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Possessão diabólica em retiro
PERGUNTA
Nome:
Lucas
Enviada em:
10/03/2020

 

Olá me chamo Lucas 

 

vou contar um ocorrido comigo no retiro de carnaval desse ano no momento de dormir estava uma bagunça ninguém queria dormir então os administradores decidiram rezar um terça da misericórdia para ver se todos acalmasse ,então encerrado o terço um menino em especial manifestou um espirito maligno e como 

não havia um padre nos fizemos uma roda de orações para expulsar o espirito 

mas não ocorria efeito então os administradores levaram ele na capela no santismo 

até esse ponto não sei o que ocorreu mas o menino dormiu na capela e voltou normal sem nada , não se sabe o motivo que ocorreu isso acreditam o menino ter comido algo amaldiçoado ou ido a um terreno mas eu desconfio das "orações em línguas " que já havia ocorrido anteriormente poderia haver a possibilidade dessas orações serem responsáveis pelo fato que ocorreu ?   

paz e benção fiquem com Deus

RESPOSTA
 

Prezado Lucas, salve Maria.

Sintetizando: você deseja saber se as ditas “orações em línguas” são causa de manifestações demoníacas.

Antes de responder precisamente seu questionamento é importante adverti-lo: recuse convites para retiros que não tenham ou não sejam conduzidos por um padre, pois só ele tem a autoridade, outorgada pelo bispo enquanto seu colaborador, para pregar, ensinando a doutrina com firmeza para preservar a fé dos fiéis; orientar e conduzir as almas para o céu pela administração dos sacramentos e expulsar demônios pelo rito de exorcismo.

Além disso, é necessário fazer uma análise prévia independente da presença do padre, pois os retiros de hoje, infelizmente, não são mais encontros que visam levar a uma reflexão sobre a vida espiritual, mas apenas reuniões “humanísticas” de entretenimento ou – pior – doutrinação anticatólica.

Um leigo não pode, tampouco deve realizar a expulsão de demônios porque não tem as graças de estado para isso, muito menos com a reunião de vários leigos, ou seja, um acréscimo da quantidade de pessoas em “roda de orações” substitui o padre. Como você mesmo atestou: “não ocorria efeito”. Será? Como você sabe se a ação demoníaca muitas vezes não é visível? A desobediência àquilo que é determinado pela Igreja leva o demônio a ter mais poder sobre as almas, ainda que não se trate de uma possessão.

A Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé tendo à época o Cardeal Ratzinger como prefeito publicou uma Instrução Sobre Exorcismo em 24 de Setembro de 1985 que ratifica o que acima afirmo declarando que “a ninguém é lícito proferir exorcismo sobre pessoas possessas, a não ser que o Ordinário do lugar tenha concedido peculiar e explícita licença para tanto:

1º) Determina também que esta licença só pode ser concedida pelo Ordinário do lugar a um presbítero dotado de piedade, sabedoria, prudência e integridade de vida.”

Essa maneira ilógica de rezar pela expulsão de demônios é instigada aos leigos nos meios carismáticos, basta dar uma passada de olhos para conferir no livrinho vermelho, famoso e muito utilizado pelos leigos-intercessores dos grupos de oração, chamado “Orações Selecionadas por Cura, Libertação e Intercessão”. Além deste há outro livro, com uma linguagem ambígua, em que o autor em um dos capítulos trata do intitulado exorcismo particular. Este “não é exercido em nome da Igreja [...] e qualquer crente, sem formalidade ou autorização especial” pode exercê-lo. (O Despertar dos Carismas, S. Falvo, p. 192, 1976)

Não obstante, o mesmo autor elenca o que se deve fazer para libertar – expulsar – os demônios por parte dos exorcistas, segundo a visão dele, sejam padres ou leigos:

“A oração pela libertação, se possível, deve ser feita por um grupo de pessoas, não por uma só.

[...] Eis como se deverá proceder:

1)                 Antes de mais nada, rezar e jejuar, especialmente em se tratando de casos bem difíceis. Jesus mesmo fez esta advertência: “esta casta não se expulsa senão com oração e jejum (Mt. 17, 21). Quem tiver o dom deve rezar em línguas. Os demônios não conseguirão resistir contra esta arma poderosíssima.” (IDEM, p. 196, 1976)

Segundo seu relato e o que a experiência dentro desse movimento tem me mostrado, as orações (alaridos) em línguas, ao contrário do que diz esse autor, não afastam as assim chamadas manifestações demoníacas. Uma ação ilógica como a oração em línguas é algo que o demônio gosta. Na realidade, utilizar a oração em línguas para expulsar o demônio é como querer utilizar uma “figa” ou outro amuleto e não a cruz na esperança que o demônio se afaste.

Ademais, a CNBB havia pedido em um documento para “que não se faça uso do dom das línguas” nas reuniões dos grupos da RCC, pois “não parece que sirva para edificação comum, e para edificação e proveito da Igreja de Deus. Serve muito mais para a exaltação pessoal e para uma série de inconvenientes (Cf. 1Cor 14, 4-12)”. Esse livreto de orientações e normas pastorais dirigidas à RCC, diga-se de passagem, não é divulgado nos meios carismáticos. Por que será?

Note-se que neste ponto a orientação da CNBB está de acordo com toda a tradição da igreja e por isso não há qualquer motivo para recusarmos essa orientação.

É sabido pelos padres exorcistas, para citar um dos mais famosos o Padre Gabrielle Amorth, que um dos sintomas de manifestações demoníacas pode ser a capacidade que o indivíduo tem de falar línguas estranhas. O indivíduo, estando sob o poder do demônio, pode falar línguas estranhas! É comum nos exorcismos o possesso soltar sons sem sentido.

A sua desconfiança da ação do demônio de ter, segundo você, manifestado no menino, está fundada no exagero constante que a RCC faz da ação do maligno. Se bem que não há certeza de que isto tenha realmente acontecido, mas certamente o ambiente favorecia algo deste tipo.

Veja, por exemplo, o conhecido caso dos exorcismos nos Arautos do Evangelho. É evidente que em muitos daqueles vídeos há uma simulação de uma possessão por parte das moças. Entretanto, é necessário dizer que um ambiente deste tipo favorece a ação do demônio e não é de se estranhar que alguma possessão de fato tenha ocorrido.

Com tudo isso a ação do demônio passa a ser mais eficiente. Por um lado ele é desacreditado pelas pessoas em geral, porque os casos de possessão são muitas vezes claramente falseados, por outro lado são realizadas ações que permitem sua ação mais prontamente. Sendo assim, não há mais uma verdadeira oposição à ação do demônio, e seu triunfo sobre as almas se realiza mais facilmente neste nosso mundo ateu que afugentou Cristo e sua doutrina tornando tudo permissível e fazendo com que um pequeno número de almas se salve – conforme São Leonardo de Porto Maurício em um sermão.

O demônio existe e é poderoso, mas não onipotente. Sua atividade empenha-se, principalmente, em tentar as pessoas para condená-las ao inferno. É preciso estar atento e não abrir o flanco para o demônio. Por isso, recuse ir aos encontros, retiros, experiências de oração, seminários e tantos outros eventos carismáticos.

Sejamos sóbrios e vigiemos, pois o demônio anda ao nosso redor como o leão que ruge, buscando a quem devorar (Cf. I Pd. V, 8). Revistamo-nos da armadura de Deus, frequentando os sacramentos, rezando a Nossa Senhora, aos nossos Santos de devoção, ao anjo da guarda, a São Miguel Arcanjo para que possamos resistir às ciladas do demônio. (Cf. Ef. VI, 11).

Sancte Míchaël Archángele, defénde nos in prælio, contra nequítiam et insídias diáboli esto præsídium.

 

Rodrigo Santana.