Ciência e Fé

Infusão da alma no homem
PERGUNTA
Nome:
Ney Oliveira Dos Santos
Enviada em:
27/04/2005
Local:
Samambaia - DF, Brasil
Religião:
Católica
Idade:
36 anos
Escolaridade:
Superior concluído
Profissão:
Bombeiro Militar

Gostaria de saber há algum documento da Igreja que verse sobre o momento no qual Deus coloca a alma no homem?
RESPOSTA
Prezado Ney, salve Maria!

    Agradeço a oportunidade de tratar desse assunto bastante importante para a bioética, ao mesmo tempo em que se refere a uma questão de teologia aplicada às ciências.  É uma relação profunda entre Teologia e Ciências Naturais sem que uma se contradiga à outra. De fato, o que há é uma situação harmoniosa e, consequentemente, muito bela.
    Em primeiro lugar, ocorre que, quando se trata da infusão da alma num corpo material, o discurso não cabe mais às ciências naturais, mas à filosofia. Porém, na embriologia, enquanto ciência natural, por exemplo, não há discrepância com o que ensina a filosofia. Assim, o embrião, após o momento da fecundação, carrega em si as informações necessárias para o desenvolvimento de um novo homem. Ou seja, possui forma e matéria essenciais para a atualiazação de um novo ente.
    A discussão, porém, do momento da infusão da alma, ou da animação, passou a ser destaque nos meios de comunicação a partir do momento em que os movimentos pró-aborto viram na Igreja Católica o maior empecilho para seus planos. Essa discussão ocorre há alguns séculos. Se a ciência conseguisse provar para a Igreja que em algum momento não há alma no embrião - o que arriscaram alguns cientistas modernos a chamar de pré-embrião - então o aborto seria moralmente lícito.
    Contudo, isso é desde o princípio falso. Já São Boaventura ensinava que, mesmo que houvesse um momento na formação do feto em que a alma lhe fosse ausente, o sujeito agente seria homicida do mesmo jeito, pois aquele seria um ato pecaminoso contra à natureza (São Boaventura, Opera Omnia, Tomus III, Ex Typographia Collegii S. Bonaventurae, MDCCCLXXXIX; Commentaria in Quatuor Libros Sententiarum Magistri Petri Lombardi, in Quatuor Librum Sententiarum, De Doctrina Signorum, Dubia IV circa litteram Magistri).
    A Congregação para a Doutrina da Fé, em 1974, declarou: 

"12. Uma discriminação fundada sobre os diversos períodos da vida não será pois mais justificável do que outra qualquer. O direito à vida permanece na sua inteireza num velhinho, mesmo que este se ache muito debilitado; permanece num doente incurável, este não o perdeu. Não é menos legítimo numa criança que acaba de nascer do que num homem feito. Na realidade, o respeito pela vida humana impõe-se desde o momento em que começou o processo da geração. Desde quando o óvulo foi fecundado, encontra-se inaugurada uma vida, que não é nem a do pai, nem a da mãe, mas a de um novo ser humano, que se desenvolve por si mesmo. Ele não virá jamais a tornar-se humano, se o não for desde logo . 
13. A esta evidência de sempre (absolutamente independente das discussões acerca do momento da animação),[*]
{[*] Esta Declaração deixa expressamente de parte o problema do momento de infusão da alma espiritual. Sobre este ponto não há tradição unânime e os autores acham-se ainda divididos. Para alguns, ela dá-se a partir do primeiro momento da concepção; para outros, ela não poderia preceder ao menos a nidificação. Não compete à ciência dirimir a favor de uns ou de outros, porque a existência de uma alma imortal não entra no seu domínio. Trata-se de uma discussão filosófica, da qual a nossa posição moral permanece independente , por dois motivos: 1° no caso de se supor uma animação tardia, estamos já perante uma vida humana, em qualquer hipótese, (biológicamente verificável); vida humana que prepara e requer esta alma, com a qual se completa a natureza recebida dos pais; 2° por outro lado, basta que esta presença da alma seja provável (e o contrário nunca se conseguirá demonstrá-lo) para que o tirar-lhe a vida equivalha a aceitar o risco de matar um homem, não apenas em expectativa, mas já provido da sua alma.}
a ciência genética moderna traz preciosas confirmações. Ela demonstrou, com efeito, que desde o primeiro instante se encontra traçado o programa daquilo que virá a ser este novo vivente: um homem, este homem indivíduo com as suas notas características já bem determinadas . A partir da fecundação, começou a aventura de uma vida humana, na qual cada uma das suas capacidades requer tempo, mesmo um tempo bastante longo, para eclodir e para se achar em condições de agir. O mínimo que se pode dizer é que a ciência actual, no seu estado mais evoluído, não dá apoio algum substancial aos defensores do aborto. De resto, não pertence às ciências biológicas dar um juízo decisivo sobre questões propriamente filosóficas e morais, como são a do momento em que se constitui a pessoa humana e a da legitimidade do aborto. Ora, sob o ponto de vista moral, isto é certo mesmo que porventura subsistisse uma dúvida concernente ao facto de o fruto da concepção ser já uma pessoa humana: é objectivamente um pecado grave ousar correr o risco de um homicídio. « É já um homem aquele que o virá a ser » (Tertuliano)."
   (Congregação para a Doutrina da Fé, Declaração sobre o aborto – Quaestio de abortu (Declaratio de abortu procurato), 18 de novembro de 1974, sublinhados nossos,   http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/documents/rc_con_cfaith_doc_19741118_declaration-abortion_po.html ).

    Os Papas Joao Paulo II e o atual Bento XVI repetiram muitas vezes, em pronunciamentos públicos, que a vida humana deve ser protegida desde a sua concepção. Ora, se há vida humana desde a concepção, há alma humana no embrião desde o início.
    Portanto, como se vê acima, a Igreja resolveu a situação sobre o momento da animação, debatida entre teólogos, de modo que não há como tornar lícito o aborto, uma vez que desde a concepção, temos um novo ser humano, composto por corpo e alma. Não é à toa que dizem as Sagradas Escrituras, por meio do profeta Jeremias:

“veio, pois, a palavra do Senhor a mim, dizendo: antes que tu foste formado no ventre eu te conheci, e antes que nasceste te santifiquei” (Jeremias I, 4-5).
   
No Coração de Maria Santíssima,
Fábio Vanini