Igreja

Cem anos de Pascendi
Montfort
No último dia 8 de Setembro a encíclica Pascendi Domini Gregis de São Pio X completou cem anos. Não poderíamos deixar passar essa data tão significativa sem ao menos fazer um breve comentário sobre esse importante e atualíssimo documento, que marcou profundamente a ofensiva da Igreja contra o modernismo, a “síntese de todas as heresias”. 
Como dissemos, esse tema é atualíssimo e extremamente relevante para a Igreja, pois o modernismo, ao contrário de ter fenecido, continua mais vivo do que nunca, como reconheceu o insuspeito Jean Guitton, amigo de Paulo VI (“Anotações "esquecidas" VII: O Concílio Vaticano II e o Modernismo: parecer de Jean Guitton). 
Juntamente com o Decreto Lamentabili e o juramento anti-modernista (que integra o motu proprio Sacrorum Antistitum), a Encíclica Pascendi revelou ao mundo a gestação de uma heresia secreta que visava a destruição da religião Católica, pela destruição de seus princípios mais fundamentais, e que se articulava de forma aparentemente não conexa: 

“E visto que os modernistas (tal é o nome com que vulgarmente e com razão são chamados) com astuciosíssimo engano costumam apresentar suas doutrinas não coordenadas e juntas como um todo, mas dispersas e como separadas umas das outras, afim de serem tidos por duvidosos e incertos, ao passo que de fato estão firmes e constantes...”
(Encíclica Pascendi Dominici Gregis)
 
E essa revelação – a de que o modernismo era um movimento organizado para destruir a Igreja – foi uma das grandes contribuições da Pascendi.          
A outra grande contribuição da encíclica foi a revelação da doutrina modernista, que, pelo menos ao grande público, não se apresentava como o conjunto coeso e logicamente ordenado que São Pio X apresentou, e que resumimos brevemente a seguir, seguindo o modelo da encíclica. 
O modernismo explora os diversos ramos do conhecimento humano para produzir o sistema modernista. Assim, o filósofo fornecia as bases metafísicas que o teólogo, o crente e o historiador aproveitariam no desenvolvimento de suas disciplinas. E que o apologeta e o reformador fariam difundir nos meios católicos, para transformar a religião, hierárquica e baseada na revelação exterior, e exposta de acordo com a linguagem escolástica, em uma religião imanentista e democrática, exposta em linguagem moderna, fenomenológica. Os textos entre aspas e em itálico são da Pascendi e os negritos são nossos, exceto quando constar outra referência. 
De acordo com a encíclica, o modernista filósofo professa a princípio um agnosticismo completo, que o leva à rejeição da “teologia natural, dos motivos de credibilidade, da revelação externa”, base da religião cristã. Por conseqüência lógica, esse agnosticismo se transforma em ateísmo científico, negador de Deus e das verdades acerca “de Cristo, dos mistérios e da sua vida e morte, da sua ressurreição e ascensão ao céu.”  
Além do agnosticismo e sua negação da Revelação, o filósofo se apóia no imanentismo para explicar sua religião. O imanentismo é a afirmação que Deus se manifesta no interior de cada homem através de uma experiência sensível, subconsciente, inefável e necessária. A fé seria um sentimento da manifestação divina no homem, que, ao mesmo tempo, é a revelação: 

“O sentimento religioso, que por imanência vital surge dos esconderijos da subconsciência, é pois o gérmen de toda a religião (...) Temos, pois, assim a origem de toda a religião, até mesmo da sobrenatural; e estas não passam de meras explicações do sentimento religioso. ”
 
As fórmulas religiosas e dogmas seriam apenas a exteriorização em palavras do sentimento religioso. Portanto, aqueles seriam não só imperfeitos, pois as palavras não conseguiriam reproduzir perfeitamente a experiência inefável, mas também sujeitos à evolução constante, dado que cada fiel produz uma experiência diversa e, portanto, fórmulas religiosas diversas. Para o modernista, uma religião baseada em dogmas, que não é aggiornata, é uma religião morta. 
O filósofo constata que o fundamento da religião é o sentimento, a experiência interior. Mas é o modernista crente que se coloca nas condições morais para viver essa experiência que, por ser pessoal, não conhece fronteiras de religião: 

“Ora, tal experiência é a que faz própria e verdadeiramente crente a todo aquele que a conseguir. — Quanto vai dessa à doutrina católica!”
 
 
 
Quanto ao sentimento e à experiência, tão difundidos hoje nos movimentos, carismas e pastorais “católicas”, o Papa é enfático em sua crítica: 

“O sentimento corresponde sempre à ação de um objeto, que é proposto pela inteligência ou pelos sentidos. Excluí a inteligência, e o homem seguirá mais arrebatadamente os sentidos pelos quais é já arrastado. Além de que, quaisquer que sejam as fantasias de um sentimento religioso, não podem elas vencer o senso comum; ora, o senso comum nos ensina que toda a perturbação ou preocupação do espírito, longe de ajudar, impede a investigação da verdade (queremos dizer da verdade em si mesma); (...) Recorrem outrossim e com afinco à experiência. Mas, que pode ela acrescentar ao sentimento? Nada, por certo; poderá apenas torná-lo mais intenso; e esta intensidade tornará proporcionalmente mais firme a persuasão da verdade do objeto. Estas duas coisas, porém, não farão que o sentimento deixe de ser sentimento, nem lhe mudarão a natureza, sempre sujeita a engano, se não for auxiliada pela inteligência; pelo contrário, confirmarão e reforçarão o sentimento, pois que este, quanto mais intenso for, tanto mais direito terá a ser sentimento.”
 
Assim, o crente modernista é aquele que realiza pessoalmente a religião. Dessa constatação surge a necessidade do ecumenismo, que visa integrar as diversas experiências religiosas, independente do credo, pois este seria apenas a tentativa de explicar a experiência. 
As experiências podem ser transmitidas, seja por tradição seja por meio de algum livro sagrado, com a finalidade de tornar a religião viva, para despertar o sentimento religioso em outros. Essa é essência e a razão de ser das religiões: despertar os outros homens para a experiência interior com Deus, e fazendo isso, manterem-se então legítimas e verdadeiras, porque vivas. 
Verifica-se também no modernismo a repetição da falsa teoria das duas verdades, segundo a qual o filósofo poderia aceitar algo enquanto cientista, e o crente poderia negar a mesma coisa, enquanto fiel, sem que houvesse conflito entre ciência e fé. Isso quando não querem submeter a fé à ciência, invertendo a hierarquia dos conhecimentos humanos. 
Tudo isso São Pio X condena e, en passant, condena também a ambigüidade nos escritos modernistas, tão comum na primavera pós-conciliar em que vivemos: 

“os seus escritos e discursos [dos modernistas] parecem, não raro, sustentar ora uma ora outra doutrina, de modo a facilmente parecerem vagos e incertos. Fazem-no, porém, de caso pensado; isto é, baseados na opinião que sustentam, da mútua separação entre a fé e a ciência. É por isto que nos seus livros muitas coisas se encontram das aceitas pelo católicos; mas, ao virar a página, outras se vêem que pareceriam ditadas por um racionalista. Escrevendo, pois, história, nenhuma menção fazem da divindade de Cristo; ao passo que, pregando nas igrejas, com firmeza a professam. Da mesma sorte, na história não fazem o menor caso dos Padres nem dos Concílios; nas instruções catequéticas, porém, citam-nos com respeito. Distinguem, portanto, outrossim a exegese teológica e pastoral da exegese científica histórica.”
 
O modernista teólogo coloca antes de tudo a ciência acima da fé, e tira as conseqüências do filósofo e do crente. Se o princípio da fé é imanente para o filósofo e Deus é esse princípio para o crente, logo Deus é imanente para o teólogo. 
Deduz também que as coisas divinas da religião o são não porque foram instituídas por Nosso Senhor, mas porque foram transmitidas pelos cristãos a partir da consciência divina de Cristo, caracterizando então o que chama de “permanência divina”. 
O teólogo admite o dogma e a liturgia como sendo necessários apenas à propagação do culto religioso, ao despertar outros fiéis para a experiência interior: 

O dogma nasce da necessidade que o crente experimenta de elaborar o seu pensamento religioso, (...) [os modernistas] Pretendem que o culto resulta de um duplo impulso; (...) O primeiro é dar à religião, alguma coisa de sensível; o segundo é a necessidade de propagá-la, coisa esta que se não poderia realizar sem uma certa forma sensível e sem atos santificantes, que se chamam Sacramentos”
 
A Escritura e a Igreja ficam também reduzidas a expressões exteriores da manifestação coletiva de experiências, tendo uma função puramente utilitarista, para expansão da religião. 
São Pio X explica o que é então a Igreja e a autoridade para o modernista:

Que é, pois, a Igreja? É um parto da consciência coletiva, isto é, da coletividade das consciências individuais que, por virtude da permanência vital, estão todas pendentes do primeiro crente, que para os católicos foi Cristo. (...) Assim como a Igreja emanou da coletividade das consciências, a autoridade emana virtualmente da mesma Igreja. A autoridade, portanto, da mesma sorte que a Igreja, nasce da consciência religiosa, e por esta razão fica dependente da mesma(...) Se, pois, a autoridade da Igreja não quer suscitar e manter uma intestina guerra nas consciências humanas, há também mister curvar-se a formas democráticas; tanto mais que, se o não quiser, a hecatombe será iminente.”
 
Como se vê hoje claramente a conseqüência dessas palavras proféticas!  
O teólogo afirma ainda que a Igreja deveria não só estar separada do Estado mas, assim como a ciência é superior à fé, deveria ainda sujeitar-se ao Estado nas questões temporais. 
Quanto às questões doutrinárias, o Santo Padre fazia uma observação que é atualíssima em relação ao ecumenismo:

“a sociedade religiosa não pode ser uma, sem unidade de consciência nos seus membros e unidade de fórmula. Mas esta dupla unidade requer por assim dizer um entendimento comum, a que compete achar e determinar a fórmula que melhor corresponda à consciência comum; e a esse entendimento convém ainda atribuir a autoridade conveniente, para poder impor à comunidade a fórmula estabelecida. Nesta união e quase fusão da mente designadora de fórmula e da autoridade que a impõe, acham os modernistas o conceito de magistério eclesiástico.”
 
É exatamente esse o pressuposto básico que sustenta o ecumenismo e que norteia as chamadas declarações conjuntas: deve-se buscar uma fórmula comum pois, dizem eles, as declarações doutrinárias não devem ser a expressão do magistério autêntico, que explicita o depositum fidei, mas um amálgama de opiniões diversas que advém das consciências dos fiéis. Isso sem dizer que tal maneira de pensar conduz à evolução do dogma. 
E como não poderia deixar de ser, é na evolução que os modernistas baseavam o desenvolvimento contínuo de sua religião. A evolução se dá através do choque entre forças conservadoras, que são necessárias para manter os limites do progresso, quais sejam a Igreja e a tradição, e forças progressivas, que estão mais “em contato com a vida” e que representam uma “perniciosíssima doutrina que introduz na Igreja o laicato como fator de progresso.”  
O teólogo modernista deseja por fim permanecer dentro da Igreja para transformá-la, para agir como instrumento de mudança da consciência coletiva dos fiéis.  
Nada mais atual. 
O modernista historiador e crítico, seguindo as pegadas do filósofo, perscruta as Escrituras e a história profana em busca do Cristo histórico que, admitido o agnosticismo dos modernistas, é diferente do Cristo da Fé. Os elementos divinos da história são descartados pelo historiador e pelo crítico. 
Mas o historiador modernista também sabe que, num segundo momento,  o que é puramente fenômeno histórico foi transfigurado pela fé, pela consciência coletiva das comunidades religiosas, e elevado acima da natureza. O historiador deve portanto novamente desfigurar esses acréscimos da fé para restituir à história os fatos narrados. 
Assim, não é difícil ver como os milagres são expurgados da Escritura pelo historiador modernista.  
Também, a historicidade e autoria dos livros da Bíblia são completamente desprezados por eles: 

“...não se pode determinar a idade de nenhum documento, senão pela época em que cada necessidade se manifestou na Igreja. (...) Dessa desagregação e da disseminação dos documentos pelo decurso do tempo, segue-se naturalmente que os livros sagrados não podem absolutamente ser atribuídos aos autores de quem trazem o nome. E esta é a razão porque os modernistas não hesitam em afirmar a miúdo que esses livros, especialmente o Pentateuco e os três primeiros Evangelhos, de uma breve narração primitiva, foram pouco a pouco se avolumando por acréscimos e interpolações, seja a modo de interpretações teológicas ou alegóricas, seja a modo de transições para ligarem entre si as diversas partes.”
 
Como se vê nada sobra à religião com esse ataque violento da heresia modernista. E como se vê, infelizmente, esse é o hoje o pensamento dominante entre Católicos, para quem, por exemplo, Adão e Eva não passam de mito. 
O modernista apologeta admite que o fim da apologia é conduzir o não crente à religião, qualquer que seja, e especialmente sem querer convertê-lo à religião católica. Segundo o modernismo, isso se faz levando as pessoas à experiência interior, que buscará na “semente primitiva”, que o filósofo diz existir no homem, o contato com o divino. 
Em todas as religiões deve-se buscar, através da história e das Escrituras a sua origem divina, que foi transfigurada e desfigurada a partir das experiências coletivas iniciais. Também na Igreja Católica deve-se fazer isso, separando o que é ciência do que é de fé, como na Bíblia: 

“Assim também nas Sagradas Escrituras, afirmam-no, ocorrem muitos erros em matéria científica e histórica.”
 
E por afirmarem que mesmo Cristo errou, bem como os dogmas estão cheios de contradições, os modernistas demonstram aceitar que a contradição, assim como a evolução, é princípio válido em qualquer religião, pois ciência e fé pertencem a dimensões diversas da realidade, que não se chocam, como ensina o filósofo. Por isso, também, Lutero é o modelo perfeito para essa gente, pois suas contradições gritantes e seus princípios nihilistas são fonte de pura doutrina modernista. Daí os modernistas terem empreendido um esforço imenso para reabilitar Lutero na primeira metade do século XX. 
Por fim o apologeta se volta para o interior do homem, e seu método consiste em buscar dentro do homem a disposição, a necessidade do sobrenatural. Portanto, seu método consiste em afirmar que o natural precisa do sobrenatural, como o homem precisa do alimento para se manter, o que destrói a separação entre os dois campos, divinizando o homem. 
A doutrina Católica, ao contrário, ensina que a natureza humana tem apenas certa capacidade ou conveniência para a ordem sobrenatural, que é comunicada gratuitamente por Deus, e não por exigência da natureza. Por isso deduz o Papa: 

“Pois, se perguntarmos: essa imanência distingue ou não distingue Deus do homem? (...) Se (...) não se distingue, temos de novo o panteísmo. Mas, de fato, a imanência dos modernistas quer e admite que todo o fenômeno de consciência proceda do homem enquanto homem. Com legítimo raciocínio deduzimos portanto que Deus e o homem são uma e a mesma coisa; e daqui o panteísmo.”
 
São Pio X afirma ainda que: 

“tanto o método como as doutrinas estão cheios de erros, capazes só de destruir e não de edificar, não de formar católicos, mas de arrastar os católicos à heresia, mais ainda, à completa destruição de toda religião!”
e mais adiante: “Neste caminho os protestantes deram o primeiro passo; os modernistas o segundo; pouco falta para o completo ateísmo.”
 
Por fim, o modernista reformador quer por em prática os princípios expostos anteriormente. Na filosofia, quer a substituição da escolástica pela filosofia moderna. Quer que a teologia seja apoiada na história dos dogmas, submetida aos métodos ditos científicos. A liturgia deveria ser simplificada, e a disciplina eclesiástica deveria suprimir o celibato e as pompas exteriores, como se fossem caprichos da Igreja. O reformador também é contrário à vida religiosa, privilegiando as chamadas virtudes ativas, como se houvesse virtude que não exigisse esforço humano, que fosse passiva...


 
Exposto o sistema modernista, convém aqui lembrar um comentário do Padre Leonel Franca sobre a mesma encíclica, feito numa época em que os padres ainda defendiam a fé contra os ataques de seus inúmeros inimigos. Sabemos que depois do Vaticano II cessou esse combate. Cessaram os inimigos? Muito pelo contrário, eles agora estão dentro da Igreja, como já dissera o próprio São Pio X: 

“E o que exige que sem demora falemos, é antes de tudo que os fautores do êrro já não devem ser procurados entre inimigos declarados; mas, o que é muito para sentir e recear, se ocultam no próprio seio da Igreja, tornando-se destarte tanto mais nocivos quanto menos percebidos”
 
Comentando a Pascendi, o Padre Leonel Franca usou uma belíssima imagem para representar a decisiva intervenção do Papa: a de um ancião que, apesar de sua aparente fraqueza, proclama as verdades eternas com autoridade contra os poderosos do mundo, assim como fez Pedro diante do sinédrio.:

“A Igreja Católica tem, pois, promessa divina de imortalidade e infalibilidade. Não foi, não será nunca infiel à sublimidade da sua missão. Quando a sinagoga, alarmada com os prodígios que sancionavam o cristianismo nascente, prendeu os apóstolos e lhes impôs um silêncio criminoso, Pedro respondeu aos sinedritas um sublime non possumus. No volver dos séculos nunca desmentiu a Igreja as promessas deste seu batismo de sinceridade. Todas as vezes que o erro, armado como a força, mascarado como o sofisma ou subdolo como a política, bateu às portas do Vaticano, pedindo ou impondo-lhe uma concessão, uma aliança, um compromisso, saiu-lhe ao encontro um ancião inerme e venerável na candura simbólica de suas vestes, e, com voz firme e olhar fito no céu, respondeu-lhe: Non possumus.”
(Franca, Pe. Leonel, Polêmicas, Ed. Agir, 2ª. Edição, pág. 171-172) [negritos nossos]
 
Detenhamo-nos um pouco sobre essa belíssima imagem. 
O ancião é símbolo da impotência, da fraqueza, da caducidade. Já diziam os franceses, com a poesia que lhes é própria: “Si jeunesse savait, si veillesse pouvait.” (se a juventude soubesse, se a velhice pudesse). A velhice não pode e a juventude não sabe. 
E no entanto, quando o mundo ameaça a Igreja de Cristo, é um ancião, que nada poderia, que pode contra o mundo! 
É um ancião, humanamente frágil, que ascende poderosamente à sacada vaticana e faz o mundo tremer com seu brado de pastor. Tremem os inimigos de Deus, e desagrega-se a conspiração modernista! 
Como é possível tal prodígio? É porque o Papa, que sob o aspecto puramente humano é apenas um ancião, sob o aspecto sobrenatural tem a promessa divina da infalibilidade; quando naturalmente o Papa deveria dizer “não posso”, diz, ao contrário, fortalecido pela promessa de Cristo: “Non possumus!”: Não podemos nos calar diante do que vimos e ouvimos (At 4, 20). E o sinédrio nada pode contra o escolhido de Deus. 
E os sinédrios modernos nada podem contra aquele velhinho de branco, que da sacada de mármore da basílica Vaticana proclama ao mundo a resistência ao erro e o zelo pelo redil de Cristo: Apascenta minhas ovelhas, apascenta meus cordeiros.” 
E foi exatamente para apascentar o rebanho de Cristo, pascendi dominici gregis, que São Pio X levantou-se contra o veneno modernista com a força divina que sustenta o Papa, e interrompeu a gestação desse monstrengo doutrinário. Um dia saberemos que mal evitou o grande santo com a condenação do modernismo antes mesmo que ele pudesse destilar todo o seu veneno no interior da Igreja.           
E como vimos na apresentação da Pascendi, não há nada mais vivo hoje que o modernismo, seja nos documentos do Vaticano II, seja nos movimentos laicos que esse concílio pastoral promoveu, seja na mentalidade dos católicos de hoje.       
Precisamos novamente hoje, cem anos depois, que o ancião de branco pronuncie contra os sinédrios modernos, que querem calar a Igreja e Cristo, um sonoro non possumus, reafirmando a doutrina da Pascendi que, como se viu pela revelação do Motu Proprio Praestantia Scripturae, vincula todos os Católicos. 
Que o Papa Bento XVI tenha força para enfrentar os lobos, como ele mesmo manifestou no início do pontificado, e que reafirme a doutrina perene da Pascendi, assim como fez com a missa de sempre, dizendo também ao mundo que não podia calar-se diante dos abusos da missa pós-conciliar, permitindo a celebração daquela a qualquer padre que a queira celebrar, sem necessidade de aprovação do Bispo. Nas palavras do santo Padre:

“...em muitos lugares, se celebrava [a missa] não se atendo de maneira fiel às prescrições do novo Missal, antes consideravam-se como que autorizados ou até obrigados à criatividade, o que levou frequentemente a deformações da Liturgia no limite do suportável. Falo por experiência, porque também eu vivi aquele período com todas as suas expectativas e confusões. E vi como foram profundamente feridas, pelas deformações arbitrárias da Liturgia, pessoas que estavam totalmente radicadas na fé da Igreja.” (Carta explicativa do motu proprio Summorum Pontificum). 
[negritos nossos] 
 
Desejamos que nosso Papa Bento XVI siga os mesmos passos de São Pio X, condenando o neo-modernismo e não fugindo dos lobos que ameaçam o redil, cumprindo sua missão pastoral: 

“Após dois mil anos, ecoando ao protesto necessário do humilde pescador da Galiléia, outro humilde filho do povo opôs à mais refinada, altiva e perversa aberração religiosa a negação serena de sua divina intransigência.”
(Franca, op. Cit., pág. 172)
 
Que o Papa tenha forças para apascentar o rebanho de Cristo: Pascendi dominici gregis.
 
 
In Jesu et Maria
 

    Para citar este texto:
"Cem anos de Pascendi"
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/bra/veritas/igreja/100anos_pascendi1/
Online, 30/04/2024 às 14:12:25h