Igreja

Algumas provas de que o Vaticano II é discutível e criticável

Dois artigos de nosso colaborador Eder Silva estavam prontos para ser publicados, atendendo ao convite - agora indulgenciado - de nosso Papa Bento XVI de voltar ao estudo do Concílio Vaticano II, quando este mesmo dá novas linhas de interpretação ao evento conciliar, no contexto da Abertura do Ano da Fé. Longe de invalidar o que ele mesmo propusera antes, como mostra Eder neste artigo e no próximo que publicaremos, os últimos pronunciamentos do Papa avançam na linha segura de restabelecimento da verdadeira fé da Igreja.

Eder Silva 

“... sabe-se que ele [o Vaticano II] evitou dar solenes definições dogmáticas envolventes da infalibilidade do Magistério Eclesiástico” (Papa Paulo VI, 12 de janeiro de 1966).

Embora todas as evidências indiquem a possibilidade de discussão e crítica aos textos pastorais do Vaticano II, aparecem certos morcegos de internet que, voando sem rumo, persistem em propalar a lendária infalibilidade veementemente atribuída a um Concílio que teve a explícita intenção de ser meramente pastoral, colocando seu “Magistério Autêntico” em nível de democrático diálogo com o povo de Deus.

Não pretendemos fazer um minucioso estudo teológico, provando que os documentos do Vaticano II podem ser discutidos. Neste artigo, focaremos apenas alguns atos significativos do Pontificado do Papa Bento XVI, demonstrando que, por esses atos, o próprio Papa vaticinou o que sempre defendemos em nosso apostolado: que o Concílio Vaticano II pode ser questionado e criticado nos pontos em que se afastou da verdade católica.

O primeiro e mais significativo ato do Papa contra o “inquestionável” Vaticano II, resultou da inesperada fundação do Instituto do Bom Pastor, cuja finalidade se manifestou em dois privilégios que lhe foram outorgados:

1)    Celebrar unicamente a Missa segundo o rito antigo.

2)    Fazer uma crítica construtiva aos textos do Vaticano II

A propósito deste artigo, nos interessa apenas o segundo item sobre a “crítica construtiva”.

Essa possibilidade publicamente reconhecida pelo Romano Pontífice, comprova o que o Papa Bento XVI havia afirmando ainda em sua condição de Cardeal:

“A verdade é que o próprio Concílio não definiu nenhum dogma e conscientemente quis expressar-se em um nível muito mais modesto, meramente como Concílio pastoral...” (Cardeal Joseph Ratzinger, Alocução aos Bispos do Chile, em 13 de Julho de1988, in Comunhão e Libertação, Cl, año IV, Nº 24, 1988, p. 56).

Tanto por essa declaração, como pelo posterior reconhecimento pontifício da licitude das críticas ao Vaticano II, podemos descartar o sofisma modernista que sempre pretendeu equiparar a autoridade desse Concílio pastoral, com a infalível autoridade do Concílio de Trento e do Vaticano I. Ora, se realmente o Vaticano II tivesse uma autoridade infalível, jamais poderia ser discutido e muito menos criticado em suas prescrições. Contudo, a soberana cabeça visível da Igreja silenciou a tirania modernista provando que é sim permitido contestar e criticar os textos conciliares.

Entretanto, alguns morcegos desesperados, preocupados com a frágil autoridade do Vaticano II, recorreram à velha artimanha protestante de distorcer os textos até “encontrar” uma suposta via salvadora. Alegaram que o direito de crítica concedido não diz respeito ao conteúdo dos documentos conciliares, mas tão somente às más interpretações, propondo assim uma verdadeira hermenêutica de continuidade com a doutrina tradicional.

Essa falácia é desmentida pelo próprio superior do Instituto em seu primeiro sermão público:

“Quero dizer com essas palavras que tudo o que há de ambíguo, e até de falso [no Vaticano II] deve ser restabelecido por nós, tendo em vista dar por fim uma autêntica interpretação desse Concílio. O que supõe de outro lado que essa interpretação não existe totalmente ainda, e vou dar alguns exemplos: a liberdade religiosa fez escorrer muita tinta, vós o sabeis, e efetivamente, há coisas aparentemente e TEXTUALMENTE CONTRADITÓRIAS com o Magistério precedente” (Primeiro sermão do Pe. Laguérie como Superior do Instituto do Bom Pastor).

A crítica é insofismável. O superior do IBP afirma de modo público e enfático que existem nos documentos do Concílio coisas textualmente contraditórias, ou seja, existem contradições no ensino do Vaticano II.

Em entrevista concedida a Folha de São Paulo, ao ser perguntado sobre as diferenças entre os dois ritos, Padre Laguérie, exercendo a função crítica do IBP, explicitou os pontos negativos do Novus Ordo Missae:

“Há muita, muita, muita diferença. Em primeiro lugar, na missa antiga, todos rezam voltados para Deus e voltados para o Oriente, onde nasce o sol, que simboliza a luz de Cristo e o surgimento da verdade. Somente na explicação do Evangelho, nas leituras e no sermão, o padre se volta para o povo, pois está se dirigindo a ele. Na missa nova, o padre reza sempre voltado para o povo. A segunda diferença é a língua sagrada, o latim. Nós não nos dirigimos a Deus na mesma língua que usamos nas compras, nos negócios, no dia-a-dia. Sempre houve na igreja, mesmo no Oriente, uma língua sagrada para falar com Deus. Na Síria, rezava-se a missa em aramaico; na Judéia, rezava-se a missa em siríaco. Em terceiro lugar, os próprios textos da missa são diferentes: na missa nova não se fala mais do sacrifício nem do pecado nem da vida eterna nem da redenção”.

Comentando um documento da Congregação para a Doutrina da Fé relativo a alguns aspectos da doutrina sobre a Igreja, Pe. Laguérie reafirmou a missão de seu Instituto de crítica ao Vaticano II, voltando a acusar erros nos próprios textos do Concílio.

Após fazer a ressalva de que esse documento da Congregação, embora ratificado pelo Papa, não se insere na lista de documentos infalíveis e nem manifesta a vontade de definir e obrigar, Padre Laguérie afirmou:

“Esse grande princípio de hermenêutica vai ficar portanto para o que vier depois: é à luz do Magistério anterior e portanto da Tradição da Igreja que deverão ser levantadas todas as dificuldades, contradições e equívocos devidos, no próprio texto, ao mau espírito do Concílio. Pois no fim das contas, vai ficar para sempre esse escândalo histórico de que foi necessário, 40 anos mais tarde, toda a autoridade de um Pontífice luminoso para eliminar uma a uma todas as armadilhas de uma “anfibologia” quase institucional.    O Papa cita em referência as inumeráveis questões dos padres do Concílio” (Pe. Laguérie comenta o documento da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, de 29/06/2007).

Nessas palavras fica patente a Missão do IBP de crítica pública ao Concílio e com autorização do Papa!

Para evidenciar com mais força a falibilidade e a discutível autoridade do Magistério exercido no Vaticano II, o Papa Bento XVI autorizou discussões entre Roma e os clérigos da FSSPX sobre os escritos pastorais conciliares. O Papa simplesmente colocou o Vaticano IIem discussão. Portanto, sob a égide papal, podemos dizer seguramente que o Vaticano II pode ser discutido e criticado sem que isso acarrete pecado de desobediência ao Magistério da Igreja.

Os morcegos de internet que pretendem nos obrigar a digerir cegamente e docilmente o Vaticano II, como se fosse uma autoridade inquestionável, deveriam fazer uma profunda reflexão sobre esses esplêndidos atos do Papa Bento XVI que, tomados em seu conjunto ou mesmo isoladamente, derrubam a ilusão modernista de um Super-Concílio Infalível e incriticável.

Fieis ao Papa Bento XVI, prosseguimos em nossa aberta crítica aos pontos contraditórios do Concílio Ecumênico Vaticano II.

In Corde Jesu, semper

Eder Silva

   

    Para citar este texto:
"Algumas provas de que o Vaticano II é discutível e criticável"
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/bra/veritas/igreja/algumas-provas-de-que-o-vaticano-ii-e-discutivel-e-criticavel/
Online, 28/03/2024 às 16:33:59h