Religião-Filosofia-História



Vimos que a Abadia representa o mundo controlado pela Igreja e que seus acontecimentos simbolizam os fatos da História. A luta pelo poder entre Igreja e Estado nos conduziu à constatação de que o Estado tentou dominar a Igreja, quer diretamente pela força, quer pelo favorecimento ou introdução de movimentos heréticos dentro do corpo eclesiástico. No decorrer da História, o uso dessas duas táticas tem se alternado.

Ainda nos séculos mais recentes, a Revolução Francesa tentou destruir a Igreja pela guilhotina. A Constituição Civil do Clero foi o fundamento legal para obrigar os Bispos e os católicos franceses a se separarem do Papa. O culto católico foi proibido. Os conventos foram fechados. Claro, em nome da Liberdade e da Fraternidade. Quem permanecesse fiel a Roma era guilhotinado. As tropas revolucionárias tomaram Roma e prenderam o Papa Pio VI - por derisão chamado de Pio, o Último- e o fizeram morrer em Valence.

Tudo em vão. O catolicismo provou mais uma vez que o sangue de seus mártires é semente de cristãos

Napoleão sugeriu e aplicou uma nova tática. Já que a força da Igreja estava na adesão firme dos católicos e dos Bispos ao Papa - adesão tão forte que nem a guilhotina pudera cortar- ao invés de tentar separá-los, era mais inteligente usar essa mesma força para vencer a Igreja. Era mais conveniente usar o Papa, para. através da obediência fiel que os católicos lhe tinham, levar os cristãos a aceitar os princípios da Revolução. Dever-se-ia levar o Papa a defender a Revolução, e então os católicos, obedientes à autoridade de Pedro, seriam levados a aceitar os ideais anti-cristãos da Revolução Francesa pela própria força que deveria condená-los. Foi o que fez Napoleão.

A Revolução favoreceu a eleição de um Papa fraco, que demostrara certas tendências favoráveis a ela e uma certa simpatia pelos idéias liberais. O eleito foi o Bispo de Ímola, Barnabé Chiaramonti, que tomou o nome de Pio VII.

Foi ele um Pontífice pusilânime que se deixou dominar pelo Imperador corso. Consentiu até em sagrar em Notre Dame o usurpador que acabara de manchar de sangue suas mãos, ao ordenar o rapto e o fuzilamento do Duque d'Enghien. Mais tarde, quando o Papa tentou resistir a Napoleão, este o prendeu e o obrigou a assinar um acordo desonroso para a Igreja, em Fontainebleau, em 1813. Após essa capitulação infame, Pio VII, reconhecendo que agira contra seu dever apostólico, ficou três dias sem rezar Missa e sem comungar, tão atormentado estava por sua consciência. Depois, declarou nula a Concordata que assinara, dizendo-a extorquida por Napoleão. Em Roma, porém, escrevia-se nos muros:

"Pio VI, per non perder la Fede, perse la Sede.

Pio VII, per non perder la Sede, perse la Fede".

O plano napoleônico de controlar a Igreja dominando um Papa, foi retomado e aperfeiçoado pelos carbonários ainda no século XIX. Eles imaginaram eleger um de seus elementos ao sólio de Pedro. Foi o que revelaram os documentos da Alta Venda capturados em 1848, em Roma, e publicados por Crétineau-Joly, com permissão de Pio IX. (Cfr. D. Boaventura Kloppenburg, A maçonaria no Brasil, Vozes, Petrópolis, 1957,pp. 306 e ss.).

Ainda mais recentemente, os Modernistas planejaram fazer o mesmo, conforme se vê nas obras de Fogazaro e na Encíclica Pascendi de São Pio X. E muitos, hoje sustentam a tese de que o plano Modernista alcançou sua meta com a eleição de João XXIII e que foi levado a sua plena execução nos pontificados de Paulo VI e de João Paulo II. Aliás, a conhecida e insuspeita revista Trinta Dias, muito ligada ao Cardeal Ratzinger e ao Vaticano, publicou que a eleição de Paulo VI para o papado foi feita antecipadamente numa reunião de Cardeais, em Grottaferratta, na casa de Umberto Ortolani, alto prócer mação, ligado à famosa Loja P-2. (Cfr Andrea Tornelli, artigo Almoço na mansão Ortolani,, Trinta Dias, São Paulo, ano VII, n.3, março de 1993, pp. 46-50). Não é então de espantar que o Concílio Vaticano II tenha realizado e posto em execução as reformas preconizadas pelos hereges Modernistas. Foi do Vaticano II que nasceu uma Nova Igreja oposta à Igreja Católica Apostólica Romana. Essa Nova Igreja, sem dogmas, evolutiva, ecumênica, igualitária e humanista, abriu-se ao mundo e à civilização moderna, aceitando até o socialismo. Essa Nova Igreja Conciliar se mostra sedenta de coisas novas (Rerum novarum semel excitata cupidine), tal como a Igreja desejada pelos hereges medievais, defendida por Eco através da boca de Frei Guilherme de Baskerville.

É uma tentativa de dominar a Igreja por dentro que Eco descreve em O Nome da Rosa.

Na época em que transcorre o romance, o papado era disputado por várias facções políticas e religiosas. Guelfos e Gibelinos, Zelantes e Espirituais, Fraticelli e Irmãos do Livre Espírito, italianos, franceses e imperiais procuravam eleger um Papa que os favorecesse.

"Uma Abadia é sempre um lugar onde os monges estão em luta entre si para se apoderar do governo da comunidade", diz Frei Guilherme ao jovem Adso de Melk. (R.152).

Assim também na Igreja. Por ocasião das vacâncias, os Cardeais se digladiam, organizando-se em partidos opostos a fim de obter o supremo posto da Hierarquia para um candidato de seu grupo político ou religioso.

Vimos que, de modo muito sugestivo, Eco deu a seu abade o nome de Abbone, palavra que parece o aumentativo, em italiano, da palavra aramaica Abba, pai. Abbone seria o grande pai, isto é, o Papa.

Ora, no ano de 1327, - data dos eventos da Abadia - a Igreja estava em grande crise. O papado fora transferido à força para Avignon. O rei da França, Felipe IV, o belo, fizera seu ministro Nogaret, ajudado por Sciarra Colonna, prender o Papa Bonifácio VIII. Por ocasião desse ato, o Papa fora ultrajado, morrendo pouco tempo depois. Seu sucessor, Bento XII, teve morte tão misteriosa que, logo se disse, fora envenenado por ordem do Rei da França.

Os Cardeais escolheram então como Papa um amigo do Rei francês. Foi eleito o Arcebispo de Bordéus, Bertrand de Gott, que tomou o nome de Clemente V. Era um homem corrupto e fraco. Ele transferiu a Sé Apostólica de Roma para Avignon, entregando-se ao protetorado, mais que suspeito, do Rei da França.

Quando da coroação de Clemente V, deu-se um fato simbólico: durante o cortejo, uma muralha ruiu, causando a morte de várias pessoas. No tumulto conseqüente, a coroa papal caiu da cabeça do Papa e rolou na sarjeta...

Em Avignon, vários pontífices se sucederam na Cátedra de Pedro. Roma caiu em ruínas e se viu nela proclamar uma república. O papado perdeu prestígio. Alemães e ingleses tinham dificuldade em acatar as ordens e decisões de um Papa que agia quase como capelão do rei da França. Coincidentemente, Alemanha e Inglaterra virão a ser os primeiros centros a aderir à revolta protestante contra o Papa, dois séculos depois.

De nada adiantou estarem cheias de ouro as arcas do Papa em Avignon: um prisioneiro coberto de ouro e de jóias continua a ser um prisioneiro.

O desprestígio do papado favoreceu o aparecimento de inúmeras heresias e movimentos sectários. Espirituais, Fraticelli, Patarinos, Arnaldistas, Dolcinianos ou Pseudo-Apóstolos, Begardos, Irmãos do Livre espírito, Flagelantes, fizeram o mundo parecer um hospício. O Papa João XXII - o francês Jacques de Cahors, famoso por sua habilidade financeira e por sua simpatia pela Alquimia - foi enérgico no combate a essas heresias. Ele condenou os Espirituais, os Fraticelli e os Beguinos, qualificando de heréticas suas teses sobre a pobreza absoluta de Cristo e dos Apóstolos. Processou e condenou Mestre Eckhart por suas idéias gnósticas, e Guilherme de Ockham, Marsílio de Pádua e Jean de Jundun, por suas teses anti-papais e heréticas.

À crise do papado e da Igreja se acrescentava então a crise provocada pela nova situação social e econômica nascida do florescimento urbano. Com o crescimento das cidades e do comércio, nascia uma nova classe, a burguesia, e um novo valor, o dinheiro. A economia medieval começou a perder seu tônus exclusivamente agrícola. Os laços feudais se afrouxaram. O poder do Estado cresceu. As monarquias se centralizaram. A vida cultural começou a se deslocar das abadias rurais para os centros urbanos, onde se desenvolveram as Universidades. A língua vernácula começou a disputar ao latim o primado cultural.

É parte desse quadro de mudanças que Eco descreve através das palavras do monge italiano Aymaro de Alessandria, cujas críticas ao governo da Abadia são válidas também para a situação da Igreja e do mundo de então.

"Então, já vos habituastes a esta espelunca de dementes? "pergunta ele a Frei Guilherme (R.150), falando ambiguamente da situação da Abadia e da Igreja Católica. A Abadia - a Igreja- fora, no passado, um centro de santos e de sábios, "quando os Abades eram Abades e os Bibliotecários, Bibliotecários."(R.150). Isto é, quando havia Papas que atuavam como santos, e Cardeais sábios eram incumbidos da missão de zelar pela Doutrina da Fé (Bibliotecários). Ele, que era italiano, lamentava que a Abadia - a Igreja- e a Biblioteca - o saber, a doutrina da Igreja- por culpa do Abade, isto é, do Papa, tivessem caído nas mãos de estrangeiros ineptos e corruptos.

O Abade é culpado, diz Aymaro, "porque pôs a biblioteca em mãos de estrangeiros e conduz a Abadia como uma cidadela erigida em defesa da biblioteca. Uma abadia beneditina nesta plaga italiana deveria ser um lugar onde os italianos decidem os assuntos italianos. O que estão fazendo os italianos hoje que não têm mais sequer um Papa?"(R.150).

Aymaro mostra então que enquanto as cidades passam a ter as decisões graças ao controle do comércio, a Abadia (a Igreja) continuava "colhendo milho e criando galinhas"(R.150), isto é, mantinha-se na economia agrícola enquanto o mundo passava para uma economia comercial, mercantilista ou pré-capitalista. Desse modo, até o controle da cultura passaria para as cidades, coisa, aliás, que já estava ocorrendo.

Quando, porém, Frei Guilherme observa que, em concreto, naquela Abadia o abade era italiano, Aymaro lhe retruca que "o Abade aqui pouco conta. No lugar da cabeça tem um armário de biblioteca. Está carunchado (...). Deixa que a Abadia seja invadida por Fraticelli (...). Sua "indulgência para as coisas do século só é reconhecível quando se trata de permitir aos germânicos..."E Aymaro conclui as reticências maliciosas aludindo aos casos de homossexualismo acontecidos na abadia (Cfr. R.151).

Em síntese, Aymaro acusava o Abade:

1 - de ter entregue a Biblioteca - o encargo de guardar a Doutrina da Fé- a estrangeiros e não a um italiano;

2 - de conduzir a Abadia como se fosse uma cidadela em defesa da Biblioteca;

3 - de ter permitido a perda do controle da sociedade para o novo poder emergente: as cidades com sua nova arma, o dinheiro;

4 - de ter consentido na infiltração de elementos heréticos na Abadia;

5 - de tolerar a prática de vícios contra a natureza na Abadia.

Tudo isto havia conduzido a Abadia - não esqueçamos, a Igreja Católica - a uma grande decadência, tanto mais que aos erros e fraquezas do Abade se acrescentavam os erros e pecados de seus monges. "Os seus monges não se satisfazem mais no santo ofício -[no Santo Ofício! Hoje, Congregação da Doutrina da Fé]- da cópia [da tradição], queriam eles também produzir novos complementos da natureza, impelidos pela CUPIDEZ DAS COISAS NOVAS" (R.217. Sublinhado e maiúsculas são nossas).

De novo. "RERUM NOVARUM ex semel excitata cupiditate"! São as próprias palavras que iniciam e intitulam a famosa encíclica de Leão XIII ! Pela segunda vez Eco as cita, criando um paralelo entre a situação da Abadia, isto é, da Igreja no final da Idade Média e a situação da Igreja no início da crise de nossos tempos.

Conforme Leão XIII, fora a "cupidez de coisas novas" que levara a sociedade ao socialismo e ao comunismo. Por que Eco usa as próprias palavras de Leão XIII para explicar a causa da decadência da Abadia na Idade Média ?

Na crítica de Aymaro ao Abade Abbone, Eco sintetiza as acusações de uma ala eclesiástica liderada por Cardeais italianos aos Papas de Avignon. Mas, a citação das palavras iniciais da Rerum Novarum transporta o problema para tempos muito mais recentes. Haveria, nas críticas, alusões a outros Papas não medievais ?

Se isto fosse verdade, crendo ou não Eco em sua alegoria, mesmo que estivesse ele brincando de semiótica, a que Papa italiano, fraco e mais recente teria querido ele aludir com seu jogo de palavras? Qual é o Papa representado pela figura de Abbone?

É bem possível que Eco tenha desejado que Abbone semioticamente representasse vários papas medievais ou atuais.

Por exemplo, poderia ter desejado representar o medieval, italiano e politicamente fraco, embora santo, Celestino IV [S. Pedro Celestino]. Este Papa, apesar de ser muito virtuoso, teve um pontificado desastroso por ter permitido uma larga difusão e infiltração das heresias dos Espirituais e Fraticelli na Igreja. Ele mesmo compreendeu que não tinha capacidade para ser Papa e humildemente renunciou ao papado. Com sua renúncia, os gibelinos ficaram muito prejudicados, o que levou Dante a colocar esse Papa no Limbo como líder de todos os neutros, indecisos e vis, dizendo dele "colui che per viltà fecce il gran rifiutto" ["Aquele que por vileza fez a grande renúncia" (Dante, La Divina Commedia, Inferno, III,59-60).

Mas, em contrapartida, este Pontífice não pode ser acusado de conduzir os negócios da Igreja como se ela fosse uma cidadela posta em defesa da doutrina apenas. Foi exatamente isto que ele não fez.

Esta última acusação caberia muito mais a Bonifácio VIII, sucessor de Celestino IV. Porém, Bonifácio VIII jamais entregou a guarda da Biblioteca da Igreja a a estrangeiros, particularmente a alemães. A não ser que se queira entender que a concepção da Igreja-fortaleza da verdade assediada por hereges, propugnada por Bonifácio VIII, é que acabou por causar, indireta e involuntariamente, a transferência da Sé apostólica de Roma para Avignon, com o seu conseqüente domínio pelos franceses.

Representaria Abbone o Papa João XXII que regia a Igreja no tempo em que transcorrem os fatos do romance? Parece-nos evidente que não. João XXII não foi nada fraco, e, ademais, seria um contra senso um personagem de um livro representar outro personagem do mesmo livro. Parece então que Abbone simboliza um Papa recente.

Há outro ponto curioso e intrigante colocado por Eco. Ele faz Frei Guilherme explicar que Aymaro desejaria que a Abadia - a Igreja- voltasse a ter a decisão nas questões do mundo, recuperando o poder cultural, político e econômico que ela estava perdendo para as cidades. Aymaro queria uma Igreja rica e politicamente poderosa. Nesse sentido, Aymaro deveria ficar muito contente com os Papas italianos do Renascimento, embora eles não fossem nada santos, nem preocupados com a defesa da Biblioteca da Igreja... É, entretanto, a esse monge ambicioso de poder temporal, político e econômico, a esse monge "sedento das coisas novas" pelo menos no campo econômico, que Frei Guilherme-Eco chama de tradicionalista.

"Aymaro quer que se volte à tradição. Só que a vida do rebanho mudou, e a Abadia pode voltar à tradição [à sua glória e poder de antigamente] somente se aceitar o novo costume do rebanho, tornando-se diferente. E uma vez que aqui hoje se domina o rebanho não com armas ou com esplendor dos ritos, mas com o controle do dinheiro, Aymaro quer que a fábrica inteira da Abadia, e a própria biblioteca se tornem opifício e fábrica de dinheiro"(R. 153. O sublinhado é nosso).

Estranho tradicionalismo o de Aymaro... Mas, por estranho que seja esse tradicionalismo, as palavras de Frei Guilherme que nós sublinhamos trazem à tela a pessoa de Monsenhor Lefèbvre. O famoso Bispo tradicionalista que fundou o movimento de Ècone também "quer(ia) que se voltasse à tradição" sem considerar - é o que dizem seus inimigos, os defensores do Vaticano II- que a vida do rebanho mudou". Dom Lefèbvre se opôs ao Vaticano II que, para recuperar para a Igreja o poder e a glória de antigamente, procurou aceitar "o novo costume do rebanho", criando uma Igreja "diferente".

Estas coincidências e a misteriosa citação das palavras da Rerum Novarum trazem para nossos dias a simbologia utilizada por Eco através de suas máscaras. Isto é feito seriamente ou apenas, como jogo semiótico para excitar as imaginações, como Eco fez no caso de Conan Doyle e de Sherlock Holmes ?

De qualquer modo, considerando-se a hipótese insinuada, ainda que por jogo, é lícito perguntar-se a que Papa Eco quis aludir. Qual o Papa, recente e fraco, que pretendeu fazer da Igreja uma fortaleza apenas ocupada na defesa da doutrina, mas que permitiu que ela fosse invadida por hereges modernistas e que, afinal, entregou o controle da Biblioteca, não a italianos, mas aos estrangeiros, aos alemães ?

Teria sido Leão XIII, cujas palavras foram citadas? Parece bem improvável, pois os detalhes não correspondem a seu caso.

Teria sido Pio XII ?

Este Papa, de tanto prestígio em seu tempo, está hoje quase esquecido. Sic transit gloria mundi... Na encíclica Humani Generis, especialmente, ele procurou defender a Fé, condenando os erros da chamada Nova Teologia de Congar, de Lubac, Daniélou e Urs Von Balthasar, mas não ousou citar-lhes os nomes. Esses teólogos acabaram por ter seu triunfo no Vaticano II que adotou suas teses outrora condenadas. Vários deles tornaram-se Cardeais... Pio XII, tido como paladino da Fé pelos modernistas e por muitos ingênuos tradicionalistas, permitiu, na verdade, que o Modernismo prosperasse dentro da Igreja sem tomar nenhuma medida mais séria para contê-lo. É o que explica que, três anos após a morte de Pio XII, ao se iniciar o Concílio Vaticano II, a Igreja se visse com um episcopado quase totalmente modernista. Ele foi o Papa das omissões, dos silêncios e das ambigüidades.

Quanto aos alemães, basta citar alguns nomes bem conhecidos para ver o poder que eles alcançaram no Vaticano, sob Pio XII. Alemão era o confessor de PioXII, o futuro Cardeal Bea, tido então como conservador e que se revelou depois um dos líderes mais radicais do ecumenismo modernista esposado pelo Vaticano II. Alemães eram seus conselheiros e amigos Padre Leiber e Monsenhor Kaas. Alemã era a famosa Irmã Pascalina, enfermeira e secretária de Pio XII e primeira mulher a ser admitida no Vaticano, e primeira mulher que foi conclavista... E, por coincidência bem curiosa, o secretário do Santo Ofício, no tempo de Pio XII, o "Bibliotecário" da Abadia era então o Cardeal Ottaviani, que era quase cego...

Seria Abbone a representação de João XXIII? De Paulo VI?

Hoje, depois de muitos séculos, o Papa não é italiano. A Abadia tem um Papa estrangeiro. Karol Woytila é polonês, e nomeou como secretário da Congregação para a Doutrina da Fé, (o ex-Santo Ofício), isto é, como guarda da Biblioteca da Igreja, um alemão: o Cardeal Joseph Ratzinger. Talvez seja isto apenas uma coincidência curiosa... Mas... Que curiosa coincidência! Que certamente Eco classificará como do mesmo tipo da que encontramos entre Frei Guilherme e Sherlock Holmes...

A disputa pelo poder supremo na Igreja-Abadia mostra que ele só tem importância na medida em que o Abade mantém as chaves da Biblioteca em suas mãos. É por ter as chaves doutrinárias que o Papa pode "abrir e fechar o poço do abismo" (Apoc. IX,1), ou as portas do Reino dos céus. O labirinto do poder eclesiástico leva da Igreja à Biblioteca.

O que contava na Abadia, na verdade, não era o cargo de Abade e sim o de bibliotecário. Na Igreja, especialmente quando o Papa é fraco, o que tem importância é o controle da Doutrina da Fé. É lá, na Biblioteca, que está o mistério da Abadia. É lá que se formam os monges, isto é, os futuros Abades e Bibliotecários, os teólogos que influenciarão e aconselharão os Papas e orientarão os Concílios.

Porém, como diz o imbecilizado monge Alinardo de Grottaferrata, "muitos atos de soberba foram cometidos na Biblioteca especialmente depois que caiu em mãos dos estrangeiros", isto é, dos que não eram italianos. Por isso, diz ele, "Deus ainda está castigando "(R.349).

 

Anterior
Anterior


    Para citar este texto:
""
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/bra/cadernos/religiao/labirintos8/
Online, 29/03/2024 às 11:04:14h