Religião-Filosofia-História



X - Eclesiologia Gnóstica e Ecumenismo Radical

 

X -1. Indiferentismo religioso dos "tradicionalistas"

Vimos que os que se auto intitulam seguidores da "Philosophia perennis", os tradicionalistas esotéricos, colocam as religiões instituídas em plano secundário com relação ao que eles chamam de "Tradição Primeva", que, como vimos, é a velha Gnose de sempre.

Assim como a Gnose, esse desprezo pela Igreja, e pelas religiões em geral, não é novo na História.

Leszek Kolakowski estudou profundamente esse fenômeno da Ecclesia Spiritualis em seu livro Chrétiens sans Église.

Nessa obra, ele analisa - e critica --a classificação feita por J. Lindeboom na obra Les Bâtards du Christianisme (1929) com base no individualismo religioso.

Lindeboom distingue três tipos de individualistas religiosos:

1) os individualistas intelectuais, como os "discípulos de Boehme, os que procuram a sabedoria hermética secreta, todos aqueles para os quais os valores cognitivos são o essencial na religião, ainda que a eles acedam por fantasias especulativas - [e Olavo está inteirinho neste caso] --; eles são os herdeiros da gnose dos primeiros cristãos e têm os maniqueus em sua árvore genealógica"

(Leszek Kolakowski, Chrétiens sans Église, Gallimard, Paris, 1965, p.18).

Certamente você notou - não é Felipe? - que Kolakowski também não faz nenhuma distinção entre a Gnose dos primeiros séculos do cristianismo e a Gnose posterior.

2) os individualistas místicos indiferentes às formas visíveis da vida religiosa, preferindo a experiência direta com o divino;

3) os socialistas que se preocupam mais em restaurar o que chamam de "comunismo primitivo"

Os três tipos desprezam o pertencer a uma Igreja instituída, dizendo-se cristãos sem Igreja

Kolakowski considera que essa classificação de Lindeboom não é boa

Para ele, o subjetivismo religioso é o critério que permite compreender melhor o desprezo dos reformadores pelas Igrejas instituídas:

"Não é, aliás, difícil notar que uma tal atitude, desde que ela chegue a uma forma completa e absolutamente consistente, conduz quase inelutavelmente à idéia da supressão completa das Igrejas existentes sob forma visível. A tendência a uma interiorização total da religião, a uma inclusão de todas os valores da vida religiosa na consciência individual, na personalidade vivida pelo fiel, deve obrigatoriamente conduzir à idéia de uma religião compreendida como fenômeno puramente moral, limitada a cada consciência humana tomada isoladamente. A religião enquanto instituição organizada se torna inútil então."(L. Kolakowski, op. cit. p. 29).

De todo modo, cremos que tanto o critério de Lindeboom como o de Kolakowski ajudam a compreender o problema da Gnose com relação às Igrejas instituídas.

Para a Gnose, tudo o que tem relação com o mundo material produzido pelo Demiurgo é mau. Desse modo, os gnósticos não aceitam as instituições existentes neste mundo, nem, muito menos, a Igreja instituída por Cristo sobre Pedro.

A heresia gnóstica pretende que a Igreja deve ser inteiramente espiritual. Ela seria constituída apenas por aqueles homens que alcançaram a união com a Divindade através do Conhecimento salvador, não importando a que religião instituída pertençam eles. A Igreja seria então invisível, ou puramente espiritual. Ecclesia Spiritualis, como diziam os hereges de todas as épocas.

 

X - 2. Características da Ecclesia Spiritualis Gnóstica

A Ecclesia Spiritualis da Gnose teria as seguintes notas:

 

1a- Igreja pobre

A Igreja não poderia ter nada de material. Ela não poderia possuir nenhuma propriedade, nenhuma riqueza, pois toda propriedade ou riqueza são coisas materiais, e a matéria, produzida pelo Demiurgo mau, é sempre má, segundo eles.

Nesse item se classificam os cátaros, os espirituais franciscanos, os Dolcinianos, os Irmãos do Livre Espírito, os Gibelinos, e, modernamente, os socialistas ditos cristãos, como Dom Casaldáliga, Frei Betto, e o ex frei Boff, assim como os "miserabilistas" do famoso Pacto das Catacumbas.

Foram esses "socialistas cristãos", condenados por Pio XI na encíclica Quadragésimo anno, os pouco inocentes e muito úteis aliados de todas as ações marxistas nos últimos tempos, desde a propaganda na mídia, até a guerrilha.

 

2a- Igreja Igualitária

A Igreja gnóstica não admite hierarquia. Todos os homens teriam em si a partícula divina que os faz potencialmente divinizáveis. Portanto, todos os que chegam à "realização da unidade" com a Divindade, através do Conhecimento Libertador, são absolutamente iguais entre si. Não poderia haver qualquer desigualdade na Igreja dos divinizados. Quando eles fazem distinções são elas apenas designativas das etapas, ou graus, do processo de divinização em que os gnósticos se encontram.

Desse princípio igualitário decorre o desprezo dos gnósticos pela Hierarquia eclesiástica, que, para eles, seria uma simples burocracia.

 

3a- Igreja sem dogmas

A Igreja Espiritual não admite dogmas, que seriam fórmulas racionalizadas e petrificadas da revelação. A Revelação seria dada a cada homem, interiormente, por meio de uma experiência intuitiva, que comunicaria ao indivíduo o Conhecimento salvador, absoluto, inefável e incomunicável, isto é, a Gnose.

Os homens, ao pretenderem traduzir essa revelação interior em palavras, sempre a deturpariam, porque a palavra humana é essencialmente incapaz de descrever o inefável, de "desenhar o invisível". Daí todos os credos serem inúteis e, mais ainda, nocivos. Daí, todos os dogmas serem incompletos e prejudiciais, enquanto se põem como verdades eternas petrificadas.

A verdade plena seria impossível de ser alcançada, e, por isso, nenhuma Igreja pode se arrogar o monopólio da verdade.

Como você bem percebe, essa idéia é a que foi defendida pelos hereges modernistas, no princípio do século XX, e que hoje ainda é propugnada por seus herdeiros progressistas.

 

4a- Igreja Ecumênica

Se os dogmas são incapazes de exprimir a verdade, e por isso são até prejudiciais, não interessa em nada a fé, a crença de cada religião. Todos os que alcançaram o Conhecimento Libertador, qualquer que seja a sua religião positiva, são membros de uma Igreja invisível, sem estruturas e sem dogmas: a Igreja do Amor. Com efeito, se a fé e a crença são secundárias, só importa o que se faz, não o que se crê. A Fé seria coisa de teólogos raciocinadores. O que vale é a intuição e a boa vontade. A única Igreja Espiritual seria uma espécie de federação de todas as religiões numa super religião - talvez presidida pelo Papa - e reunindo todos os Homens de Boa Vontade.

Muito atual isso, não é, Felipe?

E muito olaviano, já que Olavo se proclama "ecumênico radical"...

 

5a- Igreja antinomista ou anti naturalmente ascética.

A Ecclesia Spiritualis da Gnose considerando que toda a lei foi imposta pelo Demiurgo mau, recusa a obediência aos mandamentos. Os dez mandamentos seriam regrazinhas sem importância. Ensina-se, como fez Lutero, e como faz Frei Betto em seu Catecismo Popular, diretamente o antinomismo, que Cristo condenou no Sermão da Montanha: "Não julgueis que eu vim abolir a lei ou os profetas; não os vim destruir, mas sim para os cumprir (...) Aquele, pois, que violar um destes mandamentos mais pequenos, e ensinar assim aos homens, será considerado o menor no Reino de Deus"(Mt. V, 17 e 19).

Olavo faz o mesmo, na sua já citada aula: Crítica e Conselhos à Igreja Católica (Bloco 8), debocha das regrazinhas morais, e desvaloriza especialmente o nono mandamento.

Ou então se prega um ascetismo anti natural, que leva os sectários ao desespero moral, e, por reação, de novo, ao antinomismo. É o que faziam os gnósticos Irmãos do Livre Espírito, por exemplo.

 

X - 3. A Concepção de Igreja em Guénon e Olavo

Vejamos então o que pensam Guénon e Olavo disto tudo.

Já citei esses textos na carta Silêncio Inteiro. Repito-os, agora, para facilitar a sua lembrança, sem você precisar consultar diretamente minha carta anterior.

Para Guénon "... o verdadeiro Esoterismo é outra coisa diferente da religião exterior, e que, se tem algumas relações com esta, só pode ser enquanto encontra nas formas religiosas um modo de expressão simbólico; pouco importa, aliás, que estas formas sejam as desta ou daquela religião, visto que se trata da unidade doutrinal essencial que se dissimula atrás da sua aparente diversidade. É essa a razão pela qual os antigos iniciados participavam indistintamente em todos os cultos exteriores, segundo os costumes estabelecidos nos diversos países onde se encontravam; é também porque ele via essa unidade fundamental, e não devido a um "sincretismo" superficial, que Dante utilizou indiferentemente, segundo os casos, uma linguagem própria do Cristianismo ou da Antigüidade greco-romana. A Metafísica pura não é pagã, nem cristã, é universal" (René Guénon, "O Esoterismo de Dante", Editorial Vega, Lisboa, 1978, p. 17.O negrito é meu).

Em minha carta "Silêncio Inteiro", citei o seguinte texto de Olavo numa entrevista:

"Eu sou ecumênico radical: católico- protestante- islâmico - judaico- budista- hinduísta. Eu acredito que essas religiões têm todas um núcleo de verdade metafísica que é eterno, revelado, que o ser humano não poderia ter inventado"(Olavo de Carvalho, A Miséria do Materialismo, entrevista à revista República, Ano IV, n* 40, fevereiro de 2000, p. 96).

Conforme Olavo - e nisso também ele faz eco ao que disse Guénon - haveria um núcleo comum a todas as religiões o qual permitiria reuní-las num ecumenismo mais profundo que o do Vaticano II.

Que seria esta núcleo comum?

O mesmo Olavo, em Fronteiras da Tradição, diz que esse núcleo comum é a "Tradição universal e primordial", à qual se chega por meio do esoterismo (Olavo de Carvalho, Fronteiras da Tradição, pp. 11-12)

Citei também que Olavo chama esse núcleo comum de todas as religiões-- pouco importa qual - de Sabedoria e de Gnose:

"... os primeiros princípios são conhecidos por um método próprio, que é o método da sabedoria ou Gnose" (Olavo de Carvalho, Astrologia e Religião, ed. Nova Stella, coleção Eixo, São Paulo, 1986, p. 24).

E ainda:

"Usa-se às vezes para nomeá-lo o termo gnose, mas esta palavra serve também para designar - de modo mais genérico e sem qualquer relação com a resistência greco - romana ao cristianismo - o elemento intelectivo e cognoscitivo de qualquer tradição religiosa e espiritual, cristã inclusive. Fala-se neste sentido numa gnose islâmica, budista, etc. e também de uma gnose cristã (por exemplo, em Clemente de Alexandria), que rigorosamente nada têm a ver com o fenômeno particular que estou estudando aqui, o qual por isto prefiro designar com o termo diferencial gnosticismo" (Olavo de Carvalho, O Jardim das Aflições, pp. 247-248, nota 127).

No Texto-Confissão de Olavo citado como epígrafe desta carta, Olavo afirma que a Gnose está acima das fés e crenças.

Essa superioridade seria tal que Olavo escreveu:

"Para algumas pessoas, buscar a sabedoria eliminaria a fé, o mistério. Mas a fé não tem importância nenhuma, isso é negócio kantiano, é tudo bobagem" (Olavo de Carvalho, Aula do Seminário de Filosofia de Olavo de Carvalho, 6 de Junho de 1998, Bloco 8, p. 21 da Apostila existente no site de Olavo de Carvalho, sem revisão do autor in"http://www.olavodecarvalho.org/forum/Forum17/HTLM./000053-2.html").

Tal como a Gnose dos Modernistas, Olavo afirma que a revelação divina em todas as religiões, é a mesma, embora "traduzida" em crenças diferentes, porque a Divindade é inefável. Embora seja uma só voz a que Se revela, os homens a traduzem em dogmas diversos, dando origem a credos e fés diferentes pela impossibilidade de manifestar o inefável:

"As religiões não falam da mesma coisa. É preciso ter compreendido isto para atinar que é a mesma Voz que fala por meio de todas elas" (Olavo de Carvalho, artigo Lembrete de Natal, in O Globo, 23 - XII- 2.000).

Você vê claramente, então, inesgotavelmente paciente Felipe, como todos esses textos se esclarecem mutuamente, tornando nítido que, para Olavo o que importa é a "Sabedoria" - a Gnose - que constitui o núcleo de todas as religiões, não importando a fé que elas pregam.

É esse núcleo comum que permitiria o ecumenismo radical de Olavo de Carvalho, que ultrapassa o ecumenismo do Vaticano II.

Se a Fé e as crenças não têm valor maior, o ecumenismo se torna facílimo de ser radicalmente realizado.

Numa entrevista à rádio Europa Livre, perguntou-se a Olavo:

"Você acha que é bom existir uma crença religiosa sem Igreja?"

Respondeu Olavo:

"Certamente. O alto clero mentiu muito aos fiéis no século XX e eles têm o direito de guardar uma certa distância da Igreja, certamente sem renegá-la, mas num espírito de espera prudente até que Deus se digne de lhes dar novas luzes."

(Olavo de Carvalho, Deus acredita em você? Entrevista à Rádio Europa Livre, repórter Cristina Poienaru, Bucarest, 21 de outubro de 1.998, p. 1).

Apesar de ligeira ressalva, Olavo diz explicitamente que poderia ser possível ser cristão sem ter Igreja, que é a tese herética da Igreja espiritual defendida pelas seitas gnósticas.

Boff e Betto estão unidos a Olavo, nesse ecumenismo.

Por outro lado, Olavo distingue a Igreja enquanto burocracia, e a Igreja enquanto reunião dos cristãos, mesmo com crenças divergentes, visto que "... a fé não tem importância nenhuma, isso é negócio kantiano, é tudo bobagem" (Olavo de Carvalho, Aula do Seminário de Filosofia de Olavo de Carvalho, 6 de Junho de 1998, Bloco 8, p. 21 da Apostila existente no site de Olavo de Carvalho, sem revisão do autor

in"http://www.olavodecarvalho.org/forum/Forum17/HTLM./000053-2.html").

"A partir daí algo aconteceu e quando se fala em Igreja, pode-se falar em dois sentidos: a Igreja no sentido Vaticano, uma organização centralizada, no registro civil, etc... e por outro lado, Igreja como conjunto de cristãos que inclui os protestantes, ortodoxos, etc. etc. ë claro que a Igreja neste último sentido está com a verdade, mas só neste último sentido. E no outro sentido? Os caras piraram já há muito tempo!" (Olavo de Carvalho, Crítica e Conselhos à Igreja Católica, Aula do Seminário de Filosofia Olavo de Carvalho, junho de 1998, Bloco 8, p. 24).

Pode haver maior desprezo pela Igreja, enquanto Instituição? E pode haver posicionamento mais claro de desprezo pela fé e pela ortodoxia?

 

XI - Conclusão

Eis-me chegado ao fim. Graças a Deus, que não mais agüentava ler os textos de Guénon - que são monótonos-- e, pior ainda, os de Olavo, que ademais são empoladamente chatos.

Ao ler os brumosos, obscuros e vagos textos desse "filósofo" auto didata, e suas páginas teológicas tipo "caruru", me vinham à mente uns versos de Dante, proferidos na Divina Comédia, quando ele fixa o olhar nas espessas trevas de certo círculo infernal:

"Oscura e profonda era e nebulosa,
tanto che, per ficar lo viso a fondo
io non vi discernea alcuna cosa"... [proveitosa].

(Dante Alighieri, Divina Commedia, Inferno, IV, 10-12).

As obras de Olavo de Carvalho me lembram o que disse Talleyrand da cabeça de Siéyès, que alguém elogiava como "profunda": "Profunda... mas vazia", retorquiu o "Príncipe" de Benevento.

O chiste de Talleyrand não cabe bem à "Filosoia" de Olavo, visto que confusa não quer dizer profunda.

Além disso a literatura de Olavo é vazia de qualquer conteúdo sério. Mesmo a sua Gnose é astrologicamente mal alinhavada. Olavo é apenas um eco da Gnose "Tradicionalista" da escola guénoniana. Praticamente tudo o que ele diz se encontra em Guénon, em Schuon, ou em qualquer outro dos membros dessa escola gnóstica

Pobre Olavo que, depois de um misterioso eclipse, quis passar de astrólogo a filósofo, e até mesmo a "teólogo"!

Não é fácil subir das estrelas para o céu de Deus, dos anjos e dos santos! Pelo "Conhecimento" - pela Gnose - isso é impossível.

Agora, só me restará fazer uma pequena biografia de René Guénon, para enterrar esse assunto de vez. Eu a farei, no futuro, apenas para informar melhor os que, tendo ouvido e lido Olavo de Carvalho, ignoram, de fato, quem foi Guénon, do qual Olavo escreveu uma biografiazinha pífia, omitindo coisas bem importantes e bem esotéricas, numa revista tipo gibi.

Mas, ainda vai demorar um tanto para que eu comece a redigir essa biografia. Mereço umas férias. Chega de esoterismo gnóstico. Por um mês, pelo menos.

Certamente, Olavo dirá que escrevi uma carta demasiado longa. Entretanto, ele mesmo comentou, certa feita, que o erro grave pode ser breve, ser dito numa frase bem curta, e, para refutá-lo, serão necessárias muitas páginas.

Como, então, poderá ele reclamar de minha prolixidade, se ele foi quem difundiu erros numerosos, e bem graves, em muitos livros e artigos?

Para refutá-los, foi-me necessária esta "lettre fleuve", que levei quase dois meses redigindo. O que é bem menos que a eternidade que Olavo me concedera.

De tudo isso que lhe escrevi, nesta carta verdadeiramente "amazônica", que concluir?

A conclusão é óbvia. Ela resulta quase de cada citação. E resulta, mais ainda, do sistema formado por esse conjunto de citações, todas elas se apoiando umas às outras: tanto René Guénon quanto Olavo de Carvalho são gnósticos.

Guénon, mais elaboradamente, é um gnóstico de tipo romântico, que mistura hinduísmo, taoísmo e sufismo.

Olavo de Carvalho, muito mais limitado, e, politicamente mais oportunista, junta guénonismo, astrologia e sufismo, tudo numa miscelânea, que como já disse, parece um caruru mal feito.

Guénon ensina a Gnose com um estilo cansativo, é verdade, mas que tem certa elegância. E ele nunca baixa a grosserias. Estas são comuns em Olavo, chegando mesmo à brutalidade. O que é lamentável.

Olavo até me pareceu inteligente e hábil, e mesmo, por vezes, ter uma certa verve. Mas há algo nele - que se reflete em seus textos - estranhamente confuso. Por vezes, ele é tão pouco claro, tão inseguro em sua terminologia, que ele mesmo perde o pé, escrevendo textos que raiam pelo caótico, e sem unidade. É como se ele perdesse o rumo, quando escreve...

Nota-se ainda, nos escritos de Olavo, um conhecimento apressadamente lido, bastante mal digerido, sofregamente assumido, sem muito cuidado, nem exame.

Talvez a sofreguidão do jornalista, que precisa escrever o artigo para a "próxima edição", e não tem tempo de verificar suas citações, o tenha afetado, porque, citando de memória ou por ouvir dizer, comete erros primários. Como o que analisei a respeito de um verso de Dante, que ele comenta erradamente, quando seria bem fácil evitar o erro. Bastaria uma consulta ao texto de Dante. A pressa e o descuido, por auto confiança excessiva, o perderam.

Lendo os livros e artigos dele, lembrei-me da frase jocosa de um jornalista sagaz - Antonio Carlos Fon --, ao me entrevistar, anos atrás:

"Jornalista é um homem que sabe tudo de nada, e nada sobre tudo".

Evidentemente era uma brincadeira, porque jornalistas os há, de grande saber e cultura.

Mas, em Olavo, o talento, que ele inegavelmente tem, é perturbado por um acúmulo de informações mal concatenadas, defeito comum em auto didatas.

Esse auto-didatismo parece gerar nele, no fundo, uma grande insegurança, que ele procura mascarar de duas maneiras :

Fazendo afirmações, sem base, camufladas com aparente firmeza e afetando uma tal "segurança", que leva seus leitores ou ouvintes mais desavisados, a crer no que ele diz, sem examinar, nem conferir suas afirmações. São os "chutes" que ele dá, simulando uma segurança fria, imitadora da certeza absoluta, que ele não tem. É o caso que vimos do verso de Dante, que, ao que parece, ele cita sem ter, nem lido o canto da Divina Comédia em que o verso se localiza. Esse caso é típico. Olavo, muitas vezes, cita de "ouvido"...

2) Usando de uma violência brutal contra os que ousam contestá-lo. Ele busca intimidar, afim de que não se lhe sejam exigidas provas de suas afirmações gratuitas e sem base.

E depois... Digamos que ele não é muito... respeitoso.

Quer se impor no grito, na ofensa, na injúria, e pela ameaça.

Nesse ritmo, não, meu caro.

Ainda que violentando a métrica por amor da verdade, parodiando Corneille, eu lhe diria:

"Souffrez, que je ne l’ aprouve, ni ne l’ imite pas".

Sobretudo não o imitarei, descendo ao terreno pessoal, e muito menos, no tom grosseiro que ele emprega.

Sequer quero aludir ao que outros inimigos pessoais dele, ultimamente, têm publicado. Não é nem elevado, nem digno, fazer isso.

Non raggionam di loro...

Escutemos - anotemos - e passemos.

Não fui eu quem provocou essa polêmica. Foi Olavo quem se apresentou inicialmente me elogiando, depois, me atacando, e, a seguir, ainda, me injuriando.

Visei tão somente demonstrar que Guénon - e Olavo - são gnósticos. Preocupei-me apenas com a doutrina. Olavo pode se dizer o que bem entender: Astrólogo aposentado, ou até "filósofo" auto nomeado. Católico ele não é. Olavo é gnóstico.

Ele se mostrou preocupado em defender três coisas: Guénon, o seu próprio prestígio pessoal, e a doutrina de ambos, que é a Gnose.

Eu defendo a doutrina da Igreja Católica Apostólica Romana, e quis ajudar moços confundidos por uma "tradição" esotérica enganadora.

Espanta constatar como "indivíduos" gnósticos, defensores de um ecumenismo radical, mantenham "links" com "capelas" tradicionalistas, que se dizem anti ecumênicas, e com a benção de quem coloca como prior-idade sua raivinha pessoal, acima mesmo da defesa da fé.

Sejamos, uma vez, "obscuros": parece, essa, uma triste coligação de sufismo com surfismo, só porque é verdade que os astros influem nas ondas e nas marés...

Deixemos...

"Non raggionam di loro, ma guarda e passa"

(Dante, Divina Commedia, Inferno, III, 51).

Preocupei-me em dizer que o errado é errado, e que o mal é mal.

O mais não me interessa.

E, meu caro Felipe, se sofremos injúrias por defender a Fé, seremos bem aventurados, porque, se nosso Mestre, Cristo, foi injuriado e crucificado, como poderíamos esperar coisa diversa para nós?

Se Olavo ousou, blasfemamente, comparar a Virgem Maria a Maomé como se ambos tivessem sido portadores do Verbo (Cfr. Olavo de Carvalho, Críticas à Igreja Católica, Bloco 8, já citada), como poderíamos ser respeitados por ele?

Pelo contrário, é grande honra ser injuriado por defender a Igreja e sua doutrina sacrossanta.

"Amor mi mosse che mi fè parlare" (Dante, Divina Commedia, Inferno, II 72).

Por isso, meu caro Felipe, se você também foi injuriado por defender a Nosso Senhor, siga o conselho que há nestes versos que Dante colocou na boca de Virgílio:

"Vien dietro a me, e lascia dir le genti:
sta come torre ferma che non crolla
già mai la cima per soffiar dei venti";

(Dante, Divina Commedia, Purgatorio. V, 13-15).

Deixe-me finalizar. despedindo-me, com as palavras com que a doce Santa Catarina de Siena terminava suas cartas:

"E più non dico... E più non rispondo...
Gesù dolce. Gesu amore"

Que a verdade de Cristo nos una...

...in Corde Jesu, semper, et semper, Orlando Fedeli.

São Paulo, na festa de Nossa Senhora Rainha., 31 de Maio de 2.001.

 

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    Para citar este texto:
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MONTFORT Associação Cultural
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Online, 29/03/2024 às 10:19:05h