço da Misericórdia.
 
Dando continuidade a este artigo, vamos nos ater agora a alguns dos inúmeros pontos controversos do diário. 
 
Pontos controvertidos do Diário de Santa Faustina:
1)     Como o Diário favorece antes do tempo a comunhão na mão?
 
O favorecimento da comunhão na mão talvez seja um ponto dos mais escandalosos do Diário. É algo impensável em sua época, que mesmo assim é relatado diversas vezes. Frequentemente Jesus eucarístico pousa nas mãos de Faustina:
“Em determinado momento, Jesus me disse: ‘Abandonarei esta casa... Visto que há nela coisas que não Me agradam.’ E a hóstia saiu do sacrário e pousou em minhas mãos e eu com alegria, coloquei-a novamente no sacrário. Repetiu-se isso uma segunda vez, e eu fiz com ela a mesma coisa. Mas isso se repetiu pela terceira vez.” (n. 44);
Durante uma Santa Missa, no momento da comunhão quando o Sacerdote entregava Nosso Senhor Eucarístico para as irmãs, segundo o relato de Faustina, uma hóstia se prende na manga do Padre que não percebe e quando ela recebe a comunhão, a hóstia da manga vai até suas mãos, e, então ela relata:
“Da hóstia ouvi estas palavras: ‘Desejei repousar nas tuas mãos e não só no teu coração’.” (n. 160)
 
Já em outro momento, depois de ter feito um favor a outra Irmã, ela diz:
“Quando regressei à minha cela vi um cibório com o Santíssimo Sacramento e ouvi esta voz: ‘Pega este cibório e leva até o sacrário’.” (n. 285)
 
O cibório sempre se apressava em estar próximo da irmã:
“Antes da comunhão vi um grande cibório repleto com hóstias consagradas. Alguma mão colocou esse cibório próximo de mim. Peguei-o em minhas mãos, e havia nele mil hóstias vivas.” (n. 640)
 
Jesus Sacramentado repousa sobre as mãos leigas de Faustina não como uma exceção à regra, e sim como que uma regra. Nem mesmo o sacrário do convento é tão digno quanto as mãos de Faustina para portar Nosso Senhor Jesus Cristo na hóstia.
 
Porém, não foi sempre essa a doutrina da Igreja. Destaco aqui o trecho de uma resposta do professor Orlando a um consulente:
“A comunhão na mão só foi permitida em situações de grave necessidade em locais onde a Igreja sofria perseguição.
 
Ainda no Catecismo de Trento encontramos as seguintes afirmações:
Corolário: Leigos não podem tocar nos vasos sagrados.
 
Ora, os leigos não podem tocar nos vasos sagrados, pois estes são utilizados para o sacrifício da Missa recebendo diretamente o santíssimo corpo de Cristo. Se não podem tocar nos vasos sagrados, o que dizer a respeito do Corpo de Cristo?
 
Assim, continua o catecismo:
De mais a mais, com intuito de salvaguardar, sob todos os aspectos, a dignidade de tão augusto Sacramento, não se deu unicamente aos sacerdotes o poder de administrá-los: como também se proibiu, por lei eclesiástica, que, salvo grave necessidade, ninguém sem Ordens Sacras ousasse tomar em mãos ou tocar vasos sagrados, panos de linho, e outros objetos necessários à feitura da Eucaristia.” (Citações contra a comunhão na mão. Orlando Fedeli: https://www.montfort.org.br/bra/cartas/doutrina/20061217170602/ )
 
2)    Qual é o papel de Faustina conforme seu próprio Diário?
 
Irmã Faustina parecia ter tão elevada ideia de si mesma, que isso se exprimia nas relações e tratamentos de Nosso Senhor com ela: 
“Quando o padre entrou com Nosso Senhor na cela, um tal ardor envolveu todo o meu ser que eu sentia que, se o sacerdote tivesse demorado mais um momento, o próprio Jesus fugiria de suas mãos e viria ter comigo.” (n. 1458)
 
Parece até que a vida espiritual que buscamos viver para conhecer, amar e servir a Deus, era o que Jesus fazia para estar unido a Faustina, pois Ele dizia à Irmã:
“Tu és a Minha alegria, tu és a delícia do Meu coração.” (n. 27).
 
Nosso Senhor tanto anseia por Faustina que oferece a ela um novo mundo:
 “Uma vez subitamente Jesus em grande majestade; disse-me estas palavras: ‘Minha filha, se quiseres, criarei neste mesmo instante um novo mundo mais belo que este, e passarás nele o resto dos teus dias.’ Respondi: ‘Não quero nenhum mundo, eu desejo a vós.’ (...) Então ouvi essas palavras: ‘Com nenhuma alma uno-Me tão intimamente e de tal modo como Me uno contigo’.” (n. 578) (grifo nosso)
 
Veja, caro leitor, que os pontos controversos nos escritos da Santa Faustina são inúmeros. Nem São José e nem mesmo a Santíssima Virgem se unia tão intimamente à Nosso Senhor quanto à religiosa polonesa:
“Uno-Me contigo tão estreitamente, como não o faço com nenhuma criatura.” (n. 707)
 
É também por Santa Faustina que Deus abençoa o mundo:
“Pérola querida do Meu Coração, vejo o teu amor tão puro, mais do que o dos anjos. Por ti abençoo o mundo.” (n. 1061)
 
Nem os anjos possuem a pureza que Faustina tem, inclusive a mínima ação da Irmã, segundo o Jesus do Diário teria valor infinito! Mas, se assim fosse, bastava-nos que Faustina sofresse para a nossa redenção, pois os méritos da Paixão de Cristo nos são aplicados justamente porque os sofrimentos de Jesus eram de valor infinito, por Ele ser Deus:
“És minha esposa pelos séculos. A tua pureza deve ser mais do que angélica, porque com nenhum anjo tenho uma familiaridade tão estreita como contigo. A mínima ação da minha esposa tem valor infinito.” (n. 534) (grifo nosso)
 
3)    Como aparece Nossa Senhora a Faustina?
 
Também Nossa Senhora não esteve de fora das aparições relatadas no diário, porém, nos deixa atônitos a maneira com que a grande Mãe de Deus é demonstrada:
“Em determinado, momento veio visitar-me a Mãe de Deus. Estava triste, tinha os olhos voltados para baixo.
 
Fez-me entender que tinha alguma coisa para me dizer, mas parecia que não queria falar disso. Quando o percebi, comecei a pedir à Mãe de Deus que me dissesse e que olhasse para mim. Nesse momento Maria, então, olhou para mim com um sorriso meigo e disse: ‘Terás alguns sofrimentos por motivo de uma doença e dos médicos.’” (n. 316)
 
Curiosa a maneira que Nossa Senhora aparece para a Irmã, sem nenhuma majestade.
 
Em La Salette um globo enorme de luz, mais luminoso que o sol, de um raio de três a quatro metros, atemoriza os videntes, até que surge a Santíssima Virgem e os acalma.
 
Em Fátima, os pastorinhos viram um clarão similar ao de relâmpagos, então assustados com a tempestade que previram, surge uma Mulher esplêndida vestida de sol no topo de uma azinheira, ainda apavorados pensando em fugir, Nossa Senhora os acalma.
 
Estes são apenas dois exemplos opostos da forma com que a Santíssima Virgem aparece à Santa Faustina: meiga, tímida, cabeça baixa e sem nenhum esplendor.
 
Em contrapartida vejamos como a freira relata um sonho sobre si mesma:
“Em determinado momento, vi multidões de pessoas em nossa capela, em frente dela e na rua, porque não cabiam nela. A capela estava solenemente ornamentada. Junto ao altar havia um grande número de membros do clero; em seguida as nossas irmãs e também muitas de outras congregações. Todos aguardavam a pessoa que devia tomar o seu lugar do altar. Mas logo que saí de casa, isto é, do corredor, para atravessar o pátio e ir à capela, atendendo à voz que me chamava, todas as pessoas começavam a atirar em mim o que podiam: lama, pedras, areia, vassouras, de modo que, a princípio, hesitei, não sabendo se devia ir adiante. No entanto, aquela voz me chamava com mais força ainda e, apesar de tudo, comecei a andar corajosamente.
 
Enquanto entrava na capela, as superioras, as irmãs e as educandas, e até mesmo meus pais, começaram a atingir-me com o que tinham à mão, de maneira que, quer quisesse quer não, tive que dirigir-me ao lugar que estava reservado para mim no altar. Logo que ocupei o lugar reservado, o mesmo povo, as educandas, as irmãs, as superioras e meus pais começaram a estender suas mãos para mim e pedir graças. Eu não estava zangada com eles por terem jogado contra mim todas aquelas coisas. Surpreendentemente, sentia de modo estranho um amor mais especial, justamente para com aquelas pessoas que me obrigaram a entrar mais depressa no lugar reservado. Naquele momento, a minha alma foi inundada por uma felicidade inconcebível e ouvi estas palavras: Faz o que te aprouver, distribui graças como quiseres, a quem quiseres e quando quiseres.” (n. 31)
 
Então, a Irmã se apresenta como a medianeira de todas as graças, aquela a quem estava mais intimamente ligada a Deus, sem citar Nossa Senhora!
 
4)    Há um Céu dentro do Céu, apenas para os escolhidos?
 
Santa Faustina cria a tese da existência de um Céu dentro do Céu que é apenas para os escolhidos, o que se assemelha bastante à doutrina protestante dos escolhidos:
“Foi no coração de Jesus que aprendi que, para as almas escolhidas, no próprio céu existe um outro céu, onde nem todos tem acesso, mas apenas as almas escolhidas.” (n. 592)
 
Imaginando um Céu dos escolhidos dentro do Céu, é evidente que este grupo seleto seria composto de almas extraordinárias. Por isso, a irmã não hesita em deixar claro suas qualidades, a fim estar no grupo dos escolhidos:
“A minha convivência é com os anjos.” (n. 1200)
 
“Recebo a Santa comunhão de maneira como que angélica.” (n. 1278)
 
“Com um só olhar penetrei o mundo inteiro, e não encontrei um amor semelhante ao do meu coração.” (n. 1632)
 
Certamente, a irmã nunca deve ter tido depressão, até porque, quando por acaso ela fosse proceder contra a sua própria vontade, logo era corrigida:
“Nosso Senhor me fez conhecer como isso não Lhe agradara. Fui severamente censurada, para que nunca procedesse contra a minha convicção interior.” (n. 1383) (grifo nosso)
 
5)    Por que Faustina não viveu na Congregação que Jesus lhe prometera?
 
Visando não alongar mais este artigo, não iremos analisar detalhadamente a nova Congregação que Nosso Senhor pede à Irmã Faustina, Congregação, aliás, que algumas das irmãs “não usaram hábito, mas vestes seculares” (n. 536)
 
Tal Congregação, repetidas vezes desejadas por Nosso Senhor, não foi fundada nem mesmo com a promessa feita por Jesus à Faustina:
“tu viverás nela.” (n. 438)
 
Talvez essa promessa fosse apenas metafórica. Ou então Deus se enganou. Outra possibilidade é de que este fato seja uma forte evidência de que os sentimentos e as vozes interiores da Irmã, na verdade não eram de Nosso Senhor...
 
6)    Por que Faustina deveria comungar, mesmo contra sua consciência?
 
Santa Faustina parecia achar a Misericórdia de Deus um direito exclusivo seu, a ponto de não se afastar da comunhão mesmo quando a acusava a sua consciência:
“Eu não faltava à santa Comunhão. Quando achava que não devia comungar, procurava a mestra, antes da comunhão, e dizia-lhe que não devia comungar – parecia-me que não deveria comungar. Ela, no entanto, não me permitia deixar a santa Comunhão; e eu comungava.” (n. 105)
 
Nos ensina São Paulo que “todo aquele que comer o pão ou beber o cálice do Senhor indignamente será culpável do Corpo e do Sangue do Senhor. Que cada um se examine a si mesmo e, assim, coma desse pão e beba desse cálice. Aquele que o come e o bebe sem distinguir o Corpo do Senhor, come e bebe a sua própria condenação. Essa é a razão por que entre vós há muitos adoentados e fracos, e muitos mortos. Se nos examinássemos a nós mesmos, não seríamos julgados. Mas, sendo julgados pelo Senhor, ele nos castiga para não sermos condenados com o mundo (1Cor XI, 27–32) (grifo nosso).
 
A comunhão em pecado mortal é um sacrilégio. Já nos disse São Paulo que cada um deve examinar a si mesmo, e não uns aos outros; o próprio novo Catecismo da Igreja Católica é claro no n. 1415:
“Aquele que quiser receber Cristo na Comunhão eucarística deve encontrar-se em estado de graça. Se alguém tiver consciência de ter pecado mortalmente, não deve aproximar-se da Eucaristia sem primeiro ter recebido a absolvição no sacramento da Penitência.”
 
Por isso, causa enorme estranheza esse relato da Irmã Faustina. Contra a Doutrina Católica, Faustina era
“censurada, para que nunca procedesse contra a sua convicção interior” (n. 1383),
a não ser que fosse para receber a Santa Comunhão!
 
7)    Por que em uma única Hóstia aparece Jesus vivo?
 
Tratando ainda sobre a comunhão, a religiosa relata um episódio em que recebe a única hóstia viva que o Sacerdote entregava. Até mesmo ela fica perplexa ao ver um único Jesus vivo no cibório, mas Nosso Senhor lhe responde:
“É verdade, sou O mesmo sob todas as espécies, mas nem todas as almas Me recebem com a mesma fé viva com que tu Me recebes.” (n. 1407)
 
Aquele fiel que lê isso, sendo devoto da Santa, tem um problema enorme a resolver, pois se cria a dúvida de que no cálice nem todas as hóstias estarem com Jesus vivo. Ou, conforme o testemunho da Santa que segue, pode acabar caindo na soberba de achar que o Senhor Eucarístico que comunga é melhor que o de outra pessoa. Isso é absurdo! Nosso Senhor devidamente consagrado, é o mesmo em cada partícula, independente da fé da pessoa que comunga, e o critério para se comungar bem é o estado de graça, como já vimos anteriormente.
 
8)    Por que o demônio interfere na confissão de Faustina?
 
No diário de Santa Faustina temos uma controvérsia inédita: o demônio mostra o quão Santo é Deus e o quanto pecadora é a Irmã Faustina, chegando ao “absurdo” de incentivar a confissão frequente para a freira:
“Tive a clara consciência das seguintes palavras: ‘Estás vendo, Deus é tão santo, e tu tão pecadora. Não te aproximes Dele e confessa-te diariamente’. – E, realmente, tudo o que eu pensava parecia ser pecado. No entanto, não abandonei a santa comunhão e resolvi ir confessar-me no devido tempo. Todavia, quando veio o dia da confissão, anotei um grande número desses pecados, para me confessar. Mas, quando me aproximei do confessionário, Deus permitiu que eu me confessasse somente de duas imperfeições, embora me esforçasse para me confessar como tinha me preparado. Quando me afastei do confessionário, o Senhor me disse: Minha filha, todos os teus pecados dos quais te querias confessar não o são aos Meus olhos, por isso te tirei a possibilidade de os enunciar. – Vi que o demônio, querendo perturbar a minha paz, me dava pensamentos exagerados.” (n. 1802)
 
A que ponto chegamos, até no inferno parece haver demônios que incentivam a busca frequente pelo sacramento da penitência! Ironias à parte, é no mínimo esquisito este relato, que também não incentiva a preparação para a confissão e desculpa a dificuldade de acusar os pecados no confessionário, com o argumento de Deus ter impedido à penitente que os  acusasse.
 
9)    Haverá uma iluminação post mortem para salvar todas as almas?
 
Quando em 1950, os escritos da Irmã Kowalska são inseridos pelo Cardeal Ottaviani no Index, junto à de Padre Getino (pelos mesmos motivos), o L’Osservatore Romano comenta assim a inserção:
“Esta obra também defende, ex professo, uma estranha teoria relativa a uma denominada iluminação especial que as almas humanas receberiam de Deus no momento de sua separação do corpo, e por meio da qual se converteriam íntima e perfeitamente ao Criador e, assim, seriam justificadas e salvas. É claro que não são necessárias muitas palavras para fazer entender quão sério é o perigo escondido sob essas teorias que, não só não têm base na Revelação, mas estão mesmo em contradição com ela e com o sentimento comum da igreja. “
 
Esse grave erro da salvação universal independente do arrependimento e do perdão dos pecados durante a vida, embora defendido por muitos hoje em dia, bastaria para a condenação dos escritos de Faustina Kowalska como desviantes da doutrina católica. Temos obrigação de estudar sobre as devoções que queremos ter, para saber se tem fundamento e se faz sentido.
 
É preciso reconhecer, como diz Monsenhor Patrick Perez, já citado acima,
“toda a devoção da Divina Misericórdia (proposta por Santa Faustina) não representa o espírito católico. O espírito católico está fazendo reparo constante em penitência pelos nossos pecados.”
 
Após essa análise fica clara uma dificuldade em torno da devoção proposta pela Irmã Faustina. Há de se concluir, porém, que não somente na devoção, que fora condenada duas vezes pelo Papa João XXIII através do Santo Ofício, mas também o conteúdo dos escritos, que sofreram a condenação ao Index pelo Papa Pio XII, é bastante problemático.
 
Embora não haja erros nas orações propriamente da devoção, a essência da mesma é ruim por ser uma cópia daquela devoção ao Sagrado Coração de Jesus, porém sem um coração, sem a proposta de reparação por nossas faltas, propondo uma misericórdia incondicional de Deus para conosco, independente do pecado.
A devoção proposta pela Irmã Faustina não dá ao católico um espírito penitente, além de ter tido não uma, não duas, mas três condenações, conforme relatamos.
  
Pour défendre la Foi, pour ton amour mourir, ô mon Dieu!
 
Liniker Antonovas.
  
Referências:

https://www.instagram.com/p/CNA3mqcJoT2/?igshid=YmMyMTA2M2Y%3D

https://fatima.org/media/msgr-patrick-perez-on-truth-as-the-basis-for-a-proper-response-to-our-lady-of-fatimas-requests/

https://leaocatolico.blogspot.com/2021/04/divina-misericordia.html?fbclid=IwAR0qrlxYRE7nu3jClgTDA2Hk1bVDEkseTS757a1fbVg3_yRgMDP9ANq-Sag&m=1

https://www.traditioninaction.org/HotTopics/f072_DivMercy.ht

https://www.saiamodesta.com.br/texto/163

https://www.facebook.com/FSSPX.Portugal/posts/1872887239507957/

https://www.vatican.va/archive/aas/documents/AAS-51-1959-ocr.pdf

https://cleofas.com.br/revelacoes-privadas-criterios-de-discernimento/

http://rainhaddosmartires.blogspot.com/2013/07/irma-faustina-kowalski-e-imagem-de-sua.html

https://www.google.com.br/amp/s/etnoscredidimvscaritati.wordpress.com/2015/06/20/a-condenada-devocao-a-divina-misericordia-da-irma-faustina/amp/


    Para citar este texto:
"O problemático Diário da Irmã Maria Faustina Kowalska e suas devoções"
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/bra/veritas/igreja/faustina/
Online, 29/03/2024 às 12:34:17h