Religião-Filosofia-História



A. A utopia, milênio naturalista

1. Racionalismo - A utopia naturalista pretende que a natureza é divina e está em constante evolução. O homem é o ponto final desta evolução, e, nele, a razão é o ponto ápice. A razão, pois, seria o meio de salvação que permitiria ao homem tudo compreender e tudo dominar.

2. Cientificismo - A ciência, conseqüentemente, daria a vitória sobre todos os males do mundo. Por meio dela, as doenças, a fome e a própria morte seriam vencidas. É somente uma questão de tempo. Exemplos de cientificismo utópicos podem ser encontrados na "Nova Atlântida" de Bacon, e no "Choque do Futuro" de Toffler.

3. Tecnicismo e mecanicismo - A ciência não teria por fim o saber em si mesmo, mas apenas o saber aplicado, tendo em vista a solução de problemas concretos ou práticos. Daí a adoracão da técnica e o mecanicismo típicos de outras utopias. Sonha-se em tornar o prórprio homem uma máquina. Um robot movido por eletrodos. Os "cyborgs"(cybernetic organisms) são esperados como Messias do futuro pelos autores de "Science Fiction". Gilles Lapouge em sua obra Utopie et Civilization, de que citamos trechos, explica bem o papel do autômato nas utopias.

4. Geometrismo - Por causa desse mecanismo os utópicos naturalistas sonham um mundo geométrico em que tudo seja regulado como peças de um motor. Já na Antiga Grécia, alguns pensavam em aplicar à sociedade as mesmas regras mecânicas que regulavam o movimento dos astros. Eles se revoltavam com as "irregularidades" decorrentes do livre-arbítrio humano e da liberdade natural daquilo que é vivo. Abolir o livre-arbítrio é abolir a natureza, tal era o seu ideal. Hipodamos, como os urbanistas modernos, traçava já os planos da cidade quadriculada.

"Dappertuto si averte na spiccata predilezione per tutto ciò che è inorganico. Nel settore dell'arte, e anche al di fuori della sfera artistica, questa predilezione si manifesta specialmente nella comparsa di nuovi materiali sintetici che sostitu?iscono il materiale organico con quello inorganico. In nessun'altra epoca si sognano i giardini di ferro e di bronzo ai quali allude Beaudelaire. Gli alberi di cemento dell'architetto Mallet-Stevens sono, è vero, certamnte uno scherzo repellente, ma denotano senza dubbio un sintomo" (Hans Sedlmayr - La perdita del centro, Busconi, Milano, 1974).
["Por toda parte se observa uma acentuada predileção a tudo que é inorgânico. No setor da arte, e também fora da esfera artística, esta predileção se manisfesta especialmente no aparecimento de novos materiais sintéticos que substituem o material orgânico pelo inorgânico. Em nenhuma outra época sonham-se jardins de ferro e de bronze aludidos por Beaudelaire. As árvores de cimento do arquiteto Mallet-Stevens são, na verdade, certamente uma brincadeira repelente, mas demonstram sem dúvida um sintoma."]

Em São Paulo, num jardim público próximo à USP há vacas de cimento, e no centro da cidade as árvores são enclausuradas em caixas de concreto...

5. Progressismo e futurismo - A utopia naturalista crê no progresso contínuo trazido pelo avanço índefinido da ciência e da técnica. Daí o otimismo cor-de-rosa que se nota nas obras de ficção científica. Daí também o desprezo pelo passado e o encanto com o futuro, que certamente realizará o paraíso terrestre mecânico.

Este progresso contínuo para a felicidade, alguns tentam apressá-lo e querem realizá-lo por decreto e à força. Outros, mais pacientes, acreditam que ele virá fatal mas paulatinamente.

6. Ditatorialismo - O utópico naturalista quer obrigar todos a serem felizes e do modo como ele julga que se deve ser feliz. Seu mecanicismo destrói a liberdade e iberta o homem do "drama" de ter que escolher. Tudo na utopia é programado e a sociedade tem por constituição um organograma.

7. Igualitarismo - Deixar os homens em liberdade é favorecer a desigualdade, coisa que a mentalidade utópica não tolera. A igualdade é dogma indiscutível para os utopiastas. Daí o comunismo de bens estabelecidos por quase todas as utopias.

A Revolução Francesa está repleta de casos comprovantes do culto do igualitarismo. Fouché, por exemplo, quis igualar, por decreto, o ouro e o ferro.

O Terror elaborou um novo calendário em que o nome dos dias e dos meses foi trocado porque homenageando vultos históricos e os astros se violava a igualdade.

A "Icarie" de Cabet é exemplo típico de utopia em que racionalismo, geometrismo, cientificismo e igualitarismo são as notas dominantes.

"Icarie est le pays isolé et symétrique auquel nous sommes habitués par tant d'ouvrages similaires. La capitale, Icare, est un cercle avec un autre petit cercle au centre, entouré d'eau et signalé à la vue par le plus important des monuments de la ville. Les rues sont quadrillés, comme dans la plupart des villes américaines. Tout y est soumis à la plus rigoureuse des géometries, grâce à cet effet d'optique qui confond l'égalité avec le régularité: comme si la forme identique des chapeaux qui a été prescrite par la loi possédait une parcelle de la force magique qui doit égaliser les conditions et les classes" (A. Cioranescu, op. cit., pp. 204-205).
["Icária é o país isolado e simétrico como estamos habituados a ver em tantas obras similares. A capital, Ícara, é um círculo com outro círculo menor no centro, cercada de água e notada à distância pelo mais importante dos monumentos da cidade. As ruas são quadriculadas, como na maior parte das cidades americanas. Tudo nela está submetido à mais rigorosa geometria, graças a este efeito de ótica que confunde igualdade com regularidade: como se a forma idêntica dos chapéus que foi prescrita pela lei possuísse uma parcela da fôrça mágica que deve igualar as condições e as classes."]

E Moses Hess, em 1843, proclama que o ideal revolucionário é a absoluta igualdade dos homens:

"(...)e apesar de que o egoísmo encarnado no mundo que nos cerca lance mão dos sofismas os mais miseráveis, contra a absoluta igualdade dos homens, apesar de que empregue os maiores esforços para confundir e substituir as características essenciais do homem por traços acidentais, os normais por anormais (...) a fim de induzir a conclusão de que existem tantas naturezas específicas quanto existem indivíduos particulares - ainda assim estamos convencidos da igualdade essencial de todos os homens (Moses Hess - Obras Escolhidas, pp. 219-220, apud J. Szachi, op. cit., pp. 80-81).

Mao Tsé Tung chega a afirmar que, havendo dois homens feridos e uma só padiola, os dois devem ser deixados ao chão, porque transportar um seria estabelecer um privilégio e violar a igualdade.

Até mesmo um autor que se afirma anti-utópico como Karl Popper declara que presta culto dogmático à igualdade, passando por cima dos fatos concretos:

"Não se pode, sem dúvida, negar que os indivíduos humanos são, como todas as outras coisas de nosso mundo, muito desiguais a muitíssimos respeitos. Nem se pode duvidar de que essa desigualdade seja de grande importância e mesmo, a muitos títulos, profundamente desejável.

(...) "Mas tudo isso, simplesmente não tem realação alguma com a questão de devermos ou não decidir tratar os homens, especialmente no terreno político, como se fossem iguais, entendendo por igualdade, não uma igualdade absoluta mas a máxima possível, isto é, igualdade de direitos, de tratamento e de aspirações (...)". E citando Huxley (Admirável Mundo Novo) Popper conclui: "A igualdade perante a lei não é um fato, mas uma exigência política, baseada numa decisão moral, e é totalmente independente da teoria - provavelmente falsa - de que "todos os homens são nascidos iguais" (Karl Popper - op. cit., vol. II, pg. 242).

8. Estatismo - A utopia querendo estabelecer e manter a igualdade entre os homens, tem que destruir a liberdade, e para isto tem que concentrar todo poder no Estado. Há na utopia naturalista uma hiper-estatização que elimina todos os grupo sociais intermediários e destrói toda a autonomia individual.

9. Totalitarismo - Esse estatismo e o terror de ver ressurgir a desigualdade das profundezas do individualismo e do personalismo exigem que o estado utópico seja totalitário. Só ele deve cuidar da política, da educação, da economia, dos correios, do comércio, da agricultura, da religião, do saber, das artes, etc.

10. Trabalhismo - A utopia quer realizar o "céu" na terra por meio da ciência, da técnica e do trabalho. Ela não é o mágico país da Cocagne, onde os leitões já correm assados para a boca dos glutões deitados num eterno "dolce far niente". A utopia tem a mística do trabalho. Viver de rendas, poetar sem produzir são crimes na utopia. "Por acaso cairão as estrelas do céu e se farão para nós batatas?" (Paul Claudel - Jeanne au Bûcher).

Contraditoriamente - melhor seria dizer dialeticamente - a utopia promete a Cocagne, mas impõe o trabalho e o racionamento.

11. Ascetismo e pragmatismo - outro "valor" utópico que recebe verdadeiro culto é a pobreza espartana (racional-naturalista), mais do que a franciscana (mística).

O luxo, a pompa, o supérfluo são considerados violações da justiça porque contrariam a igualdade. Daí também as utopias serem enormemente pobres de símbolos e estritamente burocráticas e funcionais. A utopia, por isso, pouco se preocupa com a arte e com a beleza. Ela quer o útil. Ela quer produção... embora racionada.

Como diz Aristófanes na peça Os pássaros, o banquete utópico é esquisito e supimpa, mas vá correndo logo com sua tigelinha, para ver se recebe ainda um pouco de sopa negra, se sobrou algo.

12. Despersonalização e magia - Como já vimos numa citação de Cioranescu, a utopia pretende que os homens sejam uma massa coloidal, sem estrutura, que pode assumir qualquer forma que se lhe imponha.

Para isto a utopia desconhece os valores pessoais e recusa todo personalismo. Ela tem que ser, assim, a república da mediocridade ou da massa, vazia e despersonalizada, cujos membros são numerados, mas não tem nome. O computador é hoje a varinha mágica capaz de transformar homens em autômatos ou em fichas. No computador se encontram a magia e o tecnicismo.

13. Ecumenismo e tolerância - Em matéria religiosa, as utopias são em geral ecumênicas e tolerantes. Já na Utopia de S. Tomaz Morus, aparece essa característica. A eqüidistância da utopia em relação às religiões é fruto de seu cientificismo negador de toda transcendência.

"La utopia, como la nombrara por primera vez Tomás More, País de Ninguna Parte, será el asilo de hombres de buena vonlutad. Ciertamente, em muchos de sus aspectos, recordara la Tierra de Promisión y la Jerusalén purificada. Pero, en verdad, diferirá profundamente de ella, al no distinguir entre ele?ridos y reprobos y al reemplazar el largo camino del desierto y la sangre de los mártires por las águas del Oceáno, el sueño" (J. Servier - op. cit., pg. 82).

14. Laicização do Milênio - Do que diz Cioranescu a respeito de Utopia e Religião, e particularmente do fenômeno milenarista, se deduz que a utopia naturalista é uma secularização do milenarismo messiânico.

Para ela, o messias que fará o reino na Terra é a técnica. O computador é o único deus, e o tecnocrata é o seu profeta.

Outro exemplo atual de laicização da religião e com promessas messiânicas milenaristas é o marxismo, como indicam os textos de Mircea Eliade e Gilles Lapouge, anteriormente citados.

 

B. O Milenarismo, utopia espiritualista

1. Irracionalismo - O milenarismo despreza a razão e até vê nela um mal, na medida em que ela impede a fusão de todos no Todo. A razão nos permite conhecer os seres e defini-los. Ora, definir algo é pôr-lhe limites e, portanto, individualizá-lo, separando-o do Todo. E isto seria um mal, já que, para a gnose, a individualização é uma ilusão que impede nossa fusão no Todo divino.

Entretanto, essa negação da razão e o triunfo do irracionalismo que se notam no milenarismo gnóstico, dialeticamente, vem junto com a afirmação de que o homem tem, em si, forças que lhe permitem alcançar e compreender o mistério da própria divindade. E não há seita milenarista ou gnóstica que não tenha uma explicação teosófica e racionalista da essência e da vida de Deus.

2. Magia - Não é a ciência que liberta o homem. Não é conhecendo o sistema de causas e efeitos - obra do demiurgo e dos arcontes satânicos para iludir o homem e mantê-lo preso no universo material - que levarão o homem ao estado de perfeição e de felicidade absolutas. Pelo contrário, é a irracionalidade mágica que permitirá atingir esses objetivos.

As leis naturais, estudadas pela ciência, são produzidas pelo criador do mundo, deus do mal. Subjacentes à natureza criada, há outras leis que governam o espírito divino universal, atualmente fracionados e aprisionados nos seres materiais. O conhecimento dessas leis ocultas é que dá o verdadeiro domínio das coisas e do universo. Essas leis ocultas são o objeto de estuda das ciências ocultas e sua aplicação prática é a magia, a qual permite por em contato, e mesmo fundir, nosso espírito com o dos outros seres, e com o espírito de toda a natureza.

"I believe in the practice and philosophy of what we have agreed to call magic, (...) and I believe in three doctrines, which have, as I think, been handed down from early times, and been the foundations of nearly all magical practises. These doctrines are:
a. That the borders of our mind are ever shifting, and that many minds can flow into on another, as it were, and create or reveal a single mind, a single energy.
b. That the bordes of our memories are as shifting, and that our memories are a part of one great memory, the memory of Nature herself.
c. That this great mind and great memory can be evoked by symbols."

(W. B. Yeats - Selected Criticism from Magic - edited with an introduction and notes by A. Norman Jeffares, professor of English Literature, University of Leeds, Pan Books, London, 1976, pg. 80).

["Eu acredito na prática e na filosofia daquilo que nós concordamos em chamar de magia, (...) e eu acredito em três doutrinas que, como penso, foram herdadas desde os primórdios dos tempos, e que têm sido os fundamentos de recentes práticas mágicas. Essas doutrinas são:
a. Que os limites da nossa mente estão sempre se movendo, e que muitas mentes podem fluir para outras, como foi, e criar ou revelar uma única mente, uma única energia.
b. Que os limites das nossas memórias são flutuantes, e que nossas memórias são uma parcela de uma grande memória, a memória da própria natureza.
c. Que esta grande mente e grande memória podem ser evocadas por símbolos."]

Citamos esse texto de Yeats porque ele é um gnóstico confesso de nossa época, e porque suas palavras explicitam as doutrinas mágicas de todos os movimentos gnósticos e milenaristas do passado.

3. Mitologicismo e organicismo - O desprezo pela razão torna a gnose e o milenarismo gulosos de mitos. Nota-se nos movimentos quiliásticos uma grande aversão pela exposicão lógica e metódica e uma grande abertura para a linguagem mítica, imaginativa e poética.

Sempre os movimentos quiliásticos atraíram os poetas que muitas vezes tornaram-se seus profetas e arautos. O milenarismo prefere o trovador ao cientista.

Desde a antiguidade grega, passando depois pelos trovadores provençais, por Dante, pelos poetas românticos, até os poetas atuais, de que Yeats é exemplo, uma longa tradição liga a inspiração poética ao profetismo e ao êxtase místico.

"(...) altivo, incompreendido e distante, o poeta romântico impõe-se, intimado pela inspiracão que o visita, a tarefa universal de legislador do reino dos fins espirituais intangíveis, onde, imune à lei da casualidade e às mutáveis circunstâncias do mundo exterior, ocupa, como o viu Lamartine, um lugar firme e elevado com relação à humanidade (...)

"Nessa tarefa ele não somente se define como porta-voz e guia espiritual de seu povo (Shelley), sábio, humanista, guia para todos os homens (Keats), mestre verdadeiro (Wordsworth), mas também como um mago, um mágico, um profeta visionário". (Benedito Nunes - "A visão romântica" in O Romantismo, org. J. Guinsburg, Ed. Perspectiva, São Paulo, 1978, pg. 62).

E o gnóstico William Blake resumiu em dois versos o irracionalismo da arte gnóstica, dizendo:

"Art is the Tree of Life... Science is the Tree of Death" (Willian Blake, Penguin Books, New York, 1978).
["A Arte é a Árvore da Vida...a Ciência é a Árvore da Morte."]

Por causa desta atitude anti-científfica e anti-racionalista, os movimentos quiliásticos, em matéria de textos sagrados, previnem sempre contra a "letra que mata" e busca expressar o "espírito que vivifica". Essa era, aliás, a crítica que os anabatistas pietistas faziam ao luteranismo (Cfr. N. Cohn, op. cit., p. E Ladislao Mittner - Storia della Letteratura Tedesca dal Pietismo al Romanticismo, Einardi, Torino, 1964, pg. 35).

Esta corrente espiritualista da utopia - ou seja o milenarismo - concebe Deus como vida imanente encarcerada em todas as coisas. É normal, pois, que os milenaristas tenham ojeriza a tudo que é mecânico e técnico.

Rousseau exprime bem a repulsa ao que é mecânico e artificial nos seguintes textos:

"Le corps de l'homme sauvage étant le seul instrument qu'il connoisse il l'employe à divers usages, dont, par défaut d'exercice, les notres sont incapables, et c'est notre industrie qui nous ôte la force et l'agilité que la nécessité l'oblige d'acquerir. S'il avoit eu une hache son poignet romproit-il de si fortes branches? S'il avoit eu une fronde lanceroit-il de la main une pierre avec tant de roideur? S'il avoit eu une échelle, grimperoit-il si légérement sur en arbre? S'il avoit eu un cheval, seroit-il si vite à la course?" (J. J. Rosseau - Discours sur l'origine de l'inégalité parmi les hommes, Gallimard, Paris, 1965).
["O corpo do homem selvagem sendo o único instrumento que ele conhecia, ele o utilizava para diversas atividades, às quais, por falta de exercícios, os nossos são incapazes, e é a nossa indústria que nos tira a força e a agilidade que a necessidade o obriga a adquirir. Se ele tivesse tido um machado seu punho quebraria tão fortes galhos? Se ele tivesse tido um estilingue, ele lançaria com a mão uma pedra com tanta precisão? Se ele tivesse uma escada, subiria ele tão facilmente numa árvore? Se tivesse tido um cavalo, seria ele tão veloz na corrida?]

4. Culto da natureza - A corrente espiritualista da Religião do Homem, ao mesmo tempo que despreza a criação como obra do demiurgo, cultua e procura entrar em contato com o espírito divino que está esparramado e encarnado nela.

Sua oposição ao racionalismo, ao cientificismo e ao tecnicismo criador de um mundo artificial e mecânico, leva o milenarismo a procurar a felicidade paradisíaca numa volta mística à natureza.

Daí o sonho do bom selvagem, das ilhas paradisíacas, das terras em que mana o leite e o mel.

Muitas vezes este sonho que idealiza a natureza vem unido a um desejo de retornar às origens, ao paraíso perdido.

Exemplos dessa atitude naturalista paradisíaca se acham nos poetas gregos antigos (Ilha de Calipso, na Odisséia; Ilha dos Bem-aventurados, Panchaia), em alguns pintores do Renascimento, nos românticos, especialmente em Rousseau, no movimentos hippie e na atual corrente ecologista.

Essa volta à natureza é que exigia o nudismo ritual nas seitas adamitas e nos Irmãos do Livre Espírito (Cfr. N. Cohn - op. cit., pg. 184).

5. Escatologismo - A corrente "mística" das utopias considera que a salvação se fará pelo estabelecimento do Reino de Deus na Terra. Tal evento se daria no fim dos tempo, quando o Messias viria à Terra para abolir a Lei e fundar o reino do Amor.

A História seria uma longa preparação espiritual para a Parúsia cristã ou para o advento do Messias judaico, ou do Mahdi islamita. De qualquer forma, o reino de Deus estaria no futuro e para lá marcharia a humanidade nos caminhos da História.

Todos os milenarismos antigos, que falavam de um reino milenar dos espíritos dos planetas, o milenarismo gnóstico-cristão dos primeiros séculos, o milenarismo sabático do Sefer Temuna que já citamos, os milenarismos do fim da Idade Média e do tempo do Protestantismo, a época dos "Lírios" esperada pelos discípulos de Boehme, se enquadram nessa visão escatológica.

6. Anarquia e antinomismo - Se a grande preocupação da utopia naturalista é realizar a igualdade, a ponto de, para alcançá-la, sacrificar a liberdade, o interesse mor dos milenaristas está na liberdade, não hesitando, para obtê-la, em sacrificar, na prática, a igualdade. A anarquia, porém, de certa forma, daria não só a completa liberdade, mas também a completa igualdade, pois ninguém mandaria.

O desejo de livrar o homem de toda submissão produziria afinal a anarquia e o antinomismo. Abolir-se-ia o estado e a lei. Alcançando-se a divinização através do êxtase, tudo ficaria permitido, desde o adultério até o roubo, a rapina e o assassinato. Mais ainda, o pecado seria o veículo da salvação. É a teoria da santidade do pecado expressa na cabala, na seita dos Irmãos do Livre Espírito, ou na doutrina dos Carpocráticos (Cfr. Norman Cohn - op. cit., pg. 181-183/ Hans Leisegang, La Gnose, Payot, Paris, 19 / Gershom Scholem - A mística judaica, Perspectiva, São Paulo, 1972, pp. 317-319-320).

É interessante lembrar que o movimento hippie da Sorbonne, em 1968, tinha um lema antinomista que já citamos duas vezes - mas que nunca é demais lembrar, pois que dá atualidade à questão - "É proibido proibir".

O hippismo se jacta de ser libertário e anárquico. Todavia, se se examinar mais a fundo a questão, ver-se-á que, paradoxalmente, os hippies têm código de leis implícito (ou secreto?). Entre eles cada um faz o que quer, como na abadia de Thelème. Porém, é inconcebível um hippie de paletó e gravata e cabelos curtos. Os hippies tem pois uma "regra secreta" que exige deles o "blue-jeans", os cabelos longos e desgrenhados, a falta de banho, o uso de certas gírias, o consumo de drogas, etc. E ái do hippie que desobedecer a essa regra... Certamente será excomungado pelo seu grupo.

7. Sistema de castas - Assim como a gnose costumava dividir os homens em hílicos, psíquicos e pneumáticos, assim também nas seitas milenaristas é comum a divisão em grupos que são verdadeiras castas. Por exemplo, os Irmãos do Livre Espírito dividiam-se em "frustros", "extáticos" e "subtis" (Cfr. Norman Cohn - op. cit., pg. 185).

Essa classificação gnóstica é uma caricatura de hierarquia porque ela tende a gerar, na sociedade, um sistema de castas, com desigualdades excessivas e intransponíveis no decorrer da vida, já que normalmente só pelas reencarnações seria possível mudar de grupo. Entretanto, como no fim do processo de "salvação de Deus", todas as partículas divinas, ora esparsas pela criação, retornarão a Deus, tudo se igualará na definitiva imersão nele. As castas são pois o oposto dialético do igualitarismo, isto é, são o contrário-igual do igualitarismo.

8. Individualismo - Enquanto a utopia naturalista concentra todo poder no Estado, a utopia milenarista é individualista. O eu profundo de cada um é uma partícula divina e é dever do homem desenvolver sua vida pneumática. Os meios de ação gnóstica são individuais. A contemplação do eu interior leva, inicialmente, o milenarista a se desinteressar da salvação alheia, até que o pretenso advento messiânico una todos os individualistas numa força coletiva, mas anárquica. Dá-se então a explosão do milênio, como, por exemplo, com a revolução de João de Leyde no século XVI (Cfr. Norman Cohn - op. cit., pg. 261 e ss.).

9. Anti-estatismo - O advento do milênio pretende estabelecer a Teocracia direta. Porém, como todos são deus, a Teocracia milenarista é anárquica. Os "reinos" milenaristas, que tentaram se realizar na História, revelam uma grande despreocupação com a ordem estatal, uma completa negligência quanto a questões administrativas, uma anarquia legal e penal. Os "reinos" milenaristas, em sua curta duração, mostraram preocupar-se apenas com o banquete orgiástico e com a eliminação física dos "pecadores", dos que não pertencem ao número dos eleitos.

10. Espírito de vadiagem e de Cocagne - O milenarismo é anti-trabalhista e anti pragmático. O útil não é um valor para ele. O milenarismo é descuidado, imprevidente, sem plano algum. E isto vai dentro da sua lógica, pois se o advento de Deus na História detém o fluxo do tempo no eterno presente, não há mais que pensar no futuro, pois "o futuro é agora", conforme afirma outro slogan da Sorbonne.

Esta atitude vadia é exemplificada pelo modo de vida hippie, pelos terroristas da Nova Esquerda italiana que se autodenominam "os selvagens metropolitanos".

11. Deboche, orgia e luxo milenarista - Os movimentos escatológicos e "místicos" começam exigindo de seus membros uma ascese rigorosa e o desprendimento de todos os bens materiais. Pregam em geral a pobreza absoluta e afirmam que a propriedade é pecado. Seu ódio a riqueza vai tão longe que os "Irmãos do Livre Espírito" consideravam pecado convidar um rico para jantar (Cfr. Norman Cohn - op. cit., pg. 158).

Entretanto, alcançada a divinização, o "místico" pode então gozar de todos os prazeres da carne, bem como possuir todas as riquezas.

João de Leyde, líder milenarista de Munster no século XVI, ao proclamar o advento de Deus se fez coroar rei da Nova Jerusalém no cemitério da cidade. Organizou então uma corte luxuosa e deu grandes banquetes, numa cidade sitiada e faminta (Cfr. J. B. Weiss - História Universal / Norman Cohn - op. cit., pp. 281 e ss.; Cfr. Le Communisme, de la Bible à nos jours.)

Muitos irmãos do Livre Espírito, alcançado o êxtase divino, organizavam o que chamavam de "Paraíso": uma sala suntuosa onde praticavam o nudismo ritual e orgias sexuais.

Outros ainda vestiam-se com farrapos enfeitados com pedras preciosas, moda que, aliás, teve certa voga, há poucos anos, nos Estados Unidos. Assim, dialeticamente, a utopia naturalista promete a cocagne e dá o talão de racionamento, enquanto a utopia milenarista prega a ascese e dá o luxo e a orgia.

12. Divinização e aniquilamento do eu - Se é certo que o milenarismo gnóstico promete a divinização do eu, é certo também que ele diz que isto só se alcança pela sua destruição.

E tanto para alcançar uma coisa, como para alcançar a outra, empregam-se técnicas mágicas.

Também a solução de todos os problemas concretos se fará de modo mágico, graças à vinda de Deus à Terra.

13. Sectarismo e intolerância - A corrente milenarista produz normalmente grupos religiosos sectários que, antes de tomarem o poder, pregam o ecumenismo e a absoluta liberdade de crença, pois que, segundo eles, o Espírito divino que vive no âmago do homem, se revela de modo diverso para cada pessoa. Daí ser preciso ter uma atitude irônica, ecumênica, tolerante. Em geral, dizem que suas exigências são mínimas: a fé em Deus e a prática de um só mandamento: o do amor.

Entre os gnósticos, era praticamente livre a elaboração de novos mitos e a redação de obras pseudo-epigráficas, daí a enorme variedade de sistemas gnósticos.

Para esses grupos, a elaboração de um corpo dogmático, a redação de um credo obrigatório, assim como a institucionalização da religião em estruturas fixas impediria a livre manifestação do Espírito.

Entretanto, nos casos em que o milênio foi proclamado, o que se verificou foi que, logo tolerância e ecumenismo foram substituídos pelo terror e pela eliminação física dos "pecadores" que não aderiram à seita dos "eleitos".

14. Sacralização da utopia - Muitas das notas típicas da utopia naturalista reaparecem no milenarismo, porém cobertas com o manto do misticismo. Se a utopia é a laicização do milênio, este tem que ser, de acordo com a dialética, a inversão religiosa da utopia. O milenarismo é a sacralização da utopia. No milênio messiânico, todos os males da terra serão superados pelo êxtase místico coletivo, pela absorção de todos no grande Todo.

 

Entre utopia e milenarismo existe uma oposição dialética no sentido gnóstico, isto é, são elementos contrários-iguais. A oposição entre utopia e milenarismo é, em certo sentido, fruto da oposição entre racionalismo e fé.

"Tan lejos como podamos remontarmos en la história de la filosofia griega, encontramos um modo de conocimiento racional opuesto a un modo irracional de aprehensión del mundo. El enfrentamiento de la ciencia con la religión no es un fenómeno nuevo.

"La utopia se caracteriza por el acento particular dado al conocimiento racional, persiguiendo en esto su funcion de sueño apaciguador, negación de toda ansiedad" (J. Servier - op. cit., pp. 263-264).

Se não há duvida que há uma oposição entre o racionalismo utópico e a fé irracional do milenarismo, o que é menos percebido é que o cientificismo e o irracionalismo desembocam no religioso. Já mostramos que o misticismo gnóstico pretende racionalizar o próprio processo misterioso da divindade, colocando-o ao alcance do conhecimento humano. Vejamos pois como o racionalismo é de fato uma fé.

"Du point de vue de la pensée utopique, la science ne devait être l'objet des progrès, mais sont instrument ou, mieux encore, sa méthode. Les ressorts de la religion, puis ces de la morale ayant été usés, on demande à la science ce que l'imagination, mythique demandait autrefois à la foi et à la poésie. Déjà Andrae et Bacon avaient montré ce qu'on pouvait obtenir d'elle, allors qu'elle ne faisait que balbutier. Au XIX siècle, elle a déjà remplacé la religion en tant qu'espoir et perspective d'avenir. Avec l'ingénuité de le foi on la croit capable de répondre à toutes les questions et de faire face à toutes les situations" (A. Cioranescu, op. cit., pg. 198-199).
["Do ponto de vista do pensamento utópico, a ciência não devia ser o objeto do progresso, mas seu instrumento ou, melhor ainda, seu método. Os recursos da religião, depois os da moral, tendo sido usados, pede-se à ciência aquilo que a imaginação mística pedia outrora à fé e à poesia. Andrae e Bacon já haviam mostrado o que se poderia obter dela, quando então ela somente balbuciava. No século XIX, ela já substituiu a religião como esperânça e perspectiva no porvir. Com a ingenuidade da fé crê-se que ela é capaz de responder a todas as questões e de enfrentar todas as situações."]

Esse autor mostra ainda como se esperou que a ciência construísse o paraíso na terra, como ela traria a paz, pondo fim à guerras e até mesmo produzindo o progresso moral.

"(...) faire de la science, non seulement l'instrument des améliorations matérielles, mais aussi celui du perfectionement moral de L'individu, par cette façon de considérer la connaissance comme une partie intégrante du bien" (A. Cioranescu - op. cit., pg. 144. O grifo é nosso).
["(...) fazer da ciência, não somente o instrumento de melhorias materiais, mas também do aperfeiçoamento moral do indivíduo, por ests forma de considerar o conhecimento como parte integrante do bem."]

A utopia naturalista é pois resultante de uma fé no homem e na razão. No fundo do pensamento utópico, como vimos, há uma religião sem transcendência.

Karl Popper - que é muito insuspeito em questão de racionalismo - afirma que o racionalismo é uma fé irracional na razão.

"A atitude racionalista é caracterizada pela importância que dá ao argumento e à experiência. Mas nem o argumento lógico nem a experiência podem estabelecer a atitude racionalista, pois só aqueles que estão dispostos a considerar o argumento e a experiência, e que portanto já adotaram essa atitude, serão impressionados por eles. Isto é, uma atitude racionalista deve ser adotada primeiramente, se algum argumento ou experiência tiverem que ser efetivos, e não pode, em conseqüência, ser baseada em argumentos ou experiência. (...). Temos de concluir daí que a atitude racionalista não se pode basear no argumento ou na experiência e que um racionalismo compreensivo é insustentável.

"Isto, porém, significa que quem quer que adote a atitude racionalista o faz por haver adotado, sem raciocinar, alguma proposta, ou decisão, ou crença, ou hábito, ou comportamento que, portanto, por sua vez, pode ser chamado irracional. Seja como for, poderemos descrevê-lo como uma irracional fé na razão" (K. Popper - op. cit., vol. II, pg. 238).

Portanto, há pelo menos um certo racionalismo que é fé irracional na razão.

Todavia esta "fé irracional na razão" que exclui toda transcendência e que está no âmago das utopias, não tem, de per si, o impulso da fé que move as montanhas.

O racionalismo é frio, circunspecto, sem vibração e tem dificuldade para arrastar a massa ignara que se move mais por emoções, símbolos e mitos do que por idéias abstratas. Daí a tendência da utopia a ficar isolada em círculos intelectualóides. É o que explica o fato de que muitos utopistas foram intelectuais, via de regra ricos ou abastados, cujas obras tiveram pouca repercussão política ou social imediata, sendo lidas apenas em alguns grupos da elite intelectual. É o que ocorreu com a Utopia de Thomas Morus, por exemplo.

Por sua vez, o milenarismo se manifesta sempre como um fenômeno "místico" que despreza a razão. Isto o obriga a renunciar a todo discurso lógico através do qual possa apresentar um sistema coerente de pensamento. Daí resulta a ilogicidade louca de seus mitos que parecem propositadamente feitos para não serem entendidos. Falando do libro gnóstico "Pistis Sophia", Harnack diz:

"Il est difficile de trouver lecture plus embrouilée et plus fastidieuse que ces pages remplies des elucubrations de l'imagination gnostique et qui sembleraient à un lecteur superficiel avoir été écrites dans le dessein de divulguer une insanité systématique" (Harnack - Texte und Unters, VII, (1891) 1, apud H. Leisegang, op. cit., pg. 247).
["É difícil encontrar leitura mais desordenada e mais cansativa do que estas páginas cheias de elocubrações da imaginação gnóstica e pareceriam a um leitor superficial terem sido escritas no desejo de divulgar uma insanidade sistemática."]

Esta ausência de discurso lógico acua o milenarismo gnóstico no gueto sectário e limita sua expansão a um pequeno número de "alumbrados", impedindo que ele tenha repercussão maior.

O milenarismo tem, mais do que "a fé que move montanhas", a crença fanática de força telúrica que produz terremotos sociais.

À utopia falta a fé e o impulso, e ao milenarismo falta o discurso e um sistema lógico.

Quando, entretanto, aparece algum homem capaz de unir esses dois extremos dialéticos da sócio-política gnóstica, então aparece algo realmente explosivo. A união da utopia e do milenarismo produz um curto-circuito político-social que se chama Revolução.

A Revolução resulta, nesse caso, da união da fé, própria do misticismo, ao racionalismo da utopia. O milenarismo dá o impulso e a energia, enquanto a utopia fornece um sistema lógico de pensamento que permite a expansão do movimento.

O milenarismo místico recebe da utopia a palavra fria do racionalismo utópico que lhe permite sair do gueto sectário.

A utopia recebe do misticismo milenarista o calor capaz de entusiasmar e que lhe permite romper as barreiras que isolam o pequeno círculo intelectual. Nas ruas, utopia e misticismo se abraçam na jornada revolucionária. O mito louco toma aparências de razoabilidade. O sofisma frio da utopia ganha calor e vida. Nasce o "slogan", sofisma místico. Explode a Revolução.

Todos os pensadores que conseguiram, de alguma forma, unir o misticismo e o racionalismo provocaram revoluções. Platão está nesse caso: nove de seus discípulos envolveram-se em revoluções.

Campanella, místico e cientista causou uma revolução na Calábria que lhe custou muitos anos de cárcere.

Vem a propósito citar aqui uma página de Szachi a respeito da união de ideal utópico e realidade política concreta, entre fé revolucionária e ação racional calculada.

"A obra de Marx foi a busca de uma ponte entre a utopia e a política; entre a utopia como visão da sociedade ideal e a política como capacidade de direção das forças atuantes na sociedade existente. A passagem da realidade ao ideal parecia ser possível, ainda que a oposição entre os dois continuasse a ser vista como absoluta.

Tentativa semelhante, sob certos aspectos, é encontrada em algumas utopias. Tenho em mente aquelas que traduziram uma viva fé na possibilidade do "grande salto" para o reino do bem e da justiça, na possibilidade de uma mudança radical envolvendo toda sociedade e o conjunto das relações de vida.

Todos os utopistas acreditaram neste reino, mas somente alguns acreditaram ao mesmo tempo em que o reino far-se-ia realidade pela força de um ato humano. Há muito que se conhece o mito do grande homem, rei ou legislador, que transforma as relações existentes desde os seus fundamentos. Os tempos modernos trouxeram o mito da revolução como uma transformação prodigiosa da sociedade pelo poder de um ato, de algo fantástico que se passa de um dia para o outro. Estabelecem-se novas leis, e eis que chegam a liberdade, a igualdade e a fraternidade, tudo será melhor e mais belo, desaparecem as divisões entre os homens junto com os traços ruins de seus caracteres, não há mais doença e infelicidade e todo mundo é permeado de camaradagem humana.

Em certa medida esta fé deu vitalidade a todas as revoluções que pretenderam realizar uma negação total da sociedade pré-revolucionária. Deu impulso à atividade das massas; as revoluções comunistas não fugiram à regra, ainda que seus líderes insistissem que nenhum decreto pode trazer de uma vez o céu à Terra.

Mas este tipo de utopia merece atenção não somente como manifestação da ingenuidade dos revolucionários de uma certa época. Deixando de lado o seu valor como fonte para a mobilização, deve-se observar que com base nela realizou-se pela primeira vez na História a união da utopia com a luta pela transformação prática da sociedade. Foi a "praticalização" do utopismo e a sacralização (elevação ao sublime) da política". (J. Szachi - op. cit., pg. 101-102. O grifo é nosso.).

A citação é longa, mas reveladora, tanto mais que é de um marxista.

Da mesma forma, pois, que no campo religioso, a união do panteísmo e da gnose produzem o curto-circuito revolucionário e a afloração da Religião do Homem na História, assim também, a união da utopia (panteísmo político-social) com o milenarismo (gnose político-social) provoca a eclosão da Revolução, tentativa de realizar a Cidade do Homem, na História.

 

1. AGOSTINHO, Santo - A cidade de Deus.

2. ALIGHIERI, Dante - La Divina Comedia, Hoepli, Milano, 1965.

3. ARISTÓFANES - Os Pássaros.

4. BACON, Francis - A Nova Atlântida, Abril Cultural, São Paulo, 1972.

5. BLAKE, William - Works, Penguin Books, New York, 1978.

6. BESANÇON, Alain - Le origine intellectuali del leninismo, Sansoni, Firenze, 1978.

7. CAMPANELLA, Tomaso - A Ilha do Sol, Abril Cultural, São Paulo, 1972.

8. CIORAN, Emile - Histoire et Utopie, Gallimard, Paris, 1960.

9. CIORANESCU, Alexandre - L'avenir du Passé, Gallimard, Paris, 1972.

10. CLAUDEL, Paul - L'Annonce faite à Marie, Gallimard, Paris, 1940; Jeanne au Bûcher.

11. COHN, Norman - Les Fanatiques de l'Apocalypse, Julliard, Paris, 1962.

12. DE LA GORCE, Pierre - Histoire Religieuse de la Revolution Française, 5 vol., Plon, Paris, 1935.

13. ELIADE, Mircea - Mythes, rêves et mystères, Gallimard, Paris, 1957.

14. FALBEL, Nochman - A luta dos espirituais e sua contribuição para a reformulação da teoria tradicional sobre o poder papal, Tese de doutoramento, USP, 1972.

15. GAXOTTE, Pierre - A Revolução Francesa, PUF, Paris, 1951.

16. GRAMSCI, Antonio - "Notes sur Machiavel" in Gramsci dans le texte, récueil réalisé sous la direction de François Ricci en collaboration avec Jean Bramant, Editions Sociales, Paris, 1977.

17. HILTON, James - Horizonte Perdido, Record, Rio de Janeiro, s/d.

18. HUIZINGA, Johan - O declínio da Idade Média, Verbo/Edusp, São Paulo, 1978.

19. JACOB, Louis - Fabre d'Eglantine, chef des "frippons", Hachette, Paris, 1946.

20. JANET, Paul - Histoire de la Science Politique dans ses rapports avec la morale, Felix Alcan, Paris, 1887.

21. LACTANTII, L. Caeli F. - Divinae Instituitiones, F. F. Tempsky, Vindobonae, 1890.

22. LAPOUGE, Gilles - "Na utopia o começo do pesadelo totalitário", artigo in "O Estado de São Paulo, 06-XI-1977 - Utopie et Civilisation, Flammarion, Paris, 1978.

23. LEFEBVRE, Georges - La Révolution Française, PUF, Paris, 1951.

24. LEISEGANG, Hans - La Gnose, Payot, Paris, 1951.

25. MANNHEIM, Karl - Ideologia e Utopia, Zahar, Rio de Janeiro, 1976.

26. MAO TSÉ TUNG - O Livro Vermelho.

27. MATTOS SOARES, Pe. - Tradução, segundo a Vulgata, da Bíblia, Edições Paulinas, São Paulo, 1954.

28. MARNET, Daniel - Les origines intellectuelles de la Révolution Française, Collin, Paris, 1947.

29. MORUS, Thomas - A Utopia, Abril Cultural, São Paulo, 1978.

30. NUNES, Benedito - "A visão romântica" in O romantismo, org. J. Guinsburg, Perspectiva, São Paulo, 1978.

31. PLATÃO - A República, Edições de Ouro, s/d.

32. POPPER, Karl - A sociedade aberta e seus inimigos, Itatiaia/Edusp, Belo Horizonte/São Paulo, 1974.

33. QUEIROZ, Maria Isaura Pereira de - O messianismo no Brasil e no Mundo, Alfa-Ômega, São Paulo, 1977.

34. ROUSSEAU, Jean-Jacques - Discours sur l'origine et les fondements de l'inégalité parmi les hommes, Gallimard, Paris, 1965.

35. SCHOLEM, Gershom - A mística Judaica, Perspectiva, São Paulo, 1972; Les Origines de la Kabale, Aubier-Montaigne, Paris, 1966; Sabatai Sevi, the mystical Messiah, Princeton University Press, New Jersey, 1973.

36. SEDLMAYR, Hans - La perdita del Centro, Busconi, Milano, 1974.

37. SERVIER, Jean - Historia de al Utopia, Monte Ávila, Carracas, 1969.

38. STARZYNSKY, Gilda Reale, Idade de Ouro e Utopia na Comédia Grega Antiga, artigo in Suplemento Cultural de "O Estado de São Paulo", no. 19, 20/ II / 1977.

39. SZACHI, Jerzy - As Utopias, Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1972.

40. TOFFLER, Alvin - O Choque do Futuro, Artenova, São Paulo, 1976.

41. TOUCHARD, Jean - História de las Ideas Políticas, Editorial Tecnos, Madrid, 1975.

42. TUCHMAN, Bárbara W. - A Distant Mirror- The calamitous 14th Century, Mcmillan, London,1979.

43. VOEGELIN, Eric—Il Mito del Mondo Nuovo, Rusconi, Milano, 1976.

44. WERNER, Max—Ancient Judaism, Free Press, Glencoe, 1952.

45. YEATS, W. B. - Selected Criticism, edited with na introduction by Norman Jeffares, professor of English Literature, University of Leeds, Pen Books, London, 1976.

 

Anterior
Anterior

    Para citar este texto:
""
MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/bra/cadernos/religiao/utopia3/
Online, 25/04/2024 às 20:57:40h